Título: PARA JURISTA, NÃO HÁ SEPARAÇÃO ENTRE OS CASOS
Autor: Adriana Vasconcelos/Ilimar Franco
Fonte: O Globo, 11/09/2005, O País, p. 10

'Não existe o jurídico afastado do político', afirma Reale Júnior

SÃO PAULO. O ex-ministro da Justiça Miguel Reale Júnior afirmou que não existe separação efetiva entre o julgamento político e o jurídico, no caso das cassações de mandatos. A fundamentação é a quebra de decoro, baseada na Constituição e no Código de Ética da Câmara dos Deputados, segundo ele.

- Em todos os casos se tem sempre o substrato político: a quebra do decoro. E há outros fatos, como um parlamentar mentir na Comissão de Ética. Agora, não existe o jurídico afastado do político.

Reale argumenta que a Constituição estabelece proibições aos parlamentares que poderão ser aplicadas nos casos dos ameaçados de cassação.

- Receber proventos públicos além da remuneração parlamentar, obter benefício econômico ilícito, vender o voto, aceitar suborno, por exemplo, são proibidos pela Constituição. Falo em tese, pois não conheço as provas de cada caso.

Um dos formuladores da petição de impeachment de Fernando Collor de Mello, Reale Júnior explica que este também foi um processo político-penal.

- Collor não teve apenas um julgamento político, como se diz. Os casos estavam enquadrados na Lei de Responsabilidade e também houve quebra de decoro. Não prosperou no jurídico por um erro da procuradoria na formulação da denúncia, mas os planos jurídico e político estão sempre unidos.

Comparação de telefonemas de Valério e Delúbio

Segundo Reale Júnior, no caso do ex-ministro José Dirceu há uma proposta fundamentada em quebra de decoro, que poderá ser agravada com a comparação dos telefonemas do empresário Marcos Valério de Souza e do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares para a Casa Civil. De acordo com o jurista, Dirceu pode ter seu mandato cassado embora estivesse afastado para exercer o cargo de ministro.

- Ele estava deputado, pois optou por receber como deputado enquanto exerceu o cargo de ministro, segundo parecer emitido pela Câmara - disse Reale Júnior, que é professor titular de direito penal da Faculdade de Direito da USP.

O advogado especializado em direito eleitoral Ricardo Penteado considera que é preciso diferenciar o político do jurídico. Para ele, o jurídico depende de provas mais concretas:

- No julgamento político, vale a máxima: não basta ser honesto, é preciso parecer honesto - diz o advogado.

Na avaliação de Penteado, Dirceu não poderia ser cassado do ponto de vista jurídico.

- Na minha opinião, ele não estava exercendo o mandato e por isto não poderia sofrer um processo político.