Título: UMA TROCA JUSTA: ARMAS POR PAZ
Autor: Márcio Thomaz Bastos
Fonte: O Globo, 17/09/2005, Opinião, p. 7

Os brasileiros tiveram, nas últimas semanas, dois bons motivos para comemorar a preservação da vida. Duas pesquisas, do Ministério da Saúde e da Unesco, mostraram uma redução considerável no número de vítimas de armas de fogo no país. Mais ainda, os estudos comprovaram que a queda nos índices de homicídios ocorreu por causa da Campanha do Desarmamento, um dos melhores exemplos de política pública, cujo sucesso é creditado principalmente à sociedade.

Os dados da Unesco, por exemplo, revelaram uma redução de 12,5% nos óbitos por armas de fogo desde a implantação do Estatuto do Desarmamento, no primeiro semestre de 2004. Com o início da campanha, no segundo semestre do ano passado, o impacto foi maior, diminuindo os homicídios em 18,4%. Com isso, 5.563 mortes foram evitadas em um ano. Mortes que poderiam acontecer de forma banal, como aquelas que ocorrem no calor de uma discussão dentro do lar que poderia acabar em reconciliação entre o casal, mas que termina com um tiro disparado de maneira impensada.

Levando-se em conta que muitos crimes de morte atingem a população na faixa etária dos 17 aos 29 anos, é importante ressaltar que o desarmamento contribuiu principalmente para a preservação de vidas que representam o futuro do Brasil. Ajudou a evitar assassinatos inúteis, como do menino que discute com um colega, pega a arma do pai e mata seu desafeto.

Quando lançamos a Campanha do Desarmamento definimos que ela teria dois sentidos. O primeiro foi receber as armas do cidadão. O segundo propósito foi o de promover entre os brasileiros de bem a cultura da paz. E a sociedade entendeu nossa mensagem ao procurar maciçamente os postos de recolhimento de armas. Tanto é que pretendíamos recolher 80 mil armas de junho a dezembro de 2004, número superado num curto espaço de tempo. Hoje já temos 451.542 armas arrecadadas.

As pesquisas e o volume arrecadado de armas pela Polícia Federal e o Comando do Exército também confirmaram que os brasileiros querem contribuir para o fim da violência. Alguns estados tiveram, desde a entrada em vigor do Estatuto do Desarmamento, quedas de até 20% nas mortes por arma de fogo.

Para que tudo isso acontecesse, o governo federal se mobilizou. Fizemos uma caravana por todo o Brasil incentivando a criação de comitês regionais pelo desarmamento chamando a população, as entidades civis organizadas, as igrejas, os meios de comunicação, as polícias estaduais e municipais que também se mobilizaram para tirar de circulação o máximo de armas possível. Além disso, a campanha se tornou hoje uma bandeira suprapartidária, sem ideologias, sem credo, mas com a marca da cidadania.

Ao mesmo tempo em que o governo está desarmando o cidadão de bem, também está tirando armas de bandidos. Operações da Polícia Federal, realizadas de forma organizada e utilizando a inteligência, mostram resultados positivos em estados como São Paulo e Rio de Janeiro, onde foram apreendidas centenas de armas pesadas.

A meta do governo é arrecadar 500 mil armas até o final da campanha, no dia 23 de outubro, mesmo dia em que os brasileiros também decidirão por referendo se querem ou não a manutenção do comércio de armas no país. Mas o principal objetivo da campanha já foi atingido: a sociedade criou a cultura da paz abraçando esta grande mobilização pela vida.

MÁRCIO THOMAZ BASTOS é ministro da Justiça.

O governo quer arrecadar 500 mil armas até o final da campanha, no dia 23 de outubro