Título: PASSO HISTÓRICO RUMO À UE
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Fonte: O Globo, 04/10/2005, O Mundo, p. 26

Turquia abre negociação para integrar bloco após resistência austríaca ser vencida

CIDADE DE LUXEMBURGO e ANCARA

AUnião Européia e a Turquia chegaram ontem a um acordo histórico que permitiu que o país muçulmano entrasse oficialmente em negociações para se tornar membro do bloco europeu. Depois de séculos de desconfiança e guerras e mais de 40 anos de aproximação diplomática, os últimos obstáculos para o início das negociações só foram derrubados depois de mais de 30 horas de tensas reuniões. As negociações iniciadas ontem podem durar, segundo especialistas, dez anos ou mais.

¿ Um ponto histórico foi alcançado e este é o início de nossas conversações para nos tornarmos membros (da UE). A Turquia embarcou numa nova era ¿ disse o ministro do Exterior turco, Abdullah Gul.

Porém, durante o dia, os esforços dos negociadores, liderados pelo chanceler britânico Jack Straw (o Reino Unido ocupa a presidência rotativa da UE), era tentar convencer a Áustria a retirar suas objeções. As rivalidades históricas entre Áustria e Turquia existem há séculos. Tropas turcas chegaram a cercar Viena em 1683.

Viena não aceitava que o objetivo final da negociação UE-Turquia fosse a entrada do país muçulmano no bloco como integrante com pleno direito, mas só como ¿parceiro privilegiado¿.

Com isso, Gul se recusou a deixar Ancara e a sessão dos representantes dos 25 membros da UE em Luxemburgo começou sem a presença de qualquer autoridade turca.

Áustria consegue impor mudanças

No fim de horas, os outros 24 integrantes da UE venceram a resistência da Áustria, que, no entanto, conseguiu impor duas mudanças no texto original: foi adicionada uma cláusula que delegou à Comissão Européia avaliar a capacidade da UE de receber novos Estados quando chegar o momento da entrada da Turquia no bloco; e incluída menção explícita à possibilidade de as negociações não darem certo.

Para evitar que esta segunda cláusula impedisse o acordo, o texto acrescentado foi cuidadosamente redigido: ¿se a Turquia não está em posição de assumir totalmente as obrigações de pertencer à UE, deve ser assegurado que ela estará completamente ancorada nas estruturas européias através do vínculo mais firme possível.¿

O chanceler federal da Áustria, Wolfgang Schuessel, disse que o texto final foi uma vitória austríaca:

¿ Para os cidadãos da Europa, nós mostramos que eles não podem ser simplesmente esmagados.

Os governos de Áustria e França se reservaram o direito de fazer consultas aos eleitores antes da aprovação final da Turquia na UE. Numa pouco comum interferência dos EUA nos assuntos europeus, a secretária de Estado americana, Condoleezza Rice, telefonou ao premier turco, Tayyip Erdogan, que ainda resistia a outra cláusula.

Com o texto proposto pela UE, a Turquia aceita seguir as diretrizes do bloco em relação a instituições multilaterais, o que, na prática, impediria que Ancara vetasse uma possível entrada de Chipre ¿ país não reconhecido pela Turquia, mas que é membro da UE ¿ na Otan, o tratado militar entre EUA e países europeus. Condoleezza teria dito que o país não precisa se preocupar com tal questão.

País associado da Europa desde 1963

O ministro do Exterior turco acabou chegando a Luxemburgo depois da meia-noite local e só então as negociações foram oficialmente abertas.

¿ Este é um dia verdadeiramente histórico para a Europa e para toda a comunidade internacional. Esta ampliação levará à UE um Estado forte e secular de maioria muçulmana, como prova de que podemos viver e trabalhar juntos ¿ afirmou Straw.

O chanceler de Portugal, Diogo Freitas do Amaral, concordou e ressaltou a importância das negociações:

¿ A negociação provavelmente desagradará Bin Laden, que fez tudo para evitar a chegada deste momento.

A Turquia se tornou membro associado da então Comunidade Européia em 1963 e fez o pedido para se tornar um integrante do bloco em 1987. Porém, apenas em 1999 a candidatura foi oficialmente reconhecida.