Título: AGENTES FEDERAIS SOB SUSPEITA DE ASSASSINATOS
Autor: Gustavo Goulart/Célia Costa/Antônio Werneck
Fonte: O Globo, 07/10/2005, Rio, p. 17

Inquérito aberto na PF apura participação de policiais na morte de dois homens flagrada por câmeras na Barra

A Polícia Federal abriu inquérito para investigar a suposta participação de dois policiais federais, lotados na Superintendência da PF no Rio, no assassinato em março este ano de dois homens na Avenida Abelardo Bueno, na Barra da Tijuca, em frente ao centro empresarial Rio Office Park. Os policiais teriam sido identificados depois de a PF analisar imagens de câmeras instaladas no centro empresarial, que gravaram o crime. As imagens foram entregues à PF pela Polícia Civil. Para os agentes federais, os dois homens teriam sido executados como "queima de arquivo" (eliminação de testemunha) depois de um desentendimento com os policiais, de quem receberiam supostamente cocaína desviada da própria Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DRE) da PF do Rio. Numa outra hipótese investigada, o duplo homicídio estaria ligado ao crime de agiotagem.

Fita é enviada para a corregedoria

Os dois federais também estão entre os suspeitos de participação no furto de R$2 milhões em euros, dólares e reais apreendidos durante a Operação Caravelas, que desarticulou uma quadrilha de traficantes que tentavam enviar à Europa 1,6 tonelada de cocaína escondida em bucho de boi. O dinheiro que estava guardado numa sala-cofre no interior da DRE foi roubado há três semanas. Seis portas foram arrombadas. A PF acredita que o dinheiro sequer chegou ao cofre e que o arrombamento foi uma farsa para encobrir a ação.

Atendendo a determinação do delegado José Milton Rodrigues, superintendente da PF do Rio, a fita que flagrou a suposta ação dos dois policiais federais foi entregue terça-feira à noite pelo delegado Marcos Cotrim, responsável pelo inquérito do furto dos R$2 milhões, ao delegado Marcos David Salem, ex-chefe do setor de Inteligência da PF do Rio e atualmente lotado na Corregedoria da PF. Embora com pouca definição, as fitas contêm imagens dos assassinatos e foram produzidas por cinco câmeras instaladas no centro empresarial para monitorar a movimentação de ruas próximas.

Pelo menos quatro policiais assistiram às imagens e identificaram os agentes federais. Os nomes, no entanto, estão sob sigilo. Na fita, um homem - que seria policial federal - aparece fazendo os disparos contra as duas vítimas usando uma pistola 45, mas a arma não seria oficial da Polícia Federal. Um exame de balística já está sendo pedido para fazer uma confrontação com armas apreendidas com os suspeitos. No momento do crime, os dois suspeitos estariam teriam num Corsa, descaracterizado, da Polícia Federal. David Salem já teria pedido ao setor administrativo da PF do Rio o documento comprovando que os dois policiais federais que aparecem na fita estavam usando o Corsa em serviço.

O delegado Marcos Cotrim, enviado pela Direção Geral da PF para presidir o inquérito que apura o furto dos R$2 milhões, passou mal ontem de manhã e foi internado num hospital particular. Policiais ligados ao delegado chegaram a pensar que ele havia sido envenenado, mas exames teriam comprovado que ele tem uma úlcera grave. A Polícia Federal determinou que uma escolta acompanhasse Cotrim ao hospital. O delegado, porém, dispensou a proteção. Procurado pelo GLOBO, ele desmentiu que tenha sido vítima de qualquer atentado.

O delegado explicou que tomou um comprimido para dor de cabeça, que teria agravado sua úlcera. Os médicos informaram que ele poderá ser submetido hoje a uma transfusão porque perdeu muito sangue.

Sindicância sobre roubo em canil é desarquivada

A PF também mandou desarquivar a sindicância que apurou e estranhamente não chegou a conclusão alguma sobre o arrombamento de ao menos oito armários que ficavam no canil da Superintendência da PF, no terceiro andar do prédio na Praça Mauá. Do canil, segundo as investigações da PF, foi roubado um fuzil automático. O fato tem sido negado pelo delegado Roberto Prel, o segundo na hierarquia da PF do Rio. Há indícios de que o arrombamento e o furto foram praticados por um agente federal para cobrar uma dívida contraída pela mulher de um policial. Além do desarquivamento da sindicância, foi aberto um inquérito para investigar todas as circunstâncias do caso. Não se sabe por que a fita foi avocada pelo superintendente da PF Rio e entregue a David Salem.

Legenda da foto: O DINHEIRO APREENDIDO na Operação Caravelas: cerca de R$2 milhões em euros, dólares e reais