Título: UM COMUNISTA QUE RESISTIU A FRITURAS E DEFENDE SACI PERERÊ
Autor: Ilimar Franco
Fonte: O Globo, 29/09/2005, O País, p. 4

Reviravoltas fazem parte da trajetória política de Aldo Rebelo no governo Lula

BRASÍLIA. Demitido em junho pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva do Ministério da Coordenação Política, depois de meses de pressão do PT, o deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) se transformou, em menos de uma semana, no candidato dos petistas e do governo à presidência da Câmara dos Deputados. Reviravoltas como essa são comuns na trajetória política de Aldo, que depois de ser hostilizado no governo pelo ex-chefe da Casa Civil José Dirceu, aceitou ser uma de suas testemunhas de defesa no processo por quebra de decoro parlamentar a que o petista responde no Conselho de Ética da Câmara. E agora vai conduzir os processos de cassação em curso na Casa, inclusive o de Dirceu.

¿ O governo não poderia ter escolhido melhor candidato ¿ disse o secretário-geral do PSDB, Bismarck Maia (CE).

No comando da articulação política do governo Lula, Aldo sofreu uma derrota importante em junho de 2004, quando a oposição conseguiu aprovar o salário-mínimo de R$275 no Senado, contra os R$260. A derrota foi conseqüência de sua decisão de trabalhar contra a aprovação da emenda que permitiria a reeleição dos então presidentes da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), e do Senado, José Sarney (PMDB-AP). O que não imaginava àquela época é que poderia vir a ocupar a presidência da Câmara.

Nacionalista, Aldo Rebelo é autor do polêmico projeto que proíbe o uso de estrangeirismos, tais como batizar o atendimento pessoal de uma instituição bancária de personal banking. A proposta, apresentada em 1999, passou na Câmara mas não chegou a ser votada no Senado. Mesmo ocupando posição importante no Congresso, Aldo não trabalhou para transformar o projeto em lei.

Para se contrapor à importação cultural da festa de Halloween, de origem celta, apresentou projeto criando no dia 31 de outubro o Dia do Saci Pererê, um dos mais populares personagens do folclore brasileiro.

Ao tentar impedir a CPI dos Correios, ainda ministro, Aldo comparou as forças políticas que apoiavam a investigação às que ¿tentaram derrubar Floriano Peixoto, Getúlio Vargas, JK, Jânio Quadros e João Goulart¿:

¿ A oposição abandona o respeito à democracia.

Alagoano de 49 anos, Aldo Rebelo nasceu em 23 de fevereiro de 1956, em Viçosa, Alagoas, na Fazenda Maria Lia, que pertencia ao ex-senador Teotônio Vilela, onde seu pai era vaqueiro. Mas fez carreira política em São Paulo. Está em seu quarto mandato na Câmara por São Paulo e seu interesse pela política começou quando estudava no Colégio Agrícola Floriano Peixoto, na década de 70. Ele ingressou na Ação Popular (AP), que poucos anos depois se incorporou ao Partido Comunista do Brasil (PCdoB).

Já comunista, em 1979, quando a União Nacional dos Estudantes (UNE) foi reconstruída, Aldo foi eleito secretário-geral e, na gestão seguinte, presidente (1980-1981). A militância no movimento estudantil o levou a se transferir para São Paulo, onde elegeu-se vereador em 1988, pelo PMDB. Dois anos depois conquistou seu primeiro mandato como deputado federal.

Aldo Rebelo faz coisas que não são comuns. Em 1989, com um mapa feito por Euclides da Cunha e que ilustrava uma das edições de ¿Os Sertões¿, percorreu toda a região de Canudos, na Bahia. E terminou a viagem subindo a pé o Monte Pascoal. Em 2003, fez uma expedição para localizar uma cachoeira na Serra de Dois Irmãos, que, segundo o historiador Audemário Lins, foi o último refúgio de Zumbi dos Palmares.

Em dezembro de 1997, durante 15 dias, acompanhado da mulher, Rita, e do filho, Pedro, Aldo percorreu o Rio Grande do Sul visitando os túmulos dos principais caudilhos gaúchos: Gumercindo Saraiva (em Santa Vitória do Palmar), Antônio de Souza Neto (em Bagé), Davi Canabarro (em Poncho Verde), Assis Brasil (em Pedras Altas), Getúlio Vargas e João Goulart (em São Borja). O roteiro terminou no monumento a Luiz Carlos Prestes (em Santo Angelo). Pedro, que tinha então 6 anos, perguntou ao pai:

¿ Por que você está tirando fotos desses cemitérios?

No período em que esteve no governo, como coordenador político, foram aprovados projetos importantes do Executivo como as leis de biossegurança, de falências, de biodiesel e a regulamentação do setor elétrico.

Os petistas nunca perdoaram o fato de ele ter lutado contra a reeleição para os comandantes do Congresso e pressionaram Lula para demiti-lo na reforma ministerial de junho. Naquela altura, a crise política já tinha tomado conta do cenário político com as denúncias de corrupção nos Correios e do pagamento de mesada para deputados votarem nos projetos do governo, segundo o ex-presidente do PTB Roberto Jefferson (RJ), que teve seu mandato cassado.

No início da crise, quando a oposição chegou a cogitar o impeachment do presidente Lula, Aldo acusou os partidos de oposição de estarem tentando dar um golpe. Em março, quando ainda estava no cargo, mas o PT já exigia abertamente sua saída e era pública sua fritura, disse:

¿ Estou habituado a temperaturas elevadas.

Antes de se tornar ministro do governo Lula, sua atuação mais marcante na Câmara foi como presidente da CPI da CBF/Nike. A comissão não teve conseqüências práticas importantes para o combate às mazelas do futebol brasileiro, mas teve ao menos um resultado indireto: não permitiu a reeleição de Eurico Miranda (RJ), envolvido com denúncias de lavagem de dinheiro, evasão de divisas e sonegação de impostos.