Título: AMPLIAR A LICENÇA-MATERNIDADE
Autor: PATRÍCIA SABOYA GOMES
Fonte: O Globo, 27/09/2005, Opinião, p. 7

Nas últimas décadas, as mulheres obtiveram significativos avanços em diversas áreas, seja no campo dos costumes, com a liberação sexual, ou no profissional, com a conquista de espaços cada vez maiores no mercado de trabalho. O desafio da mulher do século XXI é outro: encontrar o equilíbrio entre essas conquistas e uma experiência inerente ao sexo feminino, que é a vivência plena da maternidade. Toda mãe sabe o quanto é relevante ter uma convivência estreita com seu filho, sobretudo nos primeiros meses de vida. Mas agora a ciência está comprovando que esse vínculo forte é determinante para que ocorra uma série de transformações no bebê que contribuem não só para o seu desenvolvimento físico, mas também emocional e intelectual.

É que no primeiro semestre de vida acontece um enorme número de ligações entre os neurônios. Um bebê nasce com quase 100 bilhões de células cerebrais, que, porém, não estão conectadas entre si. A ligação entre elas se dá justamente por meio de estímulos que a criança recebe ao interagir com as pessoas que a rodeiam. É por isso que os cientistas são unânimes em ressaltar a importância do vínculo entre mãe e filho e entre o bebê e a família. Reforçar esses laços é um dos principais objetivos da proposta de licença-maternidade de seis meses idealizada pela Sociedade Brasileira de Pediatria e endossada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que apresentei como projeto de lei ao Senado.

Outro papel do projeto é o de estimular o aleitamento materno exclusivo nos seis primeiros meses, exatamente como preconiza a Organização Mundial de Saúde (OMS). O próprio governo brasileiro faz campanhas orientando as mães a dar de mamar a seus filhos durante esse período. Contraditoriamente, a Constituição prevê uma licença-maternidade de quatro meses.

Vale ressaltar que a licença de seis meses é facultativa. Aderem à proposta as empresas privadas que se interessarem em ter descontos em tributos federais. A dedução será correspondente aos dois meses excedentes do salário da funcionária. A trabalhadora, por sua vez, poderá escolher se prefere ficar longe do trabalho por quatro ou seis meses.

Acreditamos que é preciso consolidar no país a cultura da responsabilidade social, fazendo com que as empresas percebam que, ao adotar essa prática, ajudam toda a sociedade. Saem ganhando a empresa, porque suas funcionárias trabalharão mais motivadas; as mulheres, porque vão ter um convívio mais rico com seus filhos; a própria criança, é claro; e o Estado, que terá uma economia brutal com a redução das internações hospitalares. Sim, porque o leite materno funciona como uma verdadeira vacina contra várias doenças. Crianças que não são amamentadas exclusivamente nesse período possuem menos defesas contra males que podem ser fatais, como pneumonia e diarréia, além de terem mais chances de desenvolver alergias.

É um mito a alegação de que a licença-maternidade acarreta altos custos para as empresas. Uma pesquisa recente da Organização Internacional do Trabalho (OIT), realizada com assalariadas do Brasil, Argentina, Chile e México, concluiu que os custos relativos à licença-maternidade e ao cuidado com as crianças são mínimos: variam de 0,2% a 1% da remuneração bruta mensal das trabalhadoras. Outro equívoco é achar que o projeto dificultará o acesso das mulheres ao mercado de trabalho. Afinal, elas são profissionais, mas também são mães e está mais do que na hora de serem respeitadas pelos múltiplos papéis que desempenham na sociedade.

O empresariado brasileiro já deu sinais de que está aberto a esse avanço. Foi o que percebemos em visitas recentes à Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), à Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomercio) e à Fundação Abrinq. Prova de que esse segmento tão fundamental já se convenceu de que o impacto dos seis meses de distanciamento do trabalho será pequeno diante da imensurável contribuição que o estreitamento dos laços entre mãe e filho trará para as novas gerações.

PATRÍCIA SABOYA GOMES é senadora (sem partido ¿ CE).