Título: NA DÚVIDA, MAIS CAUTELA
Autor: Patricia Eloy
Fonte: O Globo, 06/09/2005, Economia, p. 19

Saques em fundos aumentaram em agosto. Parte dos recursos foi para poupança e CDB

Ofim de agosto foi marcado por pesados resgates na indústria de fundos de investimento. Nos últimos cinco dias úteis do mês, os investidores sacaram o equivalente a R$3,2 bilhões, mais que o dobro do registrado no mesmo período do mês anterior ¿ quando os resgates somaram R$1,5 bilhão, de acordo com dados do site Fortuna. Os resgates foram generalizados: atingiram todas as classes de fundos, dos mais conservadores aos mais agressivos; a única exceção foram os fundos de previdência. Para a maioria dos analistas, os saques foram um efeito colateral da crise política: também no fim de agosto surgiram as primeiras denúncias envolvendo o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, que foi acusado por seu ex-assessor Rogério Buratti de ter recebido propina quando era prefeito de Ribeirão Preto.

Apesar dos resgates, a indústria encerrou agosto com captação (depósitos menos retiradas) positiva de R$1,131 bilhão. Em junho, quando a crise política estourou, os saques nos fundos superaram os depósitos em R$3,505 bilhões.

¿ Parece ter sido um rescaldo da crise política. Alguns investidores preferiram reduzir aplicações diante das novas acusações. Os pequenos aplicadores têm optado pela cautela em meio ao fogo cruzado da crise ¿ afirma Marcelo Gerbassi, gestor de Renda Variável da Icatu Hartford.

¿ Foi uma semana atípica: houve uma aceleração dos resgates de forma generalizada, o que não é comum nesse período do mês. Tudo leva a crer que pode haver um forte componente político por trás dos resgates, já que o período se seguiu às denúncias contra Palocci. Além disso, o investidor pessoa física costuma ter uma reação mais lenta que os institucionais, como bancos, em cenários de crise ou euforia: são os últimos a entrar ou sair do mercado ¿ explica o economista Marcelo D¿Agosto, sócio do site Fortuna.

Resgates também em setembro

O movimento ultrapassou o calendário de agosto. No primeiro dia útil de setembro, os fundos também registraram resgates: R$250 milhões. Wilson Risolia, vice-presidente de Ativos de Terceiros da Caixa Econômica Federal, avalia que parte dos recursos que deixaram os fundos migrou para a poupança, outra parte para os CDBs. Mas também teve investidor que preferiu simplesmente sacar os recursos, diz ele:

¿ O investidor ficou um pouco mais conservador e, por isso, o movimento foi além do fator sazonal: na última semana do mês costumamos ter resgates maiores na indústria, mas não dessa magnitude.

Renato Ramos, gestor de Renda Fixa do HSBC Asset Management, lembra que os CDBs têm atraído investidores devido a um aumento na rentabilidade oferecida pelos papéis, que em muitos casos supera a dos fundos de investimento conservadores.

¿ Também é natural que, ao sair dos fundos, parte do dinheiro tenha encontrado abrigo na poupança ¿ acredita Ramos.

Uma análise do desempenho da caderneta mostra que as retiradas foram constantes durante quase todo o mês de agosto, mas os depósitos apareceram no fim do mês, coincidindo com os resgates nos fundos. Nos dias 25, 26 e 30, a poupança recebeu R$118,2 milhões, R$676 mil e R$333,9 milhões, respectivamente. Nos dez dias anteriores, os saques somaram mais de R$3 bilhões.

Para Ramos, do HSBC, é preciso esperar mais tempo para avaliar o que motivou os resgates nos fundos:

¿ Hoje, não consigo identificar se houve uma motivação meramente política ¿ diz Ramos.

Edvaldo Morata, diretor-executivo do Santander Banespa Asset Management, minimiza o movimento:

¿ Os investidores aplicam nas primeiras três semanas do mês e resgatam na última, embora não nesse volume. Mas ainda não acredito que haja um grande número de investidores tentando se defender da crise. O mercado, apesar de tudo, vai muito bem: o dólar tem recuado e a Bolsa, avançado.

O fato é que, apesar da sacudida na indústria na última semana de agosto, nos últimos três meses de crise política os fundos de investimento captaram o equivalente a R$2,504 bilhões. As maiores movimentações aconteceram nas categorias curto prazo, DI e renda fixa, que captaram R$2,94 bilhões no período ¿ segundo analistas, reflexo também dos elevados juros, já que a Selic está hoje em 19,75% ao ano ¿ e previdência, com aportes de R$1,97 bilhão.