Título: Reação à base de crédito
Autor: Cássia Almeida/Luciana Rodrigues
Fonte: O Globo, 01/09/2005, Economia, p. 23

Investimento e indústria puxaram economia no 2º trimestre. No ano, alta é de 3,4%

O crédito levantou a economia brasileira no segundo trimestre deste ano. O Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de todas as riquezas produzidas no país) cresceu 1,4% em relação aos primeiros três meses do ano, após estagnação de 0,4% no primeiro trimestre, e 3,9% frente ao mesmo período de 2004, informou ontem o IBGE. No primeiro semestre, o país teve expansão de 3,4% e, nos últimos 12 meses, de 4,3%. Os números que vieram acima das expectativas dos analistas. A expansão foi generalizada. Aliado ao crédito que impulsionou o investimento (alta de 4,5% sobre o trimestre anterior) e o consumo das famílias (0,9% na mesma comparação), as exportações puxaram o desempenho da indústria. O avanço foi de 3% frente ao primeiro trimestre e de 5,5% na comparação com 2004.

- Mesmo com o juro alto, foi um resultado bom, com destaque para a indústria e o investimento. Principalmente o último, no qual houve expansão após dois trimestres de retração - diz Roberto Olinto, da Coordenação de Contas Nacionais do IBGE.

Armando Castelar, economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), afirma que os números de ontem se assemelham aos dos melhores momentos do fim de 2003, quando a economia brasileira voltou a crescer:

- Com a perspectiva de que a economia mundial continue crescendo bem e que os juros comecem a cair, isso prenuncia desempenho bom do PIB este ano e mais forte em 2006. O perfil do crescimento, puxado por investimento e exportações, é muito bom de uma ótica de longo prazo. No lado das exportações, reflete o bom momento da economia mundial. No dos investimentos, baixa capacidade ociosa, perspectiva de crescimento contínuo e lucros elevados que geraram recursos para investir.

Consumo das famílias sobe. Banco vê maior investimento desde 97

Pelas contas do Bradesco, a expansão de 4,5% para aumentar a capacidade produtiva da economia fará a taxa de investimento chegar a 20% do PIB no segundo trimestre, a maior fatia desde setembro de 1997.

Assim como o investimento, o consumo das famílias reagiu no segundo trimestre. Depois de cair 0,2% no início do ano, recuperou-se e subiu 0,9%. O que representa uma taxa anual de 3,64%, nos cálculos da economista do Grupo de Conjuntura da UFRJ Cecília Roff. Aí entra o crédito. Para pessoas físicas, a alta no volume de empréstimos cresceu 36%. O desempenho do consumo no PIB é um dos sinais de que o mercado interno reagiu. Ele respondeu pela quase totalidade do avanço do PIB: da taxa de 1,4%, contribuiu com 1,25 ponto percentual. A demanda externa, calculada em cima das exportações menos as importações, representou apenas 0,15 ponto percentual da expansão. Repetindo um desempenho observado em 2004 e abandonado no primeiro trimestre deste ano.

BNDES estima que país terá expansão perto de 5% em 2006

Nas estimativas da LCA Consultores, o crescimento da economia em 2005 virá exclusivamente da demanda interna. Apesar do forte desempenho das exportações nos últimos meses, as importações estão em franca expansão e devem ser ainda mais fortes no segundo semestre. Com isso, a demanda externa terá impacto nulo na expansão da economia. A consultoria calcula que o consumo das famílias e os investimentos contribuirão com 3,2 pontos percentuais da alta esperada de 3,5% do PIB, e o consumo do governo responderá pelo restante 0,3 ponto percentual.

- Mas teremos um crescimento medíocre, entre 3,5% e 4%. O país tem condições de crescer mais entre 5% e 6%. Os juros altos esfriaram a economia - disse Cecília Roff.

Essa é a taxa esperada para os próximos anos pelo presidente do BNDES, Guido Mantega, que ressaltou a magnitude da expansão:

- Na taxa anualizada, o crescimento foi de 5,7%. Em 2006, devemos crescer próximo de 5%.

Nos dados entre abril e junho, a indústria foi o motor. A extrativa-mineral registrou o maior avanço desde quarto trimestre de 2000: alta de 17,5%. A construção civil cresceu 3,7% contra o mesmo trimestre do ano passado. A taxa veio bem mais alta que o tímido crescimento de 0,6% do primeiro trimestre:

- O efeito encadeador das exportações mais o crédito elevaram a produção - disse Olinto, do IBGE.

Crédito esse que aumentou no 14% para pessoas jurídicas. A reação do mercado interno apareceu também nas importações (2,4%).

- Isso reflete o aumento do investimento e a forte expansão da indústria - disse Castelar.

O único setor a encolher foi das comunicações, no segundo trimestre seguido. A queda foi de 1,7%, puxada por telefonia fixa (-19%).

O PIB foi a segunda pesquisa para a qual não houve entrevista coletiva. A greve de funcionários, iniciada dia 7, foi o motivo alegado pela direção do IBGE para cancelar a entrevista e evitar conflito com grevistas.

'Teremos um crescimento medíocre, entre 3,5% e 4%. O país tem condições de crescer entre 5% e 6%'

Cecília Roff

Economista da UFRJ

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