Título: A ANGÚSTIA DE NÃO SABER SE O SALÁRIO SERÁ DEPOSITADO
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Fonte: O Globo, 07/09/2005, O Mundo, p. 29

Muitos que estão em hotéis e imóveis alugados terão de pagar e esperar reembolso

NOVA ORLEANS. O estresse que os sobreviventes do furacão Katrina vêm sofrendo pela perda de sua casa, suas roupas, seus álbuns de fotografias e, em vários casos, pela morte de alguém da família, está sendo agravado, agora, pela insegurança sobre o seu futuro imediato. A grande maioria não sabe quando e nem onde receberá o seu salário.

Como a perspectiva é a de que a cidade fique fechada para reconstrução por pelo menos três meses, muitos sequer sabem se os seus empregadores continuarão pagando-lhes nesse amargo período de espera.

- Eu espero que, pelo menos, consiga um trabalho em outra cidade nessa mesma empresa - disse Al Williamson, que, ao ser recolhido por equipes de resgate ontem cuidou de colocar numa sacola de plástico o seu uniforme de balconista de uma lanchonete do McDonald's "para provar que faço parte da empresa", disse ele.

Estações de rádio da região estavam recebendo ontem desesperados telefonemas de pessoas que agora vivem em abrigos públicos ou em hotéis em outras cidades, querendo saber como poderão receber o pagamento devido. Um comunicado do governo federal deixou furiosos os seus funcionários e também os aposentados vítimas do Katrina. O anúncio dizia que os cheques mensais referentes a salário ou pensão estariam à sua disposição nas agências dos correios.

O problema é que há três óbvios obstáculos em relação a isso. O primeiro é que todas as entradas da cidade estão bloqueadas, com policiais e soldados impedindo a volta dos residentes até que a área seja declarada segura. Em segundo lugar, mesmo que os trabalhadores pudessem entrar em Nova Orleans para buscar os seus cheques, nenhuma agência dos correios está funcionando. E, em terceiro lugar, mesmo que elas estivessem funcionando, não haveria como sacar os cheques - pois todos os bancos estão fechados.

Apenas os funcionários dos cassinos do litoral da Louisiana e do Mississippi receberam notícias tranqüilizadoras. As empresas proprietárias informaram que vão garantir três meses de salário, apesar de os estabelecimentos permanecerem com as suas portas fechadas.

O problema é grave para a maioria, pois a ajuda financeira do governo, pela Agência Federal de Administração de Emergências (FEMA, na sigla em inglês) é menos animadora do que parece. Quem não encontrou vagas em abrigos públicos, ou optou por viver provisoriamente em hotéis ou alugando imóveis - contando com o auxílio federal a que têm direito em calamidades como essa - só têm direito a reembolso.

Ou seja: quem não tiver uma reserva bancária ou um limite de crédito avantajado terá problemas para bancar a moradia pois o governo não paga os gastos diretamente, como muitos imaginavam:

- Para ter acesso ao dinheiro que temos para esse tipo de ajuda, a pessoa precisa telefonar para um número especial, fornecer o número de sua matrícula no serviço de previdência social e se registrar pleiteando a assistência. A partir daí é preciso guardar os recibos para comprovar os gastos e submeter à nossa análise para ser reembolsado. Temos de fazer isso porque, infelizmente, há muita gente que nessas horas trata de tirar proveito do dinheiro público - disse Jesse Siegel, agente da FEMA que visitava a área ontem.

Legenda da foto: CINDY E LYNN Patterson desolados com a destruição em sua casa em Biloxi, Mississippi