Título: BC AUMENTA CARGA NO CÂMBIO
Autor: Regina Alvarez/Patricia Eloy/Vagner Ricardo
Fonte: O Globo, 05/10/2005, Economia, p. 23

Instituição triplica volume de compra de dólares em novo leilão e faz moeda subir 1,43%

Um dia depois de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reclamar que os empresários querem que o governo intervenha no câmbio para determinar o valor do dólar, o Banco Central (BC) voltou à carga e triplicou o volume de compra de moeda. Resultado: o dólar, que havia ficado estável na véspera, fechou em alta de 1,43%, cotado a R$2,261, na máxima do dia. Foi a maior alta desde 19 de agosto, quando a moeda subiu 2,94%. Segundo estimativas do mercado, a instituição teria adquirido entre US$300 milhões e US$400 milhões, enquanto na última segunda-feira - no primeiro leilão após quase oito meses fora do mercado - o volume teria sido inferior a US$100 milhões.

Na nova investida, o BC repetiu a estratégia utilizada no ano passado - quando, após dez meses de ausência, voltou a comprar dólares no mercado. Após uma atuação discreta no primeiro leilão, o BC adotou uma postura mais agressiva: não apenas comprou uma quantidade maior de dólares, mas também pagou mais caro do que na véspera, exatamente como em dezembro de 2004. No momento do leilão, que aconteceu entre 12h16m e 12h26m, o dólar valia R$2,239 - próximo da mínima do dia, de R$2,235 - mas o BC aceitou ofertas até R$2,240. Num horário em que o volume começa a ficar mais reduzido, a atuação teve efeito imediato: após os dez minutos do leilão, a moeda já subia quase 0,30%, cotada a R$2,245. Na segunda-feira, o BC comprou dólares a R$2,231, abaixo dos R$2,232 que a moeda valia no momento do leilão.

Analistas vêem novo piso para a moeda

Também aumentou o número de ofertas aceitas pelo BC no mercado: 22 ontem, contra apenas três na véspera. Tudo isso, somado ao fato de que o dólar já havia iniciado os negócios em alta de 0,45%, a R$2,239, acabou pesando sobre as cotações.

- Ao entrar no mercado com mais poder de fogo, o BC conseguiu puxar para cima as cotações, o que trouxe nervosismo para o mercado financeiro. Agora, o mercado já começa a especular que, com as compras de dólares, o Banco Central (BC) pode estar sinalizando um piso para o câmbio, um patamar do qual o dólar não deve passar, entre R$2,231 e R$2,24 - explica José Roberto Carreira, gerente de câmbio da corretora Novação.

Para João Medeiros, diretor de câmbio da corretora Pioneer, apenas as compras à vista não serão suficientes para valorizar o dólar. Ele acredita que seria necessária uma queda mais forte dos juros básicos ou a retomada dos leilões de compra de dólares no mercado futuro (os chamados swaps cambiais) - que foram feitos entre fevereiro e março deste ano e que conseguiram fazer o dólar subir.

- Não acredito que, apenas com a atuação do BC no mercado à vista, o dólar ultrapasse os R$2,30. Para isso, seria necessário fazer leilões em dias de pouca liquidez e comprar uma grande quantidade de moeda para equilibrar a forte entrada de dólares no mercado, efeito das exportações e da elevada liquidez internacional - avalia Medeiros.

- Sem a intervenção do BC, a tendência ainda é de baixa, porque o fluxo de ingresso de recursos ainda é muito forte - concorda o gerente da mesa de câmbio do banco BVA, Júlio Cardozo.

Ontem o BC informou ao mercado que não fará, pela 30ª semana consecutiva, o leilão de swaps. O volume de negócios no mercado ontem, de pouco menos de US$1 bilhão, ficou bem abaixo da média dos últimos dias, de US$1,5 bilhão.

No BC, os técnicos desmentem a especulação do mercado de que a volta da autoridade monetária às compras tem como objetivo elevar a cotação do dólar ou mesmo fixar um piso para o câmbio. Ressaltando que sabem que "ninguém vai acreditar nesse discurso mesmo", a equipe técnica afirma que houve uma avaliação de que o atual patamar das cotações é extremamente favorável para comprar moeda para reforçar as reservas internacionais. A argumentação é que as compras têm valores muito baixos se comparados ao forte fluxo de entrada de dólares devido às receitas com as vendas externas. Seria necessário um volume de aquisição de dólares muito grande para o BC influenciar o mercado.

Outra influência importante na alta do dólar foi o comportamento do risco-Brasil, o indicador de confiança dos investidores estrangeiros. Ontem, acompanhando o dia negativo para os títulos da dívida externa de países emergentes, o risco subiu 3,52%, para 353 pontos centesimais, um dia depois de ficar em 341 pontos e aproximar-se da mínima histórica de 337 pontos, de 1997.

Bolsa tem queda após novo recorde

O Global 40, o título brasileiro mais negociado no exterior, caiu 0,61%, para 121,65% do valor de face. Este movimento ocorreu porque os investidores voltaram a comprar títulos americanos, desfazendo-se dos papéis dos países emergentes.

A Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) chegou ontem a atingir a inédita marca de 32.051 pontos nas primeiras horas de negociação. Mas a alta do risco-país e do dólar, e o recuo das bolsas dos Estados Unidos levaram a Bovespa a fechar em queda de 1,8%. No mercado americano, o Dow Jones caiu 0,9%; o Nasdaq, 0,75%; e o S&P 500, 1%.

COLABOROU: Regina Alvarez

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