Título: Mais um obstáculo
Autor: Ilimar Franco
Fonte: O Globo, 11/09/2005, O País, p. 3

Disputa pela presidência da Câmara pode atrasar início dos processos de cassação

A disputa que será travada esta semana no Congresso pelo controle da presidência da Câmara, com a tentativa da oposição de impedir que o deputado Severino Cavalcanti (PP-PE) se mantenha no cargo, deve atrasar o início dos processos de cassação por quebra de decoro parlamentar dos 18 envolvidos no escândalo do mensalão e de caixa dois de campanha. Dificilmente, em meio à crise Severino, a Mesa da Câmara enviará as representações das CPIs dos Correios e do Mensalão para o Conselho de Ética na terça-feira, como está marcado.

Se prevalecer a posição dos líderes de PSDB, PFL, PPS e PDT de que Severino, mesmo legalmente investido no cargo de presidente, não tem condições de comandar uma sessão do plenário, o outro lado deverá alegar que ele não tem autoridade também para comandar a reunião da Mesa Diretora. E ainda que Severino resolva se afastar do cargo de presidente, o conturbado clima político não deverá ser favorável a uma reunião da Mesa.

Da mesma forma também será beneficiado pela disputa dos partidos em torno da sucessão de Severino o deputado Roberto Jefferson (RJ), que conseguiu convencer a oposição a obstruir a votação da cassação de seu mandato, prevista para quarta-feira, caso Severino não renuncie ao cargo.

Todos os partidos já têm candidatos ao cargo de Severino. Para garantir o segundo posto na linha sucessória do presidente da República, não apenas estão dispostos a protelar as cassações, com o argumento de que é mais urgente resolver a questão maior da instituição, como podem, segundo deputados ouvidos pelo GLOBO, negociar a inocência de alguns dos envolvidos para garantir os votos necessários na eleição interna.

Aliados e oposição têm um consenso: o de que é preciso resolver a crise na presidência da Câmara o mais rapidamente possível. Tanto para o governo quanto para a oposição, a Casa precisa voltar a funcionar e a analisar projetos de interesse do país, como encerrar a votação da Medida Provisória 252 e votar as leis de Defesa da Concorrência e de Saneamento.

Cauteloso, governo aguarda defesa

Mas o governo tem um pouco mais de cautela e aguarda a defesa prometida por Severino para hoje, para avaliar se dá apoio ou não à representação que será assinada na terça-feira, pedindo a abertura de processo de cassação do mandato do deputado.

- Essa situação de incerteza é ruim. É preciso uma decisão logo - diz o ministro de Relações Institucionais, Jaques Wagner.

O PT quer que seja respeitada a regra da proporcionalidade e que o substituto de Severino seja escolhido pela maior bancada, a petista. Mas a oposição não aceita isso. PPS e PDT vetam a escolha de um petista sob o argumento de que foi esse partido que gerou a crise. PSDB e PFL não fazem veto explícito, mas ao propor um candidato de consenso, querem ter a palavra final sobre qual nome adequado para representar todos os partidos.

- Reputações existem na Câmara, mas não se faz um herói do dia para a noite - resume o líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP).

A guerra entre governo e oposição pode complicar ainda mais o quadro sucessório, pois o clima é de desconfiança dos dois lados. A disposição, manifestada por tucanos e pefelistas, de deflagrar um processo de crime de responsabilidade contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, cria dificuldades para se encontrar um nome capaz de unir a todos. Além disso, não existe hoje, como já ocorreu no passado, nenhum deputado que seja uma referência de credibilidade e confiança para o conjunto da Casa.

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Quase todos os partidos já têm candidatos

Respeito à proporcionalidade da bancada, que beneficiaria o PT, deve ser ignorado

BRASÍLIA. Uma nova e acirrada disputa pela presidência da Câmara, como a que resultou na eleição de Severino Cavalcanti em fevereiro, parece inevitável. Diversos nomes estão sendo cogitados como capazes de obter maioria no plenário caso Severino renuncie e sejam convocadas eleições para a escolha do substituto. O princípio de que o direito de indicar o candidato a presidente é do partido que tem a maior bancada, no caso, o PT, é praticamente ignorado e todos os médios e grandes partidos têm postulantes ao cargo.

Há quem relacione essa disputa com a eleição de 2006. É o caso do PSDB, em que o ex-líder Jutahy Magalhães Junior (BA) surge como o nome que uniria tucanos e parlamentares de outros partidos, por causa de sua amizade com o prefeito de São Paulo, José Serra - que surge com condições de enfrentar o presidente Lula.

O PFL tem duas opções: Roberto Magalhães (PE) e o ex-líder José Carlos Aleluia (BA). Até o PDT tem seu candidato, Alceu Collares (RS).

Oposição sabe que não consegue eleger candidato contra Lula

A oposição sabe que não tem forças para eleger um candidato claramente contra o governo Lula e trabalha com alternativas petistas com bom trânsito na oposição - Sigmaringa Seixas, Paulo Delgado e José Eduardo Cardozo - e nomes da base - os ex-ministros Aldo Rebelo (PCdoB-SP) e Eduardo Campos (PSB-PE). Mas a última opção é condenada pelo PSDB.

- O futuro presidente da Câmara não pode ter compromissos nem com o governo nem com a oposição. Quem foi ministro ou está no Ministério deveria ser excluído - diz o líder do PSDB, Alberto Goldman (SP).

Por esse critério, ficariam fora o ministro do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias, e o líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP). Sigmaringa é amigo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e tem ligações com Serra, mas pode enfrentar resistências da ala moderada, mais afinada com o ex-chefe da Casa Civil José Dirceu (PT-SP). Mas Sigmaringa teria menos dificuldade do que Cardozo, que enfrenta as mesmas resistências internas do PT. Paulo Delgado dificilmente passaria em seu próprio partido.

- Devemos aproveitar o fato para recuperar a tradição da maior bancada, mas isso não significa impor nomes. Temos que construir um candidato aceito pela base e pela oposição - diz Maurício Rands (PT-PE).

Os líderes relutam em avançar sobre nomes, pois estão mais empenhados em determinar um perfil para o futuro presidente da Câmara. Um dos compromissos será com a investigação e o julgamento dos acusados de quebra de decoro parlamentar. O futuro presidente deve trabalhar para recuperar a imagem da Casa e respeitar as diferentes posições políticas, não assumindo o papel de líder do governo ou da oposição. O líder da minoria, José Carlos Aleluia (PFL-BA), cita Severino para demonstrar como não deve ser o futuro presidente.

- Severino se elegeu dizendo que seria independente, mas logo após eleito passou a negociar cargos no governo. Sua escolha foi um erro de todo mundo, sobretudo do PT, que lançou dois candidatos - critica.