Título: MAIS BRAÇOS PARA O GOVERNO
Autor: Eliane Oliveria,Flavio Barbosa,Mariza Louven
Fonte: O Globo, 25/09/2005, Economia, p. 33

Na administração Lula surgiram 34 estatais. Total já foi de 93 e agora chega a 137

Adécada de 90 pode ser considerada sinônimo de privatização, liquidação de empresas estatais e extinção de órgãos e entidades do setor público. O Brasil chegou a ter 258 estatais, em 1988, e o mínimo de 93, no fim do primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso, em 1998. Mas o Estado-empresário voltou a engordar: em 33 meses de governo Lula, uma companhia foi extinta, outras quatro foram privatizadas e 34 estatais surgiram em áreas em que o governo é quase monopolista ou tem interesses em comandar políticas próprias.

As novas estatais foram criadas num ritmo médio de uma por mês, trazendo para 137 o total de empresas públicas do país. Um aumento de 26,9% comparado ao número deixado pelo presidente anterior, de 108 empresas em 2002.

A expansão ocorreu basicamente nas áreas de petróleo, gás e energia elétrica, onde há 66 estatais brasileiras. No setor elétrico ¿ dominado pelo Grupo Eletrobrás, com 16 companhias ¿ foi criada, dentro do novo marco regulatório, a Empresa de Pesquisa Energética, que visa ao planejamento estratégico do setor e à compra e venda de energia no mercado.

Já o grupo Petrobras ¿ que responde sozinho por 48 estatais ¿ expandiu seus negócios com 31 subsidiárias no período. Entre elas estão empresas na área petroquímica e de gás ¿ como as que gerenciam os gasodutos ¿ e companhias de exploração de petróleo compradas no exterior. A diversificação dos negócios e a internacionalização são marcas da holding desde a quebra do monopólio do setor, em 1998. Neste período, o crescimento dos ativos da Petrobras chegou a 306%, passando de R$36,167 bilhões em 1997 para R$147,035 bilhões no ano passado.

Banco criado já amarga prejuízo

Em 2004, o governo criou ainda o Banco Popular do Brasil, acusado de gastar em publicidade mais do que na concessão de empréstimos à população de baixa renda, sua finalidade dentro da politica de expansão dos financiamentos e do microcrédito. São R$50 milhões de prejuízo e vários questionamentos de parlamentares sobre a necessidade e a viabilidade de sua manutenção.

A Hemobrás foi criada no mesmo ano. Daqui a quatro, deverá garantir auto-suficiência ao Brasil na produção de hemoderivados, cujos gastos com importação somam, anualmente, US$120 milhões.

Completam o grande grupo de estatais, com 25 empresas, os bancos federais e federalizados, e suas estruturas, como as distribuidoras de títulos e empresas de leasing, consórcio e investimentos. As 31 estatais restantes são armazéns ¿ como o Ceagesp ¿ e empresas de administração (como a Infraero), serviços (como a Radiobrás), pesquisa (Embrapa, CPMR) e desenvolvimento regional (como a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba). Também existem na lista várias estatais em liquidação (como a Geipot) ou à espera de serem liquidadas (como a Telebrás).

¿ O tempo do Estado produtor, do Estado provedor de tudo já passou e pouca gente defende isso. Para nós, o Estado deve ser a todo momento discutido em termos de tamanho e qualidade do serviço prestado à população ¿ afirma o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo.

Ele garante que o aumento do número de estatais não significa a expansão dos tentáculos do Estado sobre a economia brasileira. O ministro argumenta que, no caso da Petrobras, onde se concentra a maior parte das operações, trata-se do crescimento das atividades da empresa.

¿ As outras empresas são importantes tanto para o desenvolvimento econômico quanto para o social. O Estado não possui mais o dinamismo que tinha antes, mas ainda é importante ¿ defende.

O economista Carlos Mussi, da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), avalia que não há hoje no mundo uma estratégia estatizante.

¿ O Brasil está seguindo a mesma linha dos Estados Unidos. Há uma busca pelo Estado moderno, sem burocracia, mas presente em atividades estratégicas. Isso, para o investidor, significa uma maior previsibilidade ¿ diz Mussi.

Já Armando Castelar, economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), acredita que a grande mudança ocorrida no governo Lula é que praticamente terminou o ciclo de investimentos privados em uma série de setores, inclusive o de petróleo. Ele complementa dizendo que, na administração atual, a Petrobras exerce tranqüilamente o poder de monopólio e se mexe à vontade para expandir seus negócios dentro e fora do país:

¿ Isso também ocorre nas empresas da área de energia. Furnas, Chesf (Centrais Elétricas do São Francisco) e Eletronorte, que seriam divididas e privatizadas no governo anterior, também têm um poder excepcional no mercado brasileiro. É uma orientação.

Gasto também deve ser observado

Fábio Giambiagi também alerta para a importância de olhar o todo.

¿ Uma coisa é o número de estatais, outra é o gasto. O governo Fernando Henrique Cardoso reduziu o número de estatais, mas o gasto da administração direta aumentou muito ¿ polemiza Giambiagi.

Segundo Giambiagi, o ajuste nas contas públicas observado depois de 1998 se deu com base em um aumento de receitas, pois o gasto total, em termos reais, não foi afetado. O gasto público primário federal total cresceu em termos reais em todos os oito anos do governo anterior, a uma média de 6% ao ano, mais que o dobro da taxa de crescimento médio do PIB, de 2,4% ao ano no período. Além das privatizações, os anos 90 concentraram o maior número de empresas estatais liquidadas, órgãos e entidades extintos, num total de 59 processos concluídos no período.

GRUPO QUE RESISTIU À PRIVATIZAÇÃO TEM PETROBRAS, HOSPITAL E ARMAZÉM, na página 34