Título: BC COMPRARÁ DÓLARES PARA PAGAR DÍVIDA
Autor: Enio Vieira e Patricia Eloy
Fonte: O Globo, 30/09/2005, Economia, p. 25

Pagamentos de 2006 somam US$11,2 bi. Dólar tem novo recorde e cai para R$2,213

BRASÍLIA e RIO. O Banco Central (BC) anunciou ontem que o Tesouro Nacional poderá comprar integralmente no mercado de câmbio os recursos necessários para cobrir os vencimentos de dívida externa pública em 2006. Segundo o diretor de Política Econômica do BC, Afonso Bevilaqua, os pagamentos somam US$11,266 bilhões no próximo ano e o Tesouro já comprou US$3,990 bilhões nos últimos meses para estes compromissos. As compras, que ocorrem por meio do Banco do Brasil, podem ser contratadas com 180 dias de antecedência.

Bevilaqua disse que, se houver uma piora nas condições do mercado de câmbio e não for possível adquirir o total pretendido, o Tesouro usará recursos das reservas internacionais. Nos últimos três anos, o Tesouro divide os pagamentos externos do governo entre recursos das reservas e aqueles comprados no mercado. O diretor do BC informou ainda que, do total de US$12,433 bilhões de vencimentos em 2005, a maior parcela, de US$10,006 bilhões, virá de aquisições em mercado. O Tesouro já contratou todo o montante para este ano.

¿ Nos beneficiamos de condições de liquidez no mercado internacional e aproveitamos um período que poderia ser transitório ¿ disse Bevilaqua, acrescentando que o BC poderá voltar a qualquer momento a comprar dólares para as reservas, o que não ocorre desde março passado.

Estimativa de reservas subiu para US$44 bi

Num primeiro momento, as declarações do diretor do BC causaram tensão no mercado financeiro. Alguns investidores as interpretaram como um sinal de que o BC poderia comprar dólares ontem mesmo. O dólar, cotado a R$2,222 no momento, passou a subir mais de 1%. Passada a confusão, a moeda voltou a cair, fechando a R$2,213, em queda de 0,98%, próxima à mínima do dia (R$2,210) e batendo novo recorde: a moeda, que valia R$2,65 no início do ano, atingiu a menor cotação desde 30 de abril de 2001 (R$2,20).

Segundo Bevilaqua, mesmo sem a necessidade de captar recursos no mercado internacional, o governo manterá o cronograma de emitir US$4,5 bilhões em bônus soberanos no exterior em 2006. Ele afirmou que esta programação não inclui os US$2,5 bilhões que já foram captados além do previsto em 2005.

As boas condições levantadas por Bevilaqua podem ser vistas nas estimativas de sobra de recursos nas contas externas. O excedente de dólares, segundo o diretor, está nas exportações e não em capitais de curto prazo que estariam sendo atraídos pelos juros altos no Brasil. O BC prevê um superávit em transações correntes (comércio exterior, juros, viagens internacionais, remessas de lucros e dividendos) de US$9,4 bilhões em 2005, caindo para US$500 milhões em 2006 ¿ devido ao aumento importações. O superávit comercial (exportações menos importações) deve cair de US$38 bilhões neste ano para US$29 bilhões em 2006.

No atual cenário de liquidez, o BC aumentou de US$56,6 bilhões para US$58,7 bilhões a previsão de reservas internacionais brutas (incluindo os empréstimos do Fundo Monetário Internacional) em dezembro de 2005. Para o fim de 2006, a projeção é US$59 bilhões. Na chamada posição líquida, que mostra o poder de fogo do governo para uma crise externa, a estimativa de reservas subiu de US$41,9 bilhões para US$44 bilhões neste ano e está em US$51,5 bilhões para 2006.

Risco fica em 348 pontos, em queda de 1,97%

Ontem, as especulações em torno do vencimento, na segunda-feira, de contratos de câmbio negociados no mercado futuro, ajudaram a empurrar o dólar para mais próximo das mínimas do dia. Como os contratos são remunerados pela média do câmbio do dia anterior (hoje), quanto menor a cotação, maiores os lucros dos investidores.

Os bons fundamentos da economia levaram o risco-Brasil a uma nova queda ¿ de 1,97% ontem ¿ para 348 pontos centesimais, próximo à mínima histórica de 337 pontos. O Global 40 subiu 0,55%, para 122,25% do valor de face, um novo recorde. A Bolsa de Valores de São Paulo recuou 0,35%. Ontem, em relatório, o banco de investimentos Merrill Lynch elogiou a economia brasileira. Para a instituição, a Bolsa deve subir 17% em 12 meses. Os ativos do país estão no topo de recomendações do banco na América Latina.