Título: ADEUS ÀS ARMAS
Autor: Rodrigo Maia
Fonte: O Globo, 01/09/2005, Opinião, p. 7

Pena que se aprovou o plebiscito das armas para este ano. Melhor teria sido ano que vem. O custo de um bilhão de reais entre a mobilização nacional do TSE e a compensação tributária pelo uso da TV, sem contar os gastos privados, teria sido evitado. Mas, muito além disso, a coincidência com as eleições de 2006 colocaria no centro do debate político por todo o país as questões da violência e da segurança pública, hoje prioridades nacionais e desestabilizadoras da democracia e da cidadania entre as pessoas de menor renda. Uma vez decidido, cabe opinar sobre o mérito. Erram aqueles que se opõem à proibição de comercialização das armas focando seu raciocínio no crime organizado em si. O desarmamento no seio da sociedade civil dirige-se ao delito comum e a fatores emocionais crescentes num mundo rápido, mutante, volátil e por isso mesmo estressante cujo acesso banal às armas transforma conflitos em tragédias. Cumpre uma função de pedagogia social e emocional ao reduzir o acesso fácil a uma gaveta, uma resposta insensata, ou indução aos jovens estimulados pela violência do meio que o cerca e de programas na TV, internet ou video games em que herói e violência muitas vezes se confundem. O programa mais bem sucedido na polícia britânica nos anos trinta foi o treinamento para desvincular abordagem de conflitos ou delitos, com o reflexo de levar as mãos às armas. Só o policial que não tinha mais este reflexo poderia usar armas. Com a criação, no Brasil, dos juizados especiais para tratar dos delitos com baixo potencial ofensivo, vieram à luz do dia e das estatísticas os números dramáticos da banalização da violência no cotidiano. O crescimento de dois itens Ö ameaça e lesão corporal - alcançou a astronômica cifra de 500% em menos de 10 anos, de 1993 a 2003, atingindo no Estado do Rio mais de 110 mil ocorrências registradas ou 300 por dia ou quase 13 por hora. Quantos desses se transformaram em tragédia e não estão aqui contabilizados? Das 8 mil mortes violentas por ano no Estado do Rio de Janeiro, se supusermos que 50% estão relacionados ao crime organizado, deduzimos que 4 mil estão relacionadas a causas fúteis, e provavelmente metade dessas com armas de fogo. Se fosse possível esta proibição ser mais abrangente, se fosse controlável, deveria se incluir também as armas cortantes.

Se nas armas de fogo se produzir um efeito de apenas 10%, estaremos falando de 200 vidas por ano. E pela pedagogia implícita será um corte numa curva que não pára de crescer. Adeus à banalização das armas é o mínimo que se pode pedir, junto com tantos outros itens de ações preventivas contra a violência, que juntos produzirão a sinergia necessária a uma sociedade mais solidária, mais fraterna.

RODRIGO MAIA é deputado federal (PFL-RJ).