Título: Marcha a ré na competitividade
Autor: Vladimir Goitia
Fonte: O Globo, 29/09/2005, Economia, p. 21

Na quarta queda seguida, Brasil recua 8 posições no ranking mundial, para 65º lugar

Apiora nos índices de qualidade das instituições públicas do país, os escândalos de corrupção e outros eventos políticos que atingiram a imagem do setor público fizeram o Brasil despencar da 57ª posição para a 65ª no ranking de competitividade do Fórum Econômico Mundial (WEF, na sigla em inglês) deste ano. Foi a quarta queda consecutiva do país.

De acordo com o Relatório de Competitividade Global 2005-2006, divulgado ontem em Genebra, esses episódios tiveram um duplo efeito negativo para o país: minaram a confiança dos empresários em relação à transparência dos gastos públicos e desviaram a atenção do Congresso de tarefas importantes para preparar a economia brasileira para os desafios impostos pela concorrência internacional.

¿ Isso é lamentável, principalmente se levarmos em conta que o Brasil conseguiu reduzir seu déficit público. (Na pesquisa) observamos que a comunidade empresarial está com uma percepção muito pessimista sobre a transparência e eficácia do gasto público ¿ disse o economista-chefe e diretor do programa de competitividade do WEF, Augusto Lopez-Claros, em entrevista por telefone, de Genebra.

Embora tenha reconhecido que houve uma redução considerável do déficit fiscal nos últimos anos no Brasil, o que merece aplausos, o economista ressaltou que é na eficiência e na transparência dos gastos públicos que estão os problemas.

¿ Vale lembrar que o déficit público tem dois aspectos: um se refere aos ingressos (arrecadação), e outro, aos gastos. E é nos gastos que se observa a ineficiência. O investidor quer ver honestidade e uma boa aplicação dos recursos públicos ¿ explicou Lopez-Claros.

Juros e burocracia dificultam negócios

A Fundação Dom Cabral, parceira do WEF e responsável pelos dados levantados no Brasil para o relatório, observa, no entanto, que, ao contrário do que se possa deduzir num primeiro momento, a atual crise política não é a causa direta da queda nos índices de competitividade do país. Até porque as pesquisas foram feitas entre janeiro e maio deste ano, antes da eclosão da crise atual. ¿Mesmo assim, o governo já era mal avaliado pelos executivos ouvidos na pesquisa¿, disse o professor Carlos Arruda, diretor de Desenvolvimento da Fundação e coordenador da pesquisa no Brasil, em comunicado.

Segundo ele, os executivos brasileiros puniram o Brasil pelo gasto ineficiente dos recursos públicos, pela alta carga tributária e pela legislação que dificulta o investimento e tributa excessivamente as empresas.

Ele acrescenta que a queda no quesito Instituições Públicas, da 50ª para a 70ª posição, representa a percepção dos executivos sobre as práticas que vieram a público a partir de maio deste ano, com as denúncias de corrupção nos Correios e a instalação das CPIs.

Para o presidente do Conselho Superior do Movimento Brasil Competitivo (MBC), Carlos Salles, o relatório deve ser visto como um instrumento para planejamento estratégico, por indicar as áreas prioritárias para foco, investimentos e ações.

¿ O estudo é uma ferramenta que permite estruturar e implementar uma estratégia de aumento de competitividade. Mas ele só terá utilidade se o seu uso estiver presidido por um processo que tenha objetivos bem estabelecidos e metodologia que não apenas aponte caminhos a seguir, mas também permita a medição do progresso alcançado ¿ afirma Salles.

O relatório do WEF, que traz um perfil detalhado de cada um dos 117 países analisados entre janeiro e maio de 2005, mostra também que as altas taxas de juros, a falta de regras claras, a burocracia e as dificuldades de acesso a financiamento estão entre os fatores que mais prejudicam os negócios no país.

Sobre a pesada carga tributária no Brasil, Lopez-Claros disse tratar-se de um problema sério, embora muitas nações desenvolvidas também tenham impostos altos que pesam na competitividade.

¿ A questão é que, no Brasil, há um alto desperdício de recursos públicos ¿ afirmou.

Além do quesito transparência, outros 39 indicadores, que medem a imparcialidade de servidores públicos quando interagem com o setor privado, a eficiência de gastos públicos e a qualidade do ambiente legal-jurídico, também caíram muito em 2005, razão pela qual o Brasil despencou no ranking do WEF.

¿Enquanto os fundamentos da recuperação econômica brasileira ainda são fortes (com o auxílio da alta dos preços das principais commodities), o governo precisa agir rapidamente para enfrentar problemas em áreas importantes como educação, infra-estrutura e emprego. Além disso, o setor privado costuma mostrar grande interesse em novas tecnologias e no fomento de inovações¿, diz um trecho do amplo capítulo sobre o Brasil.

No relatório deste ano do WEF, cerca de 11 mil líderes empresariais de 117 economias do mundo foram consultados. A Fundação Dom Cabral foi responsável pelo levantamento dos dados no Brasil, onde a pesquisa envolveu 212 executivos de 190 empresas nacionais e multinacionais.

FINLÂNDIA LIDERA RANKING PELA QUARTA VEZ, na página 22