Título: A forca
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 02/09/2005, Panorama Político, p. 2

Começou a ser cumprida ontem a sentença de Roberto Jefferson: será cassado mas não irá sozinho. Poucas horas depois de o Conselho de Ética aprovar sua cassação, as CPIs do Mensalão e dos Correios aprovaram o relatório parcial com o nome de outros 18 deputados. Dissipa-se o cheiro de pizza que alguns diziam sentir, a opinião pública começa a ser contentada e a oposição exulta.

As cassações virão. Não há Severino que possa deter os processos iniciados ontem, diante do clamor da mídia e dos setores sociais que têm voz, pedindo a punição imediata dos que receberam dinheiro do valerioduto. Não importa com que freqüência ou com que finalidade, como disseram ontem tantos membros das CPIs. O fato é que alguns têm que morrer.

Os que surfaram no enfrentamento com Severino depois de suas palavras deslocadas, pedindo punição mais branda ¿ como o deputado Fernando Gabeira ¿ sabem muito bem que o presidente da Câmara, eleito com a ajuda da oposição, não dispõe hoje da menor força de atrito para deter a marcha das cassações.

Dos 18 nomes, 7 são do PT. Desde que elegeu seus primeiros deputados federais, na eleição de 1982, nunca o PT viu rolar a cabeça de um dos seus. Mas ajudou a cortar muitas, ajudou a fomentar a cultura autoritária da cassação de mandatos pelo próprio Congresso, prática em desuso nas democracias modernas, que deixam a punição de parlamentares transgressores para o povo, na eleição seguinte. Ou para o Judiciário, onde o processo não é, como justificou o relator Osmar Serraglio em seu relatório, ¿eminentemente político¿. Quando o processo é jurídico, e conduzido pelo Judiciário, livra-se o Legislativo de violar a vontade dos eleitores e de cometer eventuais injustiças (como a cassação do ex-presidente da Câmara Ibsen Pinheiro, que assombra algumas consciências). Mas o remédio brasileiro ainda é a cassação e nisso também o PT prova de seu próprio veneno. No passado propunha cassações como quem pede um café e até lançou o uso da palavra ¿pizza¿ para designar tentativas de conciliação.

A forca foi montada e agora o processo seguirá seu curso. No plenário, alguns serão guiados pela luta política, outros farão o que acham mesmo necessário e outros, ainda que não gostando, farão o que acham conveniente, pensando na opinião pública e na renovação do mandato em 2006.

Ainda haverá espetáculo. Roberto Jefferson tem feito circular a informação de que dirá no plenário o que fez com os R$4 milhões que recebeu do PT. Mas circula nos corredores também o rumor de que exibirá ali uma mala com a dinheirama. Criaria um constrangimento estrondoso nas não salvaria seu mandato.

Os petistas começaram a planejar ontem mesmo uma ofensiva de defesa, com cada um demonstrando que pagou contas de campanha com o que recebeu de Delúbio e denunciando o processo como uma ¿caça a bruxas de asas marcadas¿, como diz o deputado Paulo Rocha. Dirceu, caso à parte, recorrerá ao STF.

O PSDB ouvirá muitas cobranças pelo fato de o senador Eduardo Azeredo ter ficado fora da lista. O caixa dois de 1998, montado por Valério, foi desconsiderado pelo relator Serraglio. Não foi o partido que brigou pela exclusão, garantem os tucanos. Para muito deles, teria sido melhor mesmo que o nome do senador tivesse sido incluído. Com uma boa defesa no Conselho de Ética do Senado, o assunto estaria encerrado. Agora, vai se falar em pizza tucana.

O PFL encontrou melhor saída. Nem tentou tirar Roberto Brant da lista mas vai lhe dar todo apoio e cobertura no Conselho de Ética da Câmara e no plenário, se for o caso.

Dia dos caçadores

O senador Delcídio hoje mereceu uma medalha de ouro, dizia o deputado Eduardo Paes, depois de aprovado o relatório das duas CPIs, com o nome dos 18 cassáveis. A situação de fato se embananou muito pela manhã, tanto dentro da CPI dos Correios, com os governistas se recusando a votar o parecer de Serraglio, como entre as duas CPIs, com a do Mensalão rejeitando o papel coadjuvante que lhe foi reservado. Foi Delcídio quem costurou os entendimentos que garantiram a votação e a aprovação do relatório. Com isso, espera-se que agora sua CPI fique mais liberada para investigar a origem dos recursos do valerioduto.

Já o presidente e o relator da CPI do Mensalão, senador Amir Lando e deputado Abi-Ackel, diziam sob reserva estar com a consciência jurídica ferida.

A CPI dos Bingos deu provas de que tudo pode investigar, o passado e até o futuro dos petistas. Concluiu, após ouvir o irmão do prefeito assassinado Celso Daniel, que não havia em Santo André uma conexão com o jogo. Já sabia disso. Queria é que ele repetisse as acusações que já fizera contra o assessor presidencial Gilberto Carvalho e o deputado José Dirceu. E como no jogo que lhe dá nome, bingou.

Tiro no pé

Se os congressistas que derrubaram o veto do presidente Lula ao aumento de 15% para o Legislativo quiseram atingir o governo, viram o feitiço se voltar contra o Congresso, diz o ministro da Coordenação Política, Jaques Wagner.

De fato, a derrubada do veto está produzindo reação social tão forte quanto a que se seguiu às declarações de Severino Cavalcanti pedindo indulgência para os cassáveis.

¿ Entendo que os congressistas não resistiram à pressão corporativa dos servidores da Casa. Mas, meu Deus, se o Executivo também sucumbisse tão facilmente a pressões desta natureza, onde iria parar o equilíbrio fiscal? ¿ pergunta o ministro.