Título: Severino na mira da oposição
Autor: Elenilce Bottari, Lydia Medeiros e Gerson Camarott
Fonte: O Globo, 05/09/2005, O País, p. 3

Parlamentares se reúnem para discutir formas de afastar o presidente da Câmara

Os partidos de oposição na Câmara se reúnem hoje para formalizar uma proposta que pode definir a situação do presidente da Casa, Severino Cavalcanti (PP-PE): PFL, PSDB, PDT, PPS e PV querem o afastamento voluntário de Severino do cargo para a abertura de investigação, no Conselho de Ética, sobre as denúncias de que ele recebia propinas de um prestador de serviços da Câmara. Caso Severino se recuse a sair, os partidos devem pedir a cassação de seu mandato.

Os parlamentares contrários à permanência de Severino defendem seu afastamento imediato até o fim do julgamento dos processos contra deputados envolvidos nos escândalos dos Correios e do Mensalão. Segundo o deputado Fernando Gabeira (PV-RJ), que lidera com o PSDB e o PFL o coro dos descontentes, Severino não tem condições morais ou mesmo capacidade de presidir a Câmara.

Líderes acertaram reunião por telefone

Reportagem da revista ¿Veja¿ afirma que Severino recebeu propinas mensais de R$10 mil entre março e novembro de 2003, pagas por Sebastião Augusto Buani, que explora atualmente um dos oito restaurantes da Câmara. A revista diz que ele também recebeu de Buani outros R$20 mil pela renovação de seu contrato em 2002, quando o deputado era primeiro-secretário da Casa. A reportagem menciona ainda um suposto documento assinado por Severino, assegurando a Buani monopólio de cinco anos como concessionário. Esta seria a prova mais importante contra Severino.

¿ Em qualquer país, Severino teria renunciado. Ele não tem condições de ser o condutor de um processo tão delicado que envolve a cassação de tantos deputados. Isto fere a imagem da Casa. Quanto ao documento, se o deputado Severino disser que assinou sem ler, então iremos pedir seu afastamento por incapacidade ou irresponsabilidade civil. Ele não tem como continuar no cargo ¿ afirmou Gabeira, que batera de frente com Severino no início da semana. Gabeira o chamou de indigno para o cargo, depois que Severino afirmou não acreditar na existência do mensalão e defendeu pena branda para o crime de caixa dois.

PPS vai assinar representação

A estratégia foi acertada pelos líderes e presidentes de partidos oposicionistas no sábado, por telefone. No mesmo dia, o PPS decidiu encaminhar uma representação contra Severino ao Conselho de Ética, pedindo a cassação do mandato.

Segundo o deputado Raul Jungmann (PPS-PE), o partido resolveu atender ao apelo do líder da minoria, José Carlos Aleluia (PFL-BA), e aguardar o resultado da reunião e a reação de Severino. Caso ele não deixe a presidência, o pedido de cassação será endossado por todos os partidos de oposição.

¿ É melhor que esta seja uma atitude da maior envergadura e amplitude política. Se Severino aceitar, aguardamos investigação independente. Se não, temos decisão e esperamos que os demais partidos tenham a mesma ¿ diz Jungmann.

Gabeira disse que os parlamentares deverão insistir para que Severino renuncie imediatamente e, se isso não funcionar, tentarão levar o caso ao Conselho de Ética.

¿ Se não funcionar, poderemos simplesmente virar as costas para ele. A oposição unida não aceitará participar de uma sessão que ele esteja presidindo ¿ disse o parlamentar.

Também foram procurados o presidente do PDT, Carlos Lupi, e o líder do PSDB, Alberto Goldman (SP). Segundo Aleluia, o problema de Severino não está restrito à acusação de receber um ¿mensalinho¿ do dono do restaurante que funciona na Câmara. Para o líder, a situação do presidente da Câmara é mais complexa por causa das declarações contra a punição de parlamentares e a participação, como avalista, da chamada ¿Operação Ronivon¿ ¿ a versão apresentada pelo PP para justificar o dinheiro recebido pelo empresário mineiro Marcos Valério Fernandes, o operador do mensalão.

Segundo Severino, o partido usou os recursos para pagar os advogados que defenderam o deputado Ronivon Santiago (PP-AC), acusado de comprar votos na eleição de 2002.

¿ O conjunto da obra de Severino é muito ruim. Ele precisa esclarecer as circunstâncias da ¿Operação Ronivon¿, do ¿mensalinho¿ e de fatos como a tentativa de abafar punições na Câmara. O Brasil quer a saída dele do comando da Câmara. Não dá mais para ele ficar. A situação dele ficou totalmente insustentável ¿ analisa Aleluia.

Regimento não prevê impeachment

O líder do PSDB, deputado Alberto Goldman (SP), diz que Severino, ao acusar a oposição de estar por trás das denúncias, perdeu as condições de comandar a Câmara. Goldman lembra que o regimento da Casa não prevê o instrumento do impeachment para afastá-lo do cargo, o que só poderia ocorrer por iniciativa de Severino ou pela perda do mandato:

¿ O fato de ele ter nos acusado eliminou qualquer diálogo. Uma representação deve estar ligada à comprovação das denúncias.

¿ Não haverá outro caminho senão investigação no Conselho de Ética ¿ diz o líder do PFL, Rodrigo Maia (RJ).

O vice-líder do governo na Câmara, Sigmaringa Seixas (PT-DF), mostrou-se preocupado com o enfraquecimento não só da figura do presidente da Câmara, mas com os danos para a imagem da instituição.

¿ É uma acusação grave. É preciso que se faça uma apuração rigorosa e criteriosa. Estamos vivendo um momento delicado, cheio de boatos. É evidente que esse tipo de denúncia atinge o presidente e a instituição.

O deputado Eduardo Paes (PSDB-RJ) também defende o afastamento. Segundo ele, Severino não tem, no momento, a isenção necessária para conduzir o processo contra ele mesmo nem contra outros deputados:

¿ Ele deve se afastar para se defender. É fundamental apurar este episódio com transparência, ou ele fica em situação embaraçosa para conduzir processos contra outros parlamentares .

O deputado Chico Alencar (PT-RJ) afirmou que as denúncias contra Severino concretizaram uma situação incômoda na Câmara:

¿ Ele deveria ser um árbitro, mas age e opina como presidente do Sindicato dos Deputados ¿ afirmou.