Título: Verdade, verdade, verdade
Autor: Jaílton de Carvalho/Carolina Brígido
Fonte: O Globo, 21/09/2005, O País, p. 3

Relatório do Coaf mostra que dinheiro foi para a conta de Severino, que renuncia hoje

Relatório reservado do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) informa que o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), foi mesmo o beneficiário do cheque de R$7.500 emitido pelo empresário Sebastião Augusto Buani. Segundo o relatório, Gabriela Kênia Martins, secretária de Severino, descontou o cheque numa agência do Bradesco em Brasília e imediatamente fez uma transferência on-line para uma conta de Severino, contou uma das autoridades que tiveram acesso ao documento. Buani sustenta que o cheque corresponde a parte da mesada que pagou a Severino entre 2002 e 2003 para garantir a renovação do contrato do restaurante Fiorella com a Câmara dos Deputados. Severino sempre negou, tendo repetido em mais de uma entrevista: "Mentira, mentira, mentira!".

Pelo relatório, que estarreceu o procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, a secretária sacou o cheque de R$7.500 no dia 30 de julho de 2002 e, em seguida, repassou R$6.810 para o chefe. No verso, o cheque traz a anotação "- 690,00". Na tentativa de rebater as denúncias de Buani, a secretária apresentou duas versões à PF. Antes do aparecimento do cheque, Gabriela disse que desconhecia qualquer favor de Buani a Severino. Depois do surgimento do cheque, a secretária disse que o dinheiro era uma contribuição para a campanha de Severino Cavalcanti Júnior, filho do presidente da Câmara. Severino Júnior, candidato a deputado estadual por Pernambuco em 2002, morreu num acidente de carro durante a campanha.

Dinheiro não foi declarado ao TSE

A suposta contribuição não aparece na prestação de contas de Severino Júnior no Tribunal Superior Eleitoral. Com base em laudo do Instituto Nacional de Criminalística, a PF confirmou ontem também que a assinatura do documento que garantiria a Buani a renovação da concessão do restaurante Fiorella tem características similares à do presidente da Câmara. Mas, ainda assim, a polícia não pode atestar se a assinatura é mesmo de Severino.

Segundo os peritos, a análise da cópia do documento original mostra evidências, mas não permite conclusão definitiva sobre o autor da assinatura.

O resultado não compromete o andamento das investigações. Para a polícia, o mais importante é saber se Severino, de fato, recebeu favores do empresário. Em depoimento à PF, Buani disse que Severino assinou o documento na sua presença, depois de longa negociação. O empresário sustenta que pagou R$40 mil de entrada e mesadas de R$10 mil para a Severino entre 2002 e 2003 para renovar o contrato do restaurante. Na semana passada, Buani entregou à Polícia Federal a cópia do cheque de R$7.500.

O procurador-geral da República deverá pedir hoje a instauração no Supremo Tribunal Federal (STF) do inquérito que investiga se o presidente da Câmara recebeu propina de Buani. Antônio Fernando também vai solicitar ao tribunal novas diligências sobre o caso. Ele quer ainda ter acesso ao suposto contrato de gaveta que teria estendido a concessão de Buani e ao laudo pericial desse documento, divulgado ontem pela Polícia Federal.

Na segunda-feira, Antônio Fernando afirmou ter provais cabais contra Severino. Ainda assim, não quis apresentar ao STF pedido de abertura de processo penal contra o deputado. Preferiu intensificar as investigações sobre o caso antes de denunciá-lo. Antônio Fernando acenou com a possibilidade de não pedir quebra de sigilo bancário e telefônico de Severino, diferentemente do que sugeriu a Polícia Federal.

COLABOROU Carolina Brígido

Legenda da foto: SEVERINO ACENA da porta da residência oficial: transferência on-line feita pela secretária após sacar cheque de R$7,5 mil