Título: Catástrofe no Sul dos EUA
Autor:
Fonte: O Globo, 31/08/2005, O Mundo, p. 30

Furacão inunda 80% de Nova Orleans, apavora americanos e estimativa é de centenas de mortos

Autoridades americanas não esconderam ontem a perplexidade ao se darem conta da tragédia causada pela passagem do furacão Katrina no Sul do país, segunda-feira. A estimativa é de que centenas de pessoas morreram, a maioria em inundações. Só num condado do Mississippi, foram confirmadas mais de cem mortes. As águas tomaram nada menos que 80% da histórica Nova Orleans, na Louisiana, onde as conseqüências não foram mais graves porque a grande maioria dos 500 mil moradores já havia deixado a cidade no fim de semana, por ordem de autoridades.

Katrina já está sendo considerado um dos mais devastadores furacões a atingirem os Estados Unidos. Especialistas disseram que o número de mortos deverá superar muito as 256 vítimas do furacão Camille, que castigou região em 1969.

- A devastação é maior do que nossos piores temores. É impressionante - comentou a governadora da Louisiana, Kathleen Blanco.

O prefeito A.J. Holloway, de Biloxi, cidade do Mississippi onde a força do Katrina derrubou um prédio, matando 30 pessoas, completou:

- Esta é a nossa tsunami.

Enquanto equipes de resgate enfrentavam montanhas de escombros e grandes inundações para chegar a áreas arrasadas, autoridades temiam o que elas encontrariam pela frente. Milhares de casas foram inundadas e centenas de moradores ficaram ilhados sobre telhados. Alguns usaram machados e até tiros para abrir buracos no teto e fugir para o telhado, escapando da inundação dentro de casa. A polícia os regatou em barcos e helicópteros.

- Estamos retirando quatro pessoas de cada vez, às vezes 12. Elas estão sendo levadas para o lugar seco mais próximo e então o helicóptero volta para apanhar mais gente - disse Larry Chambers, oficial da Guarda Costeira.

Inundação inviabiliza centros de desabrigados

Em Nova Orleans, dois diques se romperam, agravando a inundação. Para contê-la, começaram a ser usados sacos de areia de 1.360 quilos, jogados de helicópteros. Na cidade foram vistos corpos boiando e um tubarão de quase um metro de comprimento. Em algumas áreas, o nível da água era de mais de seis metros. Os dois aeroportos estavam alagados.

Durante o dia, a governadora Kathleen Blanco determinou a retirada de dezenas de milhares de pessoas abrigadas em centros de refugiados em Nova Orleans. Com a inundação, as condições nos abrigos haviam se tornado precárias. Só no estádio Superdome havia 20 mil refugiados, e o destino deles era incerto.

- Não há energia elétrica, está quente, é difícil levar comida para eles. A água está cobrindo o pé no Superdome - disse Blanco.

Devido à inundação, o Centro Médico da Universidade de Tulane, em Nova Orleans, cogitava remover seus mil pacientes.

- A água está subindo tão rapidamente que não consigo descrever - disse a vice-presidente do Centro, Karen Troyer-Caraway.

Mike Brown, diretor da Agência Federal para a Gestão de Emergências, afirmou que milhares de pessoas precisarão de abrigo durante semanas, talvez meses, e que o perigo continuará devido a danos estruturais em prédios, contaminações e doenças.

Hoje, o presidente George W. Bush antecipará em dois dias o fim de suas férias de um mês no Texas para acompanhar as operações.

- Neste exato momento, nossa prioridade é salvar vidas, e ainda estamos no meio das operações de busca e resgate - disse Bush. - Os governos federal, estaduais e locais estão trabalhando lado a lado para ajudar as pessoas, e temos muito trabalho a fazer.

O furacão chegou segunda-feira à costa da Louisiana com ventos de 224 quilômetros por hora. Atingiu ainda Mississippi, Alabama e Tennessee. Depois, perdeu força e ontem alcançava o nordeste do Mississippi já como tormenta tropical, com ventos de 80 quilômetros por hora. Mas só então ficou clara a proporção da catástrofe. Aparentemente, a maioria das mortes foi causada por uma forte e repentina tempestade que atingiu áreas da chamada Costa do Golfo.

Uma das situações mais graves era a da cidade costeira de Biloxi, onde o furacão pode ter matado centenas de pessoas, ao encurralá-las em casa em meio a uma inundação que rapidamente atingiu nove metros de altura.

- A devastação lá é simplesmente enorme - disse o governador do Mississippi, Haley Harbour, referindo-se ao condado de Harrison, que inclui as cidades de Gulfport e Biloxi.

Em Hancock, outro condado do Mississippi, a água inundou um centro de operações de emergência instalado num tribunal e a parte de trás do prédio desabou.

- Trinta e cinco pessoas nadaram para fora do centro de operações com coletes salva-vidas. Não soubemos mais delas - disse Christopher Cirilo, diretor de um centro de serviços médicos vizinho.

Todos os vôos para a região são cancelados

Katrina deixou 2,3 milhões de casas sem energia elétrica (cinco milhões de consumidores), incluindo a Flórida, onde o furacão passou semana passada, causando nove mortes. A recuperação da rede elétrica poderá demorar semanas. A BellSouth Corporation disse que pelo menos 73.575 usuários estavam sem telefone. Centenas de prédios sofreram desabamentos, carros e barcos foram esmagados e cidades inteiras foram inundadas. Uma plataforma de petróleo se soltou e bateu numa ponte. Pelo menos duas rerinarias - em Alabama e Mississippi - ficaram parcialmente submersas. Todos os vôos para a região foram cancelados e só deverão ser retomados sábado.