Título: IMPASSE
Autor:
Fonte: O Globo, 25/09/2005, Opinião, p. 6

Isto, pelo menos, ficou claro: os eleitores alemães estão cientes de que precisam reformar seu sistema de bem-estar social, invejado por muitos mas cada dia mais insustentável na economia globalizada, pelo menos nas condições atuais da Alemanha, de estagnação econômica e alto nível de desemprego.

Entretanto, entre seguir a nova direção indicada pelo governo de centro-esquerda de Gerard Schroeder, que já conhecem, e provar a receita da candidata de centro-direita Angela Merkel, não testada, preferiram deixar para os políticos a tarefa de decidir. Agora o país, cuja economia parou de crescer, está paralisado também politicamente.

O resultado das eleições gerais alemãs foi tão indistinto que Schroeder e Merkel se proclamam vitoriosos. Na realidade, ao negarem ao chanceler uma vitória indiscutível, os eleitores rejeitaram o passado recente, em que foram governados pelo Partido Social-Democrata (SPD), de Schroeder, em aliança com o Partido Verde, de Joschka Fischer. E ao concederem pequena vantagem aos partidos de oposição que apóiam Merkel mostraram o seu ceticismo sobre o futuro que ela propõe.

A rigor, para superar suas dificuldades, a terceira maior economia do mundo necessita de reformas mais profundas do que as esboçadas por Schroeder. Há dentro e fora da Alemanha um consenso sobre o que precisa ser feito ¿ quase tudo ligado a cortes de impostos de um lado e de benefícios sociais do outro, e à liberalização das leis trabalhistas. Os maiores obstáculos são, é claro, políticos. Habituados às benesses de um Estado superprotetor, os alemães relutam em tomar medidas que afetem seu padrão de vida ¿ ainda que elas visem a garantir esse padrão no futuro.

Durante a guerra fria, a Alemanha Ocidental foi para os aliados a vitrine do capitalismo na Europa ¿ assim como a Itália foi a trincheira onde tudo era permitido para impedir o avanço do comunismo. Caído o Muro, os ocidentais assumiram seu destino ¿ e a obrigação de absorver a parte oriental, que ficara para trás na rota da prosperidade. A dificuldade de compor um governo para enfrentar o desafio mostra que a Alemanha pode precisar de outras reformas, além da do sistema de bem-estar social.