Título: Bush anuncia investigação em 'Katrinagate'
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Fonte: O Globo, 07/09/2005, O Mundo, p. 29

Presidente quer liderar apuração do que deu errado no socorro. Mas Congresso, cada vez mais crítico, faz o mesmo

WASHINGTON. Depois de matar milhares de pessoas, deixar dezenas de milhares de desabrigados e espalhar destruição em três estados americanos, a próxima vítima do furacão Katrina pode ser a carreira política do presidente dos Estados Unidos, George W. Bush. No momento em que recebe críticas da oposição, de especialistas em gerenciamento de desastres e até mesmo de seu pai, o ex-presidente George Bush, o presidente luta para retomar a iniciativa política e anunciou ontem que comandará uma investigação sobre as falhas do governo na resposta à tragédia. Os custos para recuperar a região estão sendo avaliados por congressistas em US$150 bilhões (R$350 bilhões).

Porém, no momento em que a falta de preparo e o péssimo trabalho da Casa Branca na resposta à tragédia já começa a ser chamado de Katrinagate, a decisão de Bush de fazer uma investigação foi acompanhada de uma ação semelhante do Congresso. Uma das parlamentares que tomaram à frente na decisão foi a senadora Hillary Clinton, pré-candidata democrata à Presidência nas eleições de 2008.

- O que quero fazer é liderar uma investigação para descobrir o que deu certo e o que deu errado. É muito importante para nós entender a relação entre os governos federal, estadual e local no caso de uma catástrofe - disse Bush.

Apesar da declaração, Bush não explicou qualquer detalhe sobre esta investigação, limitando-se a dizer que o vice-presidente, Dick Cheney, visitará as áreas atingidas.

Parlamentares democratas e republicanos, porém, anunciaram que o Congresso fará sua própria investigação. Há anos se sabia que um furacão poderia inundar Nova Orleans e a meteorologia previra que o Katrina se encaminhava para a cidade. E também para descobrir as causas da ineficiência da resposta do governo na ajuda às vítimas.

- Na resposta inicial à catástrofe do furacão Katrina todos os níveis de governo deixaram de cumprir suas obrigações. O resultado foi um enorme sofrimento, privações desnecessárias e desnutrição generalizada - criticou a senadora republicana Susan Collins, presidente da Comissão de Segurança Interna. - Se nosso sistema fez um trabalho tão ruim quando não há um inimigo, como os governos federal, estadual e local iriam reagir a um ataque terrorista?

Mesmo dizendo que "não é hora para política partidária", o senador democrata Joseph Lieberman foi duro:

- De certa forma, não apenas a costa do Golfo do México foi atacada, mas a autoconfiança dos EUA na forma como o governo enfrenta este tipo de crise nos dias seguintes à tragédia.

Pais de presidente Bush cometem gafes

Já o senador Patrick Leahy foi menos diplomático nas acusações ao governo:

- Demos bilhões de dólares para o Departamento de Segurança Interna. Votei a favor destes bilhões na Comissão de Orçamento. Demos todas as ferramentas pedidas por eles. O que diabos está acontecendo?

A patética resposta do governo à catástrofe foi criticada até mesmo pelo pai do presidente, que, num ato falho, disse numa entrevista que há falhas nas ações do governo de seu filho. Perguntado pelo jornalista Larry King como via as ações do governo, Bush pai respondeu:

- Não estou satisfeito - disse Bush pai, que, percebendo a gafe, tentou aliviar o peso da crítica. - O que ele pode fazer? Não pode ficar ouvindo cada crítica da página de editoriais do "New York Times".

A mãe do presidente, a ex-primeira-dama Barbara Bush, também cometeu uma gafe, ao mencionar a recepção que o estado do Texas dá aos refugiados.

- O que estou ouvindo é que todos (os refugiados) querem ficar no Texas. E muitas pessoas no estádio são, você sabe, desprivilegiadas de qualquer forma. Então, isso está funcionando muito bem para eles.

Legenda da foto: ROBERT FONTEAINE, segurando um cãozinho, agradece a um bombeiro que tentou salvar sua casa, quase toda destruída pelo fogo em Nova Orleans