Título: VIOLÊNCIA DO TALIBÃ AMEAÇA ELEIÇÃO NO AFEGANISTÃO
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Fonte: O Globo, 17/09/2005, O Mundo, p. 36 e 37

Milícia extremista tirada do poder em 2001 já matou mil pessoas este ano, entre elas sete candidatos a deputado

CABUL. A apenas dois dias das eleições parlamentares do Afeganistão, a milícia Talibã matou mais um candidato, o sétimo nas últimas semanas. O movimento que liderava o regime deposto no fim de 2001 ameaçou de morte os eleitores que se dirigirem às urnas amanhã.

Especialistas em segurança afirmam que o Talibã demonstra ter recuperado parte de sua organização no país. Uma prova disso seria o número de ataques violentos. Apenas este ano mais de mil pessoas já foram assassinadas, tornando este o período mais sangrento desde a guerra que depôs o regime comandado pelo mulá Muhammad Omar. Destas vítimas, 49 eram soldados americanos.

Abdul Hadi, que disputava uma vaga de deputado pela província de Helmand, no sul do Afeganistão, foi morto em casa.

- Um atirador o chamou em sua casa e quando ele atendeu a porta abriram fogo e o mataram - disse Mohammad Alizai, porta-voz do governo de Helmand.

O Talibã assumiu o ataque, dizendo que Hadi era um colaborador das forças de ocupação.

- Ele apoiava os americanos e era um canditado à Wolesi Jirga - disse Abdul Hakimi, porta-voz do Talibã, referindo-se à maneira como é chamada a câmara baixa do Parlamento afegão, que literalmente quer dizer Casa do Povo.

Lei reserva 68 cadeiras para mulhares na câmara baixa

Tentando minimizar a ameaça feita por outros integrantes de seu movimento, Hakimi disse que os eleitores afegãos não deveriam votar para não correr riscos. Segundo ele, os alvos seriam as forças de ocupação.

No momento há cerca de cem mil soldados no Afeganistão. Há uma força de 22 mil militares liderada pelos Estados Unidos e outra de dez mil comandada pela pela Otan.

Apesar das ameaças, o presidente Hamid Karzai reafirmou ontem, em entrevista ao jornal francês "Le Monde", que continuará com a política de permitir que pessoas que integraram o Talibã voltem para o país.

- Perdoa-se os que cometeram erros quandao querem viver aqui pacificamente e trabalhar por este país. Deve-se expurgar o passado. O que é vital para este país: a justiça ou a paz? - perguntou Karzai, que respondeu. - Há luxos que não podemos nos permitir. Elegemos, então, a paz, prevendo nos orientar pela justiça quando for possível.

Nas eleições de domingo, 5.800 candidatos concorrerão às 249 cadeiras da câmara baixa (68 delas reservadas para mulheres). Da população estimada entre 25 milhões e 28 milhões, há 12,4 milhões de eleitores registrados.

Ao contrário do que ocorre na imensa maioria dos países, não há partidos nas eleições afegães. Os candidatos concorrem dentro de suas províncias e os que tiveram mais votos são eleitos. O método gerou críticas de especialistas, que dizem que individualizar as eleições não ajudará na construção de uma democracia no país. O presidente Karzai, eleito ano passado, também não tem partido.

O número de vagas depende da população de cada província - a província de Cabul tem 33 vagas, contra duas de Nimroz, por exemplo. Além de votarem para a câmara baixa nacional, os eleitores elegerão também assembléias locais, cujas funções ainda não são muito claras.

As assembléias serão responsáveis por apontar um terço dos membros da câmara alta do Parlamento nacional. Os outros dois terços serão divididos entre indicações do presidente e das câmaras de vereadores. Como estas últimas ainda não existem, o Senado afegão começará a funcionar desfalcado.

Legenda da foto: FUNCIONÁRIOS DO GOVERNO levam caixas com cédulas para uma sessão eleitoral, em Haft Galleh