Título: PASSOU DO TEMPO
Autor:
Fonte: O Globo, 04/09/2005, Opinião, p. 6

Se houve algum consenso assim que a crise política se instalou, foi em torno da necessidade de uma reforma política possível de ser aprovada até o final de setembro, para poder vigorar já em 2006. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a oposição tucana e pefelista, e até a ala esquerda do PT, todos passaram a defender a iniciativa.

Com motivos. Na raiz do escândalo do mensalão e do caixa dois de partidos e políticos está uma legislação no mínimo inadequada. Falhas nessa legislação tornaram possível a compra de apoio de parlamentares e da adesão de partidos nanicos à base do governo, numa operação empreendida pela conexão entre a cúpula do PT e a lavanderia de Marcos Valério. A falta de regras rígidas para a fidelidade partidária e a inexistência de punições proporcionais à gravidade do crime que é traficar dinheiro por campanhas e por caixas de partidos são algumas dessas falhas.

Pela exigüidade do tempo, seria imprescindível concentrar essa reforma em alguns poucos pontos, e deixar para o próximo presidente e o Congresso a tarefa de formular um conjunto de mudanças mais amplas.

O presidente do PFL, senador Jorge Bornhausen, teve, então, a meritória iniciativa de encaminhar à Comissão de Constituição e Justiça do Senado um desenho de minirreforma. Infelizmente, um conjunto de propostas equivocadas. O projeto, já aprovado no Senado, perdeu-se ao intervir na produção das campanhas, para barateá-las e assim reduzir a necessidade de financiamento eleitoral. Tolhe-se o embate entre os candidatos e não se evita o caixa dois. Existem, ainda, outros equívocos. E tantos são eles que não há mais tempo de a Câmara reformar as propostas com o cuidado necessário, e remetê-las de volta ao Senado para serem convertidas em lei, no prazo legal.

Além disso, como a crise contaminou todo o Congresso, não há clima para um debate sério e de alto nível sobre o aperfeiçoamento da legislação político-eleitoral. O mais sensato é nada ser feito e esperar-se 2007. O que significa também não se votar o projeto anterior, saído da CCJ da Câmara, onde foi cometido o erro de reduzir-se a cláusula de barreira às legendas nanicas. Em nome de boas intenções, pode-se piorar o que já existe