Título: Um fato, três versões
Autor: Helena Celestino
Fonte: O Globo, 08/09/2005, O País, p. 3

Severino dá explicações desencontradas, mas diz estar pronto para enfrentar acusações

Em três horas, o presidente da Câmara dos Deputados, Severino Cavalcanti, apresentou ontem em Nova York três versões diferentes para o documento entregue à Polícia Federal pelo comerciário Izeilton Carvalho de Souza, comprovando sua ligação com o dono do restaurante Fiorella, instalado no décimo andar da Câmara, de quem o parlamentar teria recebido propina. Mas apesar das versões conflitantes, Severino disse que está pronto para enfrentar os parlamentares de partidos de oposição que decidiram pedir ao Conselho de Ética sua cassação por quebra do decoro parlamentar.

Às 12h30m, ao chegar à ONU para o almoço que estava oferecendo aos presidentes dos parlamentos de nove países de língua portuguesa, Severino admitiu que poderia ter assinado o contrato. No documento, de abril de 2002, o então primeiro-secretário da Câmara dava garantias ao empresário Sebastião Buani de que o contrato de concessão do restaurante seria prorrogado até janeiro de 2005.

¿ Não assinei, mas se assinei é um contrato normal que deve estar com toda a documentação ¿ garantiu Severino, inicialmente.

Pouco depois, antes mesmo de sentar-se à mesa com seus colegas, Severino mudou a versão:

¿ Tem de ver os originais, o ônus da prova cabe ao acusador.

Terminado o almoço, durante o qual não bebeu o vinho ou o champanhe servidos, mudou mais uma vez sua versão. Ainda não eram 15h, ele continuava na mesma sala e nem tinha telefonado para o Brasil:

¿ Esta documentação não existe, se existe é uma falsidade. Documento como aquele eu não assinei ¿ disse, apesar da perícia feita pela revista ¿Veja¿ reconhecer a sua assinatura como autêntica.

Deputado diz não estar angustiado

Mais tarde, já na recepção pelo 7 de Setembro no The Racket & Tennis Club, Severino insistiu:

¿ A ¿Veja¿ comprou denúncias falsas. Essa perícia não existe, porque não existe o documento. Esse documento só pode ser falso.

Ao ser perguntado sobre o pedido de cassação de seu mandado, feito pelos partidos de oposição ao Conselho de Ética, desafiou:

¿ Essas decisões já tomaram diversas vezes, que continuem tomando. Estou pronto para enfrentá-los ¿ afirmou.

Sempre avisando que não comentaria a crise porque estava representando o Brasil no exterior, ele praticamente só tratou desse assunto com os jornalistas: afirmou e reafirmou que era inocente, disse que está tranqüilo diversas vezes e previu que será inocentado. Recorrendo continuamente a frases de efeito, disse que não está angustiado nem se sente traído:

¿ Sou um homem que não tem problemas. Quem não tem problemas não pode ter angústias.

O humor de Severino vem variando ao sabor das denúncias, mas nem sempre de maneira compreensível. Terça-feira, ao chegar a Nova York, ele estava comemorando o depoimento de Buani, no qual o empresário negou ter pagado propinas ao presidente da Câmara. De noite, estava tenso e emburrado, depois de tomar conhecimento das novas denúncias feitas por Izeilton.

Ontem, mesmo sabendo que os deputados estavam pedindo sua cassação, apostava que a crise estaria terminada quando ele chegasse domingo a Brasília.

¿ Quando chegar, a crise já estará superada. Todos aqueles de bom senso estão trabalhando para esta crise acabar ¿ afirmou.

Para ele, as denúncias estão sendo tramadas por pessoas que querem lhe atingir:

¿ As versões que eles deram, eles mesmos desmentiram.