Título: MIL MORTOS EM BAGDÁ
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Fonte: O Globo, 01/09/2005, O Mundo, p. 29

Falso alerta sobre homem-bomba provoca pânico e correria em multidão de fiéis sobre ponte. Vítimas são esmagadas e afogadas

Um grito de alerta sobre a presença de um homem-bomba por perto criou pânico numa multidão de centenas de milhares de peregrinos xiitas que atravessavam ontem uma ponte em Bagdá, rumo a uma cerimônia religiosa, causando a morte de cerca de mil pessoas. Em correria desesperada, muitas delas foram massacradas e sufocadas. Outras pularam ou caíram da ponte, afogando-se. O rumor sobre atentado suicida não se confirmou, e o que pode ter sido uma brincadeira de mau gosto resultou no maior número de mortes em um único dia no Iraque desde o início da guerra, em março de 2003.

Autoridades disseram que as vítimas são na maioria mulheres e crianças afogadas no Rio Tigre ou pisoteadas quando seguiam para uma das mais importantes cerimônias religiosas xiitas. Desde a morte de cerca de 1.400 pessoas durante uma peregrinação a Meca em 1990 não haviam morrido tantas pessoas num evento muçulmano.

- É um desastre inacreditável. É pior do que se (Abu Musab) Zarqawi (líder terrorista) tivesse nos atacado - disse Uday Saleh al-Mohammedawi, membro de uma milícia que protegia os peregrinos.

O ministro do Interior, Bayan Jabor, culpou insurgentes pela tragédia, afirmando que um terrorista espalhou o rumor de que havia um homem com um cinturão de explosivos na multidão. Mas o ministro da Defesa, Saadoun Al-Dulaimi, negou que o episódio tenha relação com disputas sectárias no país. A ponte liga o bairro xiita de Kadhimiya ao bairro sunita de Adhamiya, reduto de insurgentes.

Os xiitas são maioria no Iraque, controlam o governo e têm sido alvos freqüentes de atentados suicidas atribuídos a sunitas, minoria que era protegida por Saddam Hussein e se ressente de ter perdido poder. Nos últimos dias, a tensão entre os dois grupos aumentou devido a divergências em relação ao texto de uma nova Constituição, que sunitas consideram prejudicial a eles.

Como rebeldes já atacaram xiitas em procissões religiosas nos últimos dois anos, autoridades haviam iniciado operações de busca e bloqueado estradas, procurando impedir atentados em meio à chegada de centenas de milhares de peregrinos à capital.

Custo no Iraque é maior que no Vietnã

Os peregrinos se dirigiam à mesquita do imã Musa al-Khadim, em Kadhimiya, para celebrar o aniversário de morte do imã, uma das figuras mais sagradas do islamismo xiita, quando a confusão começou. Mas o medo já se manifestara uma hora antes, quando rebeldes lançaram foguetes perto da mesquita, matando sete pessoas e ferindo 36, sendo contra-atacados por helicópteros americanos. Em mensagem na internet, o pouco conhecido grupo sunita Jaysh al-Taefa al-Mansura (Exército da Seita Vitoriosa) assumiu a autoria do ataque.

A TV iraquiana mostrou imagens dramáticas de pessoas que, tentando escapar do massacre, penduraram-se na ponte e caíram. Um bebê foi encontrado junto ao corpo da mãe. A ponte ficou cheia de sapatos deixados para trás na correria, e mulheres desesperadas se ajoelhavam sobre corpos, chorando e rezando.

- Muitos idosos morreram imediatamente, mas dezenas se afogaram. Muitos corpos ainda estão no rio e barcos estão sendo usados para recolhê-los - disse um policial.

Ambulâncias logo chegaram ao local. Enquanto algumas pessoas ajudavam a pôr corpos em macas, outras os enfileiravam à beira do rio. Corredores de hospitais ficaram cheios de cadáveres. O primeiro-ministro Ibrahim Jaafari decretou três dias de luto.

Um relatório do Instituto de Estudos de Política e da Política Externa em Foco - ambas organizações liberais e contra a guerra - divulgado ontem mostrou que a guerra no Iraque está custando mais aos EUA do que a guerra no Vietnã (anos 60 e 70). Intitulado "O atoleiro iraquiano", o estudo diz que as operações no Iraque estão custando US$5,6 bilhões por mês, ou quase US$186 milhões por dia. Já no Vietnã, Washington gastou em média US$5,1 bilhão por mês (corrigida a inflação) em oito anos.

Pânico, correria e tragédia