Título: EX-'BISPO' É ACUSADO DE TOMAR DINHEIRO NA ALERJ
Autor: Alan Gripp
Fonte: O Globo, 22/09/2005, O País, p. 14

Carlos Rodrigues nega as acusações feitas por um assessor parlamentar, que o acusou também de corrupção na Loterj

BRASÍLIA. Uma semana depois de renunciar ao mandato para escapar da cassação, o agora ex-deputado Carlos Rodrigues, ex-bispo da Igreja Universal e suspeito de ser um dos operadores do mensalão, retornou ao Congresso para se defender de novas acusações. Em depoimento ontem na CPI dos Bingos, o assessor parlamentar da Assembléia Legislativa do Rio Jorge Luiz Dias acusou Rodrigues de comandar um esquema de desvio da verba de publicidade da Loterj nos meses que antecederam as eleições de 2002, durante a gestão de Waldomiro Diniz.

Jorge Luiz contou ter recebido pelo menos R$200 mil da agência JOB Niterói por outdoors - que nunca foram instalados - com publicidade institucional da Loterj e de produtos como a raspadinha. Ele descontou cheques na boca do caixa usando a própria mulher e o filho como laranjas, e teria repassado o dinheiro a Carlos Rodrigues, através do então tesoureiro do PL, pastor João Domingos. Jorge Luiz entregou aos senadores cópias de dois cheques para comprovar as operações.

- A campanha não era produzida, só era emitida a nota - disse. - Na primeira vez, recebi um cheque de valor alto, pedi para diminuir para quatro ou cinco cheques para não ter problemas com a Receita e repassei ao João Domingos.

Jorge Luiz diz ter recebido mais quatro ou cinco cheques, a mando do ex-deputado estadual e federal Valdeci de Paiva, morto em 2003, para quem trabalhava. A CPI decidiu quebrar o sigilo bancário da JOB Niterói.

O assessor parlamentar também acusou Rodrigues, ex-bispo, de comandar a cobrança de uma mesada de R$10 mil a R$15 mil de todos os deputados federais e estaduais do país ligados à Igreja Universal do Reino de Deus - o chamado dízimo do Legislativo. O dinheiro, segundo ele, era descontado dos salários dos funcionários dos gabinetes e dos próprios deputados. Quem se recusasse a contribuir, perdia o direito de se candidatar em nome da Universal:

- Eu mesmo devolvi. Ocupava um cargo com salário de R$4.500 mas só ficava com R$1.500. Todo mundo tinha que contribuir - disse ele, que entregou à CPI cartões de banco de funcionários que ficavam em poder de Valdeci, encarregado de recolher o dízimo.

Universal arrecadaria em média R$637 mil

A Igreja Universal tinha na última legislatura 22 deputados federais e 29 estaduais, o que resultaria numa arrecadação média de R$637 mil.

Jorge Luiz afirmou que o cargo de presidente da Loterj pertencia a Rodrigues, mas que Waldomiro foi nomeado num acordo dele com o ex-governador Anthony Garotinho. Segundo o assessor, Rodrigues tinha outros cargos no governo, como a direção de hospitais e as presidências do Iaserj e do Detro. O ex-deputado, segundo ele, planejava cobrar pedágio de até R$300 mil para as pessoas indicadas.

Ele também levantou suspeitas sobre a participação de Rodrigues no assassinato de Valdeci, mas admitiu que não tem provas. Rodrigues, que depôs em seguida, negou todas as acusações. Sobre a publicidade da Loterj, disse que não tinha como interferir.

- No governo Garotinho toda a propaganda foi centralizada pelo senhor Peninha (então secretário de Comunicação) - alegou Rodrigues.

Quanto às acusações de que extorquia dinheiro de deputados e funcionários, ironizou:

- Roberto Jefferson diz que eu distribuo dinheiro. Agora, eu arrecado. Meus acusadores têm que entrar num acordo.

Dinheiro de Valério foi para a campanha de Lula, diz

Ex-deputado diz que R$250 mil recebidos do empresário foram negociados por Valdemar

BRASÍLIA. Acusado de ser um dos operadores do mensalão, o ex-deputado Carlos Rodrigues, que renunciou ao mandato para escapar da cassação, disse ontem que os R$250 mil que recebeu do empresário Marcos Valério Fernandes de Souza foram usados para saldar dívidas da campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Rio, no segundo turno das eleições de 2002. Segundo ele, as negociações com o publicitário foram feitas pelo presidente do PL, Valdemar Costa Neto.

- Quando o partido decidiu fazer a campanha do Lula no Rio eu disse a ele (Valdemar): "Nós ficamos sem dinheiro, como vamos fazer uma campanha em 92 municípios do Rio". E ele respondeu: "Se vira e faça, depois a gente resolve" - contou o ex-deputado.

"Naquela época o PT era dono da moral e da ética"

Segundo ele, o apoio à campanha presidencial de Lula no Rio foi definido numa reunião na sede do PT, em São Paulo, da qual participaram, além dele, Valdemar Costa Neto, José Dirceu, então presidente do PT, e José Genoino, então deputado federal e candidato derrotado ao governo de São Paulo. Rodrigues, no entanto, disse que na ocasião eles não trataram de dinheiro.

A versão foi posta em dúvida pelos senadores porque o dinheiro de Marcos Valério foi entregue a ele apenas um ano e dois meses depois das eleições. Rodrigues sustentou que, durante todo este período, o partido deu calote nos fornecedores do material de campanha. Reconheceu que errou e que pagou por isso com o mandato:

- Sei que errei mas não me arrependo. Naquela época o PT era dono da moral e da ética. Quem iria saber? - disse o ex-deputado que chorou cinco vezes durante o depoimento.

Rodrigues diz que não recebeu R$400 mil

O ex-deputado questiona a versão apresentada por Valério, que diz ter repassado R$400 mil a ele. Rodrigues disse ainda que decidiu renunciar porque sabia que não tinha chance de escapar da cassação.

- Para um julgamento político, tomei uma atitude política. Eu não nasci deputado, não tenho apego ao cargo. Todos serão cassados - disse o ex-deputado. (Alan Gripp)

Legenda da foto: CARLOS RODRIGUES depõe na CPI dos Bingos: ironia nas respostas