Título: SEVERINO TENTA SER RECEBIDO POR LULA E FAZ AMEAÇAS
Autor: Letícia Lins
Fonte: O Globo, 17/09/2005, O País, p. 5

'O governo deve ficar de orelha em pé. Ele vai para o cadafalso mas pode levar mais gente', diz aliado

BRASÍLIA. Sem o apoio explícito do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a quem pediu ontem um encontro e de quem só obteve uma protocolar resposta, o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), mudou o discurso e mandou recado que deverá deixar o Planalto em alerta: estuda a possibilidade de pedir uma licença médica, o que provocaria seu afastamento temporário, deixando o comando da Câmara nas mãos do pefelista José Thomaz Nonô (AL). A possibilidade de afastamento temporário, descartada inicialmente, foi anunciada pelo quarto-secretário da Mesa, João Caldas (PL-AL), após encontro com Severino na residência oficial:

- Severino dá sinais de que vai tirar licença e salve-se quem puder. Vai para o cadafalso, mas pode levar mais gente. Eu disse que falaria isso à imprensa e ele disse: pode falar. É uma alternativa que jamais tinha cogitado. O risco que corre o pau, corre o machado. O governo deve ficar de orelha em pé porque, se isso se concretizar, a Câmara vai para a oposição e há muita coisa engavetada - disse, numa referência aos pedidos de impeachment de Lula sempre arquivados por Severino.

O deputado pediu ao ministro das Relações Institucionais, Jaques Wagner, um encontro com Lula, que estava em Maceió. A resposta chegou pelo presidente da Infraero, Carlos Wilson, que viajou com Lula.

- O presidente Severino está pedindo para ser recebido e não tenho como não recebê-lo como presidente da Câmara. Mas não vou me meter. O que ele vai fazer é um ato dele - disse Lula ao emissário.

- O presidente Lula não vai interferir no processo. O que fazer é uma decisão pessoal do presidente Severino e não depende de qualquer conversa com o presidente. Disse isso a Severino - disse Wilson.

Encontro com Lula seria a partir de segunda-feira

O encontro só deverá ocorrer a partir de segunda-feira, quando o presidente voltar de São Paulo. Severino ponderou que seus advogados disseram que ele pode tomar uma decisão até quarta-feira. E repetiu que está sendo aconselhado a deixar a presidência, sem renunciar ao mandato.

Segundo interlocutores, Severino quer acertar com Lula, além de uma posição pelo menos isenta do Planalto, a manutenção de seus apadrinhados no governo, como o ministro das Cidades, Márcio Fortes. Severino demonstrou irritação com as negociações sobre seu sucessor, mesmo antes da renúncia.

João Caldas, que viajou de Maceió a Brasília no avião presidencial, disse que Lula deixou claro que deseja que o encontro seja formal. Lula teria sugerido, inclusive, que o encontro incluísse o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).

A alternativa não satisfez Severino, porque para ele Renan está articulando com o ex-presidente José Sarney (PMDB-AP) o nome de quem irá sucedê-lo na Câmara. As declarações de aliados têm irritado Severino, segundo Caldas:

- A crise está acontecendo e em vez de resolver com prudência, muitos vão para a imprensa achincalhar, botar fogo.

Ele disse acreditar que Severino irá tomar sua decisão até segunda-feira:

- Se ele optar pela licença, o primeiro-vice ( Thomaz Nonô) assume interinamente a presidência e a representação contra Severino corre normalmente - acrescentou Caldas.

Depois de quatro dias trancados em casa, Severino saiu ontem para uma consulta ao oftalmologista. Voltou logo e passou o dia em conversas com aliados e em contatos com correligionários de Pernambuco.