Título: A SOLIDÃO NA CRISE
Autor: Eugenio Sales
Fonte: O Globo, 17/09/2005, Opinião, p. 7

A XX Jornada Mundial da Juventude, pela sua importância para a vida da Igreja, espera que suas lições e riqueza espiritual possam ser também devidamente aproveitadas pelos que compareceram ou assistiram, pelos meios de comunicação social, ao evento ocorrido em Colônia, Alemanha. Trata-se de uma fonte de salutares reflexões, útil a católicos e não-católicos, de modo particular aos que escutam vozes, segundo as quais a Igreja Católica está decadente ou necessita de reformas em sua estrutura. Atualmente o que importa é a necessidade de retorno aos valores eternos.

O Santo Padre Bento XVI se referiu, nessa oportunidade, a linhas de conduta a serem observadas pelos católicos e também por todas as pessoas de boa vontade, tanto na Alemanha como pelo mundo afora. O Pontífice, de 78 anos, mostrou aos críticos a verdadeira visão da Igreja que dirige em nome de Deus: "Este Papa, que rejeita tudo o que os jovens gostam de fazer, é plenamente aceito por eles", escreveu o Jornal de Hannover, "Neue Presse".

No seu discurso na Sinagoga de Colônia, assim se expressou: "Após a eleição como sucessor do apóstolo Pedro, desejava ardentemente, por ocasião de minha visita à Alemanha, encontrar-me com a comunidade hebraica e os representantes do judaísmo alemão." Segundo o porta-voz do Papa, Dr. Navarro Valls,"foi o Papa, em pessoa, quem decidiu integrar na programação a visita à Sinagoga."

No dia 18 de agosto, no aeroporto Ciampino, em Roma, antes de seguir para Colônia, confessou: "Estou profundamente comovido por este encontro com os jovens. Um encontro extraordinário entre os jovens de todas as culturas, unidos na busca da verdade, unidos sob o sinal de Jesus Cristo."

No sábado, 20 de agosto, Bento XVI, presidindo a Vigília, falou para cerca de 800.000 jovens, vindos de 193 países: "A verdadeira revolução capaz de transformar o mundo é a que provém de Deus." E acrescentou: "Não são as ideologias que salvam o mundo."

Estavam acreditados, no evento, 7.000 jornalistas. Os títulos dos comentários e notícias principalmente da imprensa nos transmitem uma realidade que impressiona.

Um periódico ressaltou: "Em uma época em que os políticos orientam seus princípios básicos pela pesquisa de opinião de cada semana, cresce o carisma de um Papa. (...) Retoma seu lugar na tradição de uma Igreja de dois mil anos." O Santo Padre e seus ensinamentos, simbolizados na Cátedra de Pedro que ele ocupa como sucessor, tornam-se atrativos.

Na missa de encerramento, Bento XVI fez um "apelo aos jovens para que evitem a religião na qual cada um escolhe o que quer e ignora o resto". Muitos haviam passado a noite fria em barracas e sacos de dormir cantando e rezando num clima festivo antes da chegada do Papa para a missa do encerramento... A multidão era composta, em sua maioria, por adolescentes e jovens.

No sermão, lido em cinco idiomas, o Papa pediu aos jovens que não vejam "a religião como um 'produto de consumo', de onde as pessoas escolhem o que querem e não seguem regras que são às vezes difíceis de cumprir. (...) Isso pode ser confortável, mas em momentos de crise somos deixados sozinhos".

"A liberdade não é simplesmente desfrutar a vida com autonomia total, mas sim viver pela medida da bondade e da verdade para que possamos nos tornar verdadeiros irmãos", afirmou Bento XVI.

A 21 de agosto o Santo Padre falou aos bispos da Alemanha. Abordou a problemática que devem enfrentar os pastores de sua pátria. Deu diretrizes que fazem meditar os bispos de todo o mundo. Eis um trecho: "Este é o panorama que nos apresenta a Jornada Mundial da Juventude: convida-nos a projetar nossa visão para o futuro. Os jovens são para a Igreja, e especialmente para os pastores, os pais e os educadores, um chamado vivo à fé e à esperança. Meu venerado Predecessor, ao eleger o tema desta XX Jornada, 'Viemos para adorá-lo' (Mt 2,2), confirmou implicitamente este chamado. Traçou uma orientação clara para o caminho dos jovens: estimulou-os a buscar a Cristo, tendo como modelo os Magos; convidou-os a seguir a estrela, reflexo de Cristo no firmamento da existência pessoal e social; educou-os com seu exemplo doce e enérgico a pôr-se de joelhos ante o Deus feito homem, ante o Filho da Virgem Maria, reconhecendo n'Ele o Redentor do homem. Este mesmo modelo que indicou aos jovens João Paulo II o propôs também aos Pastores, para orientar seu serviço às novas gerações e a toda família eclesial."

Agradeçamos a Deus que nos deu Bento XVI após João Paulo II, o grande.

D. EUGENIO SALES é cardeal-arcebispo emérito da Arquidiocese do Rio.

Nos momentosde crisesomos deixadossozinhos