Título: Em defesa do saci e da farinha de mandioca
Autor: Ciça Guedes
Fonte: O Globo, 02/10/2005, O País, p. 12

Projetos de lei apresentados pelo presidente da Câmara não refletem sua importância, diz Diap

Quem tentar conhecer a atuação parlamentar do novo presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), pesquisando os projetos de lei apresentados por ele pode ter a impressão que o sucessor de Severino Cavalcanti é mais um integrante da bancada dos esquisitões, aquela que reúne parlamentares que se destacam pelo comportamento excêntrico ou pelas bizarrices que formulam. Obrigatoriedade de adição de farinha de mandioca à de trigo, criação do Dia do Saci, proibição de exigência de declaração de idade no currículo, construção de um campo de futebol a cada mil lotes e mil unidade habitacionais ou a obrigatoriedade de armazenar em cada estação ecológica cópia de todas as pesquisas ali realizadas são algumas das proposições de Aldo em seus quatros mandatos.

Mas o diretor de documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Antônio Augusto de Queiróz, alerta: quem vê projeto, não vê atuação:

¿ Não se deve analisar a atuação do parlamentar somente pela produção de projetos. Delfim Netto apresentou pouquíssimos, e é considerado um dos mais influentes do Congresso. Miguel Arraes foi deputado mais de uma vez e não apresentou nenhum.

No caso de Aldo, que também se preocupa com a regulamentação da prática da yôga (no projeto de lei que apresentou em 2001 ele usa o acento circunflexo e o y), o diretor do Diap lembra que, no início da carreira política, ele formulava propostas relacionadas ao mundo do trabalho, e salvou o emprego de milhares de frentistas ao proibir o uso de bombas de combustível de auto-serviço, que virou lei em 2000 após dois anos de tramitação.

¿ Aldo também está entre os parlamentares mais influentes por sua capacidade de promover o diálogo, o entendimento, uma função importantíssima no Parlamento. O pefelista José Thomaz Nonô (que concorreu com ele à presidência da Câmara) tem um perfil mais centralizador, pode-se dizer até autoritário ¿ analisa Queiróz.

Chefe da delegação que visitou Bagdá

Os parlamentares apresentam as propostas por convicção, para agradar às bases, aparecer na ordem do dia, entre outros motivos. Mas se o sujeito é tinhoso e persegue sua cria pelos caminhos da Câmara até que ganhe o status de lei, como faz o petista Paulo Paim, aí a produção de projetos é um índice a ser considerado.

Mas Aldo também tem sua cota de comportamento excêntrico em relação à média do Congresso, além do jeito caladão e circunspecto de seguidor do minimalismo maoísta do PCdoB. Enquanto deputados se digladiam pelas vagas nas viagens oficiais ao exterior, a ponto de Severino tê-las usado como bandeira de campanha com o baixo clero, o comunista certamente não precisou brigar para chefiar a delegação que foi à capital do Iraque, Bagdá, em 1993. Também não deve ter atraído olho gordo sua participação no VIII Congresso do Partido Comunista do Vietnã, em 1996.

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