Título: RFFSA FOI LIQUIDADA MAS SOBREVIVE E JÁ CUSTOU R$5,5 BI
Autor: Mariza Louven e Monica Tavares
Fonte: O Globo, 27/09/2005, Economia, p. 23

Processos iniciados na década de 90 e ainda não concluídos mostram que é difícil mudar estrutura do Estado

RIO e BRASÍLIA. Seis processos de liquidação de empresas estatais e de extinção de órgãos e entidades públicos, alguns iniciados na década passada, ainda não foram concluídos. São histórias sem fim, que confirmam as dificuldades de reformar a estrutura do Estado brasileiro. É o caso da liquidação da Rede Ferroviária Federal S.A. (RFFSA), decretada há cinco anos, cuja insolvência já custou R$5,5 bilhões aos cofres da União e ainda representa risco potencial de outros R$6,9 bilhões ¿ contencioso judicial que inclui 38 mil ações trabalhistas.

O Programa Nacional de Desestatização (PND), cujo auge ocorreu nos anos 90, também está longe de terminar. A Telebrás é um exemplo: remanescente da privatização do setor de telecomunicações, ocorrida em 1998, sobrevive até hoje. A sua liquidação deveria ter acontecido dois anos depois.

Portobrás era um dos símbolos do Estado forte

Segundo o Ministério do Trabalho, a dívida da RFFSA é de R$13,6 bilhões e seus prejuízos acumulados chegam a R$16,7 bilhões. Este é o caso mais complicado entre as 66 liquidações e extinções iniciadas a partir de 1985, das quais 60 concluídas. Desde então, foram eliminados símbolos do Estado forte como a Empresa de Portos do Brasil S.A. (Portobrás), a Distribuidora de Filmes S.A. (Embrafilme), a Petrobrás Comércio Internacional S.A. (Interbrás), a Siderurgia Brasileira S.A. (Siderbrás) e Cia de Navegação Lloyd Brasil (Lloydbrás).

Outros casos resistem no tempo. Além da RFFSA, está inacabada a liquidação das Centrais de Abastecimento da Amazônia e a extinção do Instituto Nacional do Desenvolvimento do Desporto, da Fundação Centro Tecnológico para Informática, da Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia e da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste.

A operação da RFFSA foi transferida para a iniciativa privada em 1996; e a liquidação da empresa remanescente foi decretada em 1999. Mas o processo voltou à estaca zero este ano: o Ministério dos Transportes enviou, em abril, a medida provisória 246 ao Congresso, propondo o encerramento, mas a iniciativa não foi aprovada pelo Legislativo.

Segundo o secretário-executivo do Ministério dos Transportes, Paulo Sérgio Oliveira Passos, o término da liquidação da RFFSA é um passo natural, que o governo estava disposto a dar, desde que incluiu a empresa no Programa Nacional de Desestatização.

Já a Telebrás continua existindo, com mais de 2 milhões de acionistas e papéis negociados na Bolsa de Valores de São Paulo. Para o seu presidente, Jorge Motta, as dificuldades de fechar a empresa são contingências técnicas. A Telebrás tem obrigações jurídicas, fiscais e financeiras como qualquer outra de capital aberto, apesar de não ter mais atividade produtiva.

¿ A Telebrás é atípica. Recolhe impostos, paga INSS. É ativa, mas não operacional ¿ disse Motta.

A Telebrás é uma empresa de economia mista, sem ativos. Somente de crédito de compensação tributária, junto ao Tesouro, tem R$100 milhões a receber. Seus gastos anuais com serviços de terceiros, aluguéis e outros chegam a R$8,571 milhões, somados a R$26 milhões de gastos com pessoal próprio cedido a outras estruturas federais. Este valor é ressarcido pelos órgãos.

¿ A Telebrás não recebe um centavo do governo. Ela se mantém ¿ afirmou Motta.

A empresa tem uma estrutura mínima, como manda a Lei das Sociedades Anônimas: presidente, diretor, conselho de administração e conselho fiscal. São 300 funcionários, 244 cedidos para a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel); 45 emprestados para outros órgãos do governo e apenas 11 trabalham efetivamente na Telebrás.