Título: Pista para o valerioduto
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 23/09/2005, O Globo, p. 3

Em seu depoimento de ontem no Conselho de Ética da Câmara, a presidente do Banco Rural, Kátia Rabelo, deixou novamente várias pistas, tal como fizera ao falar à CPI dos Correios, sobre uma das hipóteses para a origem dos recursos que abasteceram o valerioduto. Nas duas ocasiões, entretanto, os parlamentares não se interessaram por esta linha alternativa de investigação.

Continuam perseguindo duas outras possibilidades, como a existência de contas do PT no exterior e a ocorrência de aplicações irregulares dos fundos de pensão no Banco Rural. Mas pelo menos o deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR), sub-relator de movimentações financeiras da CPI dos Correios, admitiu que passará a investigar também esta outra versão, muito corrente entre políticos e empresários de Minas.

Ontem Kátia afirmou que Marcos Valério era um "facilitador" de negócios para o banco no governo, valendo-se de suas boas ligações com o PT. Negou, entretanto, que o Rural tenha recebido qualquer benefício. Caberia aos deputados pelo menos perguntar o quê então ele facilitou ou tentou facilitar.

O que ela disse combina bem com a tal versão. Diz ela que Valério tinha um acordo com o Banco Rural para conseguir junto ao governo, com a ajuda de seus novos amigos petistas, o levantamento da intervenção do Banco Central no Banco Mercantil de Pernambuco, cujo espólio foi adquirido pelo Banco Rural (que era detentor de 20%). Ganharia por isso uma comissão de intermediação do negócio da ordem R$250 milhões, da qual destinaria uma parte ao PT. Ou seja, com uma só operação, lastreada no tráfico de influência, ficaria rico e resolveria os problemas do PT. O Banco Rural teria feito "adiantamentos" desta comissão dando-lhes a forma de empréstimos. Daí as garantias precárias e a tolerância com a inadimplência. O grosso do dinheiro viria depois mas o negócio não saiu. A Fazenda e o Banco Central nunca o autorizaram.

Uma tal operação, entretanto, jamais poderia ser bancada por Delúbio. Seria preciso a anuência do então ministro José Dirceu e a boa vontade de Palocci. Ontem Kátia afirmou que a diretoria do Rural teve encontros com Dirceu mediados por Valério e que ela e outro diretor tiveram com ele um jantar, em 6 de agosto de 2004, em Belo Horizonte, sem a presença de Valério. Neste encontro, teriam tratado da liquidação do Banco Mercantil de Pernambuco. Quando depôs no Conselho de Ética, Dirceu disse a mesma coisa. Negou ter tratado de empréstimos com os diretores do Rural afirmando que a conversa foi sobre o destino do Banco Mercantil de Pernambuco. Kátia ontem sustentou a versão dos empréstimos e refutou a hipótese de o Rural ter sido beneficiado por aplicações dos fundos de pensão. Assegurou que elas sofreram até uma ligeira queda em relação ao governo passado.

Duas perguntas esta história suscita. Primeiro, se a história procede, por que Delúbio e Valério não deram logo esta explicação? Para o PT teria sido melhor mas não para Dirceu. Quiseram poupá-lo e não puderam mais sair da versão dos empréstimos.

A outra pergunta é: por que a CPI sempre descarta esta hipótese, que esclareceria a origem de pelo menos boa parte do dinheiro? Além disso, ela alcançaria a ponta que está passando impune, o Banco Rural. Esta versão, entretanto, não interessa à oposição, mais interessada em golpear o PT, acusando-o de patrocinar um colossal desvio de dinheiro público.

Mas diz agora o deputado Gustavo Fruet:

- De fato temos deixado esta hipótese em segundo plano mas eu estou empenhado em investigá-la. Há muitos elementos que a tornam plausível. O problema é que o Banco Central se negou sempre a confirmar que tenha recebido pressões, do Delúbio ou do Dirceu, para facilitar a entrega do Banco Mercantil de Pernambuco ao Rural. Se o Banco Central não colabora, fica difícil, embora eu tenha informação de que as pressões ocorreram.