Título: O déficit educacional da América Latina
Autor: Sebastian Edwards
Fonte: O Globo, 02/09/2005, Opinião, p. 7

Adecisão tomada pela China de acabar com o câmbio fixo, política que o país mantinha há uma década, provocou reações de entusiasmo e otimismo na América Latina. Afirma-se, de um extremo a outro do continente, que uma taxa de câmbio mais flexível para o yuan diminuirá a injusta vantagem da China nos mercados internacionais. Isso, asseguram, tornará as exportações de manufaturados latino-americanos mais competitivas em escala mundial.

O otimismo é infundado. Apesar das reformas anunciadas, é improvável que a moeda chinesa sofra uma flexibilização cambial significativa. A rigor, os dirigentes chineses já declararam que o novo sistema cambial terá como objetivo manter a estabilidade da moeda. Essa política é inspirada na de Cingapura, que tem evitado grandes flutuações de câmbio, e adotou nos últimos três anos uma taxa cambial bem mais competitiva do que a dos países latino-americanos.

Em outras palavras, para ter êxito na competição com a China, os países latino-americanos precisam aumentar a produtividade. Infelizmente, o continente não está em posição de enfrentar com sucesso esses desafios.

O principal problema está na má qualidade do sistema educacional da região. Diversos estudos internacionais sobre a questão, feitos nos últimos anos, situam a América Latina nas últimas posições, particularmente em matemática e ciência.

Por exemplo, em testes aplicados pela OCDE em 2003, os estudantes brasileiros ficaram em último lugar em matemática, num conjunto de 40 países. O México ficou em 37º lugar. O Uruguai, de todos os países latino-americanos o que se saiu melhor, ficou em 35º.

Os estudantes latino-americanos tiveram desempenho particularmente ruim na ¿solução de problemas¿. Isso mostra o atraso dos sistemas educacionais da região, que ainda dão importância excessiva à memorização e à decoreba. Infelizmente, os resultados não são melhores na avaliação da capacidade de leitura. Aqui, mais uma vez os latino-americanos são os últimos numa amostra de 40 países.

Segundo o conceituado Trends in International Mathematics and Science Study (TIMSS), em 2003 os estudantes de oitava série ficaram em 39º lugar em matemática num grupo de 44 países; em ciência, saíram-se apenas ligeiramente melhor, ficando em 37º. Curiosamente, muitos países que se saíram melhor que o Chile nesses testes padronizados têm renda per capita menor.

O desempenho da América Latina na área de educação é igualmente fraco no nível universitário. Segundo uma pesquisa realizada em 2004 pelo ¿Times¿ de Londres, nenhuma universidade latino-americana está entre as 200 melhores do mundo. Isso contrasta agudamente com a China e a Índia, que têm universidades de categoria internacional, especialmente em ciência e engenharia. Tailândia, Turquia e Cingapura também têm universidades de alto nível na área de ciências, incluindo biotecnologia.

Se quiser ter êxito e alcançar a prosperidade, a América Latina precisa reformar seu sistema educacional. Um índice sustentado de crescimento econômico que ajude a reduzir a pobreza e a desigualdade só pode ser alcançado com uma força de trabalho qualificada e inovadora.

As reformas precisam cobrar responsabilidade dos professores de ensinos básico e médio. É preciso também transformar em norma o pagamento de professores de acordo com o seu desempenho, assim como a demissão dos incompetentes. Além disso, a adoção de critérios de competitividade para financiar a pesquisa universitária deve ser especialmente encorajada.

Implantar essas reformas requer coragem e visão. Em particular, os políticos precisam estar preparados para enfrentar os sindicatos de professores, tradicionalmente avessos a reformas que tentem introduzir critérios de competição e cobrança de responsabilidade.

SEBASTIAN EDWARDS foi economista-chefe do Departamento da América Latina do Banco Mundial. © Project Syndicate