Título: Dirceu: liminar do STF impede novo processo
Autor: Isabel Braga e Adriano Ceolin
Fonte: O Globo, 16/09/2005, O País, p. 8

Suprema Pizza Federal¿, ironiza relator do pedido de cassação do deputado por quebra de decoro parlamentar

BRASÍLIA. O Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu ontem liminar que impede o Conselho de Ética da Câmara de abrir novo processo por quebra de decoro contra o deputado José Dirceu (PT-SP). Animado com a decisão, ele deverá entrar com nova ação no tribunal semana que vem. Ignorando as críticas e acreditando em nova vitória no STF, Dirceu apresentará outro mandado de segurança para sustar a investigação que já sofre no conselho, no processo movido contra ele pelo ex-deputado Roberto Jefferson.

¿ Vou bater às portas do Supremo semana que vem com um mandado de segurança, solicitando que suste o processo no Conselho porque eu era ministro e não deputado. O próprio Roberto Jefferson disse que era improvável que o PTB conseguisse me processar porque eu não era deputado na época das denúncias ¿ disse Dirceu, ao deixar ontem a Câmara.

A liminar concedida ontem pelo ministro Carlos Velloso não tem poder de sustar o processo já em curso no Conselho de Ética. Sobre as liminares concedidas anteontem pelo presidente do Supremo, Nelson Jobim, Velloso, sorteado para relatar o caso, pediu informações à Câmara num prazo de dez dias. Após receber os dados, o ministro examinará se mantém ou não as liminares.

O deputado Julio Delgado (PSB-MG), relator do processo contra Dirceu no Conselho de Ética, chamou de ¿suprema pizza¿ a decisão do STF. Delgado disse, porém, que a decisão não vai atrapalhar o processo já aberto no conselho:

¿ É uma interferência do Poder Judiciário no Legislativo. Uma Suprema Pizza Federal. Mas, do ponto de vista prático, é inócuo para o caso José Dirceu. Vamos manter as oitivas marcadas para a semana que vem. Os beneficiados só serão os deputados que ainda não tiveram processos abertos no conselho.

Dirceu aproveitou para desqualificar os críticos da decisão do STF. Ele lembrou o fato de a oposição ter recorrido ao Supremo para que a CPI dos Bingos fosse instalada, mesmo depois de ter sido engavetada pelo então presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), por falta de acordo entre os líderes dos partidos na Casa.

¿ Quando o Supremo mandou instalar a CPI dos Bingos, toda a sociedade aplaudiu. Não pode haver dois pesos e duas medidas. Não pode aplaudir o STF quando interessa a alguns e desaprovar quando não interessa. O que vale é a lei, o regimento das Casas e Constituição ¿ argumentou o deputado.

O advogado de Dirceu, José Luiz de Oliveira Lima, disse que recorrerá ao Supremo porque, no processo, o conselho inverteu a ordem dos depoimentos, ouvindo primeiro as testemunhas de defesa e por último as de acusação.

¿ Há violação ao princípio da defesa. Primeiro deveriam ter sido ouvidas as testemunhas da acusação. Apresentei uma questão de ordem ao conselho e vou recorrer ao Supremo no momento adequado ¿ disse.

Segundo Oliveira Lima, se o Supremo acolher seu recurso, o processo contra Dirceu no conselho volta à estaca zero, e novos depoimentos deverão ser tomados. Ele afirmou também que decidiu recorrer ao STF no caso da lista da CPI porque será mais uma chance para que Dirceu se explique e seja ouvido.

¿ Ele pode ser ouvido e fazer mais uma vez sua defesa. Todas as medidas judiciais que visam a dar direito de defesa serão tomadas. O STF adotou uma linha que coibirá qualquer cerceamento de defesa ¿ acrescentou o advogado.

Anteontem à noite, quatro deputados do PP ¿ Vadão Gomes, José Janene, Pedro Corrêa e Pedro Henry ¿ e José Borba, do PMDB, também entraram com pedido de liminar. Sorteado relator do caso, o ministro Carlos Ayres Britto pediu informações à Mesa da Câmara antes de tomar qualquer decisão. A ministra Ellen Gracie, relatora de um pedido de liminar do deputado do PL Wanderval Santos, não tomou decisão ontem.

O ex-presidente do PT José Genoino depôs no Conselho de Ética como testemunha de defesa de Dirceu e negou que houvesse interferência do ex-ministro nas decisões do partido. Genoino disse que exerceu de fato e de direito a presidência do partido depois que Dirceu assumiu a Casa Civil. Voltou a negar a existência do mensalão ou de negociações financeiras com partidos e parlamentares.

¿ Ele não tinha interferência no dia-a-dia do partido. Nossa relação política era intensa, mas em torno da agenda do governo ¿ disse Genoino ao Conselho, que analisa pedido de cassação do mandato de Dirceu por quebra de decoro parlamentar.