Título: CARO E ERRADO
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Fonte: O Globo, 06/10/2005, Opinião, p. 6

Aatual proposta de transposição de vazões do Rio São Francisco para as bacias carentes do Nordeste não é a mais indicada. Trata-se de uma solução simplista em que, através de grandes extensões de canais e estações elevatórias, a água será acumulada em açudes espalhados na região (com grandes perdas d¿água por evaporação) e, por meio de redes adutoras, distribuída à população. Serão gastos mais de US$4 bilhões para transpor cerca de 65 metros cúbicos por segundo de água, com enorme desperdício hídrico e comprometimento do equilíbrio ecológico do próprio São Francisco.

A transposição de vazões é necessária, mas não nos moldes propostos pelo governo. O problema do sertão nordestino não é falta de água, mas a inconstância das precipitações e a gestão inadequada ao longo de décadas pelos sucessivos governos. A chuva média anual no Nordeste é em torno de 600 milímetros, enquanto no Arizona, por exemplo, é de 150 milímetros. Lá não existe falta d¿água, pois há uma política de economia hídrica e de sustentabilidade. No Nordeste do Brasil existe o caos na gestão de bacias hidrográficas.

A transposição deve ser feita, como solução emergencial, a partir do Rio do Sono, um tributário do Rio Tocantins que tem divisão de águas com o São Francisco. O Velho Chico apenas serviria como transportador das águas da bacia do Tocantins. A transposição seria mais barata e simples, e com viabilidade ecológica, e com uma vazão a ser transposta muito menor, na faixa de 20 metros cúbicos por segundo. Paralelamente, deve ser implantada uma política de economia hídrica, recuperação ecológica das bacias e investimentos em educação e monitoramento ambientais.

Em poucos anos não seria mais necessário transpor essas águas, pois haveria uma auto-sustentabilidade hídrica nessas bacias.

ADACTO BENEDICTO OTTONI coordena o curso de pós-graduação em engenharia sanitária e ambiental da Uerj.