Título: UMA HOSPEDAGEM MAIS LONGA DO QUE O ESPERADO
Autor: Fernando Moreira
Fonte: O Globo, 01/09/2005, O Mundo, p. 31

Sem dinheiro, refugiados dividem quartos de hotel superlotados ou partem para abrigos do governo e de grupos assistenciais

NOVA ORLEANS. Antes do furacão Katrina, Sontierll Bacchus vivia numa casa de três quartos no leste de Nova Orleans. Agora ela divide um quarto de apenas duas camas com outras 20 pessoas, entre parentes e estranhos, num hotel em Atlanta. Sontierll é uma das mais de 80 mil pessoas que buscaram abrigo em hotéis e refúgios e que durante algum tempo ainda permanecerão sem saber o que aconteceu com suas casas.

Em Nova Orleans, o prefeito Ray Nagin acredita que demorará de 12 a 16 semanas para que os moradores possam retornar, já que as inundações deixaram a cidade sem eletricidade e com a água contaminada.

Centenas de milhares de moradores da área de Nova Orleans ocupam hotéis superlotados, motéis e abrigos improvisados. Nos refúgios, eles se concentram em volta das televisões em busca de notícias de suas casas, parentes e amigos.

Mesmo hotéis em Houston (a 560 quilômetros de Nova Orleans), Memphis (a 635 quilômetros), no Tennessee, e Little Rock (a 714 quilômetros), em Arkansas, estão lotados. A Cruz Vermelha americana criou mais de 230 refúgios em escolas, igrejas e centros comunitários em seis estados do sul do país. Muitos refugiados, que haviam se hospedado em hotéis antes do furacão, viram-se sem dinheiro e tiveram que deixar os hotéis.

No domingo, America Williams, o namorado e 13 parentes deles (entre eles sete crianças) partiram de Nova Orleans num veículo utilitário.

- Nos disseram para ir para o mais longe possível. Queríamos ir para Atlanta, mas chovia tanto que paramos em Birmingham - contou.

Após algumas noites em três quartos alugados num motel, eles decidiram ir para um abrigo da Cruz Vermelha.

- Gastamos até o último centavo. Viemos ao abrigo buscar algum tipo de ajuda.

Este não é um caso isolado. Brady Warner, coordenador de um abrigo da Cruz Vermelha em Baytown, Texas, está recebendo uma segunda leva de refugiados: pessoas que achavam que o período longe de suas casas seria curto. Somente a Cruz Vermelha americana está fornecendo 500 mil refeições por dia aos desabrigados. Organizações não-governamentais acreditam que esta seja a maior operação de emergência num desastre natural na história dos EUA.

- Nosso trabalho não será uma questão de semanas ou meses. Provavelmente será mais que isso - disse Phil Zepeda, do grupo America's Second Harvest.

Demora na entrega de suprimentos

Navios poderão ser usados para abrigar moradores das áreas atingidas. A Carnival Cruise Lines - uma das maiores linhas de cruzeiro do mundo - recebeu um pedido do governo americano para utilizar seus navios como abrigos ou na assistência aos sobreviventes.

Em Biloxi, Mississippi, sobreviventes exigiam comida e água e reclamavam da demora na entrega dos suprimentos. Um armazém foi saqueado, após pessoas ouvirem que alimentos seriam distribuídos no local.

- Temos crianças que não comeram. Sei que leva tempo, mas isso é loucura - reclamou Julisa Clay.

Legenda da foto: DOIS IDOSOS caem ao tentar subir num barco após serem recusados numa clínica em Nova Orleans