Título: Presidente da Usiminas vira personagem da investigação
Autor: José Casado
Fonte: O Globo, 11/09/2005, O País, p. 13

Soares é o único provedor de caixa dois já identificado

Rinaldo Campos Soares, de 67 anos, presidente da Usiminas e integrante do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da República, tornou-se um personagem singular nas investigações conduzidas pelas CPIs dos Correios e do Mensalão. Ele é, até agora, o único empresário identificado como provedor do esquema de financiamento ilegal de partidos e políticos.

Confissões formais obtidas pelas CPIs mostram que Soares usou uma das agências de publicidade do empresário Marcos Valério de Souza, o operador do mensalão, para doar dinheiro de forma ilegal a três deputados federais de Minas: R$150 mil a Roberto Brant (PFL); R$350 mil a João Magno (PT) e R$350 mil a Romeu Queiroz (PTB).

- Esse dinheiro é da Usiminas. Quem me prometeu foi o presidente Rinaldo Soares - repete Brant, do PFL, pelos corredores do Congresso.

Procurado pelo GLOBO, Soares não quis dar entrevista sobre o assunto.

Deputados também citaram empresa em suas defesas

Magno e Queiroz também citaram a siderúrgica na defesa apresentada às CPIs. O trio enfrenta processos de cassação. Soares deverá ser convocado para depor. Ele e a empresa se negam a fazer comentários sobre o assunto.

A opção pela forma ilegal de doar dinheiro a políticos e partidos foi, aparentemente, uma decisão exclusiva do presidente da Usiminas. Ela confronta a política de empresas integrantes do grupo de controle da siderúrgica - como os grupos Votorantim, Bradesco, Camargo Corrêa -, cujas contribuições nas eleições de 2002 e 2004 foram reportadas à Justiça.

Há três décadas, Soares marca presença nos bastidores da política mineira. Durante a ditadura garantiu a "paz social" na Usiminas, em Ipatinga (MG), por meio de um sistema de vigilância política dos empregados, dentro e fora da siderúrgica. Em 1997, o Sindicato dos Metalúrgicos apresentou à Justiça centenas de fichas de empregados mantidas pelo departamento de segurança da usina. Elas incluíam registros sobre a vida privada dos operários.

Os agentes internos codificavam cada "ato suspeito" de um empregado. Eram 19 os códigos. Cobriam desde atitudes políticas, dentro e fora da fábrica, até brigas domésticas e hábitos sexuais. Os casos considerados mais graves, classificados como "de esquerda", eram codificados sob o número 1. Supostos "atos de sabotagem" levavam o número 7. Para "problemas familiares", usava-se o 17. Questões sexuais eram fichadas como B-03.

Nos anos 90, vigilância sobre petistas ou filiados à CUT

Nos anos 90, o alvo passou a ser cada filiado ou simpatizante do PT e da Central Única dos Trabalhadores (CUT). "Está passando da hora de ficarmos livres desse pessoal", anotavam gerentes nas fichas dos "funcionários petistas".

A chegada do PT ao poder mudou a relação da Usiminas com os petistas. Com a ajuda de Valério, Soares e sua equipe de executivos conseguiram se aproximar da cúpula do partido. Levaram o candidato Luiz Inácio Lula da Silva a visitas ao Vale do Aço. E fizeram contribuições financeiras a campanhas dos novos aliados.

Legenda da foto: SOARES: NA DITADURA, "paz social" com vigilância de empregados