Título: Renúncia no horizonte
Autor: Gerson Camarotti
Fonte: O Globo, 07/10/2005, O País, p. 3

Maioria dos deputados da lista de cassáveis cogita desistir dos mandatos para evitar punição

A maioria dos 13 deputados da lista de cassáveis que podem ter processos abertos no Conselho de Ética da Câmara por quebra de decoro parlamentar, terça-feira ou quarta-feira, retomou as consultas aos colegas, líderes e dirigentes partidários sobre a possibilidade de renunciar aos seus mandatos. Essas consultas cresceram nas últimas 48 horas e deverão se estender até semana que vem. No núcleo do governo, a avaliação é de que a renúncia, especialmente dos petistas, diminuiria de forma significativa o noticiário sobre a crise política. Com os processos em andamento, a crise seria prolongada até março ou abril de 2006, invadindo o calendário eleitoral.

Para escapar de uma eventual cassação e a conseqüente perda dos direitos políticos por oito anos, a renúncia tem que acontecer antes de o processo ser iniciado no Conselho, após o encaminhamento da Mesa Diretora, o que deverá acontecer terça-feira.

Segundo integrantes da Mesa ouvidos pelo GLOBO, o prazo até terça-feira foi negociado informalmente entre os partidos para que os deputados tivessem um período maior para decidir sobre a renúncia. Isso já havia sido feito no caso de Severino Cavalcanti (PP-PE): o ex-presidente da Câmara ganhou prazo de cinco dias entre o pedido de abertura de processo contra ele e a data da reunião da Mesa que decidiria pelo encaminhamento da ação ao Conselho. Renunciou neste período e o processo nem foi encaminhado ao Conselho.

Quatro deputados consultaram colegas

Muitos dos deputados envolvidos no suposto esquema do mensalão já cogitam seguir o exemplo dos ex-deputados Valdemar Costa Neto (PL-SP) e Bispo Rodrigues (PL-RJ), os dois acusados no caso que renunciaram até agora.

No PT, pelo menos quatro deputados já consultaram colegas de partido sobre o tema: João Paulo Cunha (SP), Paulo Rocha (PA), Josias Gomes (BA) e João Magno (MG). Ainda resistem à idéia de renúncia os deputados Professor Luizinho (PT-SP) e José Mentor (PT-SP). O deputado José Dirceu (PT-SP) não pode mais renunciar porque o seu processo já corre no Conselho de Ética. Já se discute, até mesmo, um discurso comum para a renúncia: de que este é um julgamento político e que não adianta tentar provar a inocência.

Quem decidir pela renúncia vai alegar que não existem provas de quebra de decoro parlamentar e que por isso não irá se submeter a um linchamento político da Casa. Ontem, o clima era de velório entre os deputados petistas que correm o risco de cassação. Eles não admitem publicamente que vão renunciar, mas admitem as consultas.

- Estamos conversando sobra o tema. Uns estão mais inclinados a renunciar. Até o momento não há uma decisão coletiva. Eu estou disposto a ir até o fim - disse Mentor.

- Vou analisar até terça-feira. A Mesa tem duas posições: recomendar os processos em separado ou em pacotão. É isso que vai decidir o meu futuro - disse Paulo Rocha, admitindo a possibilidade de renúncia se os processos forem analisados em bloco pela Mesa.

Internamente, os petistas lembram que aquela idéia de não dar legenda ano que vem para o deputado que renunciar era de Tarso Genro, que deixa a presidência do PT semana que vem. Ou seja, muitos têm esperanças de retomar o mandato no próximo ano. Esta semana, o deputado Josias Gomes chegou a procurar ministros do governo para saber o que fazer de seu futuro político.

Entre os ministros petistas, a posição majoritária é favorável à renúncia, principalmente dos deputados do PT. O próprio presidente Lula teria tentado, sem sucesso, a renúncia de José Dirceu antes da abertura do processo no conselho, em agosto. Chegou a mandar intermediários de peso como o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, e o senador José Sarney (PMDB-AP), que não conseguiram convencer Dirceu. Na ocasião, o próprio João Paulo Cunha manifestou o desejo de renunciar o mandato. Mas foi convencido por Dirceu a adiar a decisão.

Peemedebista também cogita renúncia

Não é só no PT que a renúncia está em discussão. Nos últimos dias, o ex-líder do PMDB, deputado José Borba (PR), que aparece na lista como beneficiário de Marcos Valério, sondou vários colegas de bancada. Tem dito de forma aberta que deve mesmo renunciar ao cargo. Seu argumento é de que só pode ser julgado por seus eleitores e que por isso quer disputar novo mandato. Em conversa com um colega do PMDB, Borba comparou o plenário da Câmara a um "corredor da morte, em que dificilmente alguém consegue escapar".

No PP, o deputado Pedro Corrêa (PE) consultou colegas e foi aconselhado a renunciar. Corrêa demonstra muita dúvida sobre qual decisão tomar. Já chegou a garantir que renunciaria, mas depois voltou atrás. Ontem, estava disposto a continuar na luta:

- Vou até o fim, vou provar minha inocência a todos - disse Corrêa.

Os deputados Vadão Gomes (PP-SP) e Pedro Henry (PP-MT) estavam certos de que a Corregedoria indicaria para eles uma pena diferenciada. Mas, com a decisão de mandar todos os processos para a Mesa, eles passaram a avaliar a idéia da renúncia. A mesma posição passou a ser cogitada pelo deputado Vanderval Santos (PL-SP), que acreditava numa pena diferente para ele.

Dos quatro deputados do PP, o único que resiste a falar em renúncia é o líder José Janene (PP-PR). Mesmo assim, já há quem aposte no PP que ele pode renunciar até terça. Já Roberto Brant (PFL-MG) tem sido aconselhado pelos colegas de partido a ir até o fim. O PFL trabalha para livrá-lo no plenário. Já contabiliza 150 votos favoráveis.

Legenda da foto: PEDRO HENRY, José Borba, João Paulo e Paulo Rocha (em sentido horário) estão entre os deputados ameaçados de cassação que consultaram colegas sobre a possibilidade de renunciar ao mandato