Título: PULSO FIRME E FEMININO NA DEFESA DE BUSH
Autor: José Meirelles Passos
Fonte: O Globo, 25/09/2005, O Mundo, p. 43

Escolhida para cuidar da imagem dos EUA no exterior, Karen Hughes é uma das favoritas do presidente

WASHINGTON. Um dia antes de sua posse, em janeiro de 2000, o presidente George W. Bush reuniu todo o pessoal que trabalharia com ele na Casa Branca, inclusive os ministros, e, apontando para uma mulher alta e robusta ali presente, disse a eles: ¿Não quero ver nenhuma decisão importante ser tomada aqui dentro sem que ela esteja na sala¿.

Era Karen Hughes, uma ex-repórter de televisão no Texas, que se tornara conselheira especial de Bush em 1994, quando ele se elegera governador daquele estado pela primeira vez e que, depois de cuidar da imagem do candidato durante a campanha presidencial, o acompanhara à Casa Branca.

Além de aconselhar o presidente, ela redigia declarações públicas e editava discursos que outros redatores escreviam para ele. Recentemente o presidente deu a ela uma nova e mais ampla missão: reparar a má imagem e reputação que tanto ele quanto os Estados Unidos têm hoje no resto do mundo, em especial no Oriente Médio.

¿ Será um trabalho difícil. Percepções não mudam rapidamente e nem facilmente. Essa é uma luta por idéias ¿ disse ela ao assumir o posto de subsecretária de Estado para Diplomacia Pública.

Karen, 48 anos, afirmou estar ¿ansiosa para ouvir e aprender mais¿. Disse que já aprendera a respeitar pessoas de países e culturas diferentes por ter vivido em França, Canadá e Panamá (seu pai era militar e teve postos nesses países), e que também aprendera ¿em primeira mão que as políticas dos EUA podem ser interpretadas de maneira diferente em lugares diferentes¿.

Shibley Telhami, professor de relações internacionais da Universidade de Maryland, tem dúvidas a respeito. Ele teme que a disposição de melhorar a imagem americana seja materializada através de uma atitude equivocada:

¿ A verdadeira questão é ver se Karen Hughes tem conhecimentos e habilidades suficientes para isso, se ela está suficientemente interessada em ouvir o público no exterior, e fazer com que o governo se interesse em ouvir o que essa gente pensa. É preciso que ela tome consciência de que essa é a parte realmente importante de seu trabalho, e não simplesmente dizer ao mundo que nós somos bons ¿ disse o especialista.

Edward Djerejian, da Universidade Rice, também acha que o êxito da tarefa vai depender muito do enfoque e da forma como ela será executada. Karen enfrentará situações espinhosas, delicadas:

¿ Os árabes, em geral, nos vêem como discriminatoriamente pró-Israel. Os iraquianos nos vêem como ocupantes e não libertadores. Em termos de administração política e econômica os árabes perguntam: ¿Onde estão os valores americanos de democracia quando os Estados Unidos apóiam regimes que não são democráticos?¿.

Estilo brusco gera dúvidas sobre tato diplomático

Tudo indica que o êxito da missão vai depender de como Karen Hughes vai encará-la. Ou, mais precisamente, se ela vai ¿ como de hábito ¿ seguir os seus próprios instintos, com total endosso de Bush, ou seguir o caminho traçado pela secretária de Estado, Condoleezza Rice, que exibiu conceitos discutíveis ao anunciar a tarefa de Karen. Ambas as opções parecem arriscadas.

Por um lado, Rice adotou um discurso parecido com os do Pentágono, dizendo que serão formadas ¿unidades de respostas rápidas¿, com orientação de agir agressivamente para defender a política externa americana, do ponto de vista de relações públicas. E em vez de se referir a percepções ¿ equivocadas, ou não ¿ que terão de ser contornadas, lapidadas, ela afirmou que tais equipes vão ¿enfrentar desinformação, más interpretações e todo o tipo de mentiras que dizem sobre o que estamos fazendo¿.

Por outro lado, o próprio estilo brusco de Karen Hughes levanta dúvidas a respeito de sua missão diplomática. Extremamente leal a Bush, do alto de seus bem fornidos 1,78 m (ela calça sapatos número 44), Karen usa tanto a sua figura imponente quanto o poder de uma sólida amizade com ele, para desempenhar também o papel de feroz guardiã do presidente, a quem ela definiu em seu recente livro de memórias como ¿maravilhoso, humilde, tenaz e decente¿.

Ao pressentir um tom agressivo de jornalistas em entrevistas coletivas, por exemplo, Karen os interrompe em meio de uma frase, intimidando-os tanto com um olhar fulminante quanto com comentários que, na maioria das vezes, os levam a refazer a pergunta em tom mais brando. Quando um repórter é mais ligeiro ou incisivo, ela toma a iniciativa de responder pelo presidente ¿ geralmente sob o olhar gratificado dele.

¿ Karen não tem medo de jogar pesado ¿ disse Michelle Cottle, que cobre a Casa Branca para a revista ¿New Republic¿.

Ela tampouco teme encarar o presidente, lembrou Tucker Carlson, da rede MSNBC:

¿ Bush confia nela e busca sempre os seus conselhos. Ela é uma das poucas pessoas capazes de interrompê-lo, contradizê-lo e de falar ao presidente como um adulto, de tratá-lo como um companheiro ¿ disse o jornalista.

`Alta Profeta¿ para Bush, `mandona¿ para a imprensa

Bush, que costuma colocar apelidos em todos que trabalham com ele, tem dois para ela. ¿Alta Profeta¿ é o que ele utiliza quando Karen acerta em cheio em seus conselhos, ao antecipar o que encontrará pelo caminho. ¿Furacão Karen¿ é o usado com mais frequência devido ao estilo brutamontes da conselheira que o protege com fidelidade canina. Os jornalistas também têm um apelido para ela: ¿Mandona¿.