Título: De algoz a suposto protetor
Autor: Isabel Braga
Fonte: O Globo, 20/09/2005, O País, p. 3

Jefferson tenta retirar processo contra Dirceu mas Conselho de Ética resiste

Para evitar o desgaste de um suposto acordão para salvar da cassação os deputados José Dirceu (PT-SP) e Sandro Mabel (PL-GO), o presidente do Conselho de Ética da Câmara, Ricardo Izar (PTB-SP), providenciou ontem parecer jurídico da assessoria da Casa contrário à retirada das representações, anunciada pelo ex-deputado Roberto Jefferson, do PTB. Izar pretende pôr o parecer em votação hoje, para deixar clara a posição contrária do Conselho à suspensão dos processos, antes que o pedido seja formalizado pelo PTB.

Informado de que, a pedido de Jefferson, o PTB iria retirar as representações, Izar solicitou o parecer. Segundo a assessoria, uma vez aberto, o processo deixa de depender da vontade do representante, pois, numa analogia com ações penais, o esclarecimento de atos contrários aos princípios éticos é de interesse público:

¿ Esse tipo de atitude é ruim para o Conselho. Se cada um pensar em retirar o processo, vira baderna. Estamos preocupados em dar resposta à sociedade e a idéia de retirar dá impressão de que está havendo um acordão, o que não vamos aceitar.

A decisão do conselho não é definitiva. O PTB pode recorrer à Mesa e até ao STF. Nunca ocorreu antes um pedido de retirada de processo em andamento. A assessoria da Mesa informou que caberá à Presidência da Câmara decidir sobre a pertinência do pedido. Anteontem, em entrevista ao ¿Canal livre¿, da Bandeirantes, Jefferson explicou a decisão:

¿ Quando fui cassado, vi o PSDB, do Alberto Goldman, e o Rodrigo Maia, do PFL, trabalhando pela minha cassação. O PSDB livra o Eduardo Azeredo e o PFL livra o Roberto Brant. As cabeças premiadas são a minha e a do José Dirceu. Eles entendem que com duas cabeças premiadas o Brasil vai ficar satisfeito. Cassado o Jefferson, agora vamos cassar o José Dirceu na representação que eu fiz. Por que vou ser massa de manobra desse acordo? Eu não. Não gosto do José Dirceu, nem o aprovo. Mas não serei massa de manobra nesse acordão. Vou retirar a representação.

Polêmica no suposto voto nulo de Dirceu

O presidente do PTB, Flávio Martinez, estará hoje em Brasília e aguarda que a área jurídica do partido apronte os documentos para formalizar a retirada dos processos. Segundo ele, a retirada foi um pedido de Jefferson.

¿ Ele disse que se sente usado. O Roberto foi cassado, não teve pizza. Acha que os que votaram por sua cassação devem assumir o ônus de cassar os outros. Ele já perdeu tudo, não tínhamos como não atender.

O relator do processo contra Dirceu, Júlio Delgado (PSB-MG), pôs em dúvida o suposto voto nulo de Dirceu na cassação de Jefferson. A suspeita de que Dirceu teria anulado o voto surgiu na contagem, quando José Thomas Nonô (PFL-AL) avisou: ¿Vou considerar nulo este voto porque está sem o envelope¿. Dirceu foi fotografado depositando na urna a cédula sem o envelope pardo.

¿ Essa pode ter sido a senha para um eventual acordão, no qual não quero acreditar. Quero estancar a hemorragia no Legislativo e não vou oferecer ingredientes para essa pizza que está se formando ¿ reagiu Delgado, que é da base governista.

Dirceu, pela assessoria, disse que só vai se pronunciar sobre a retirada da ação depois que ela for formalizada e não respondeu ao relator. A amigos, contou que ligou para Izar e perguntou se o pedido de retirada fora protocolado. Izar disse que não, mas avisou-o do parecer. Dirceu desligou.

¿ Já foi formado o paredão e o pelotão de fuzilamento tem o presidente do conselho (Izar) e o relator (Delgado) na frente. O processo é mera formalidade ¿ disse Dirceu a amigos depois que conversou com Izar.

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