Título: `Ninguém tem o mesmo carisma e é admirado pelos palestinos como Arafat¿
Autor: Deborah Berlinck
Fonte: O Globo, 05/11/2004, O Mundo, p. 38

Ghazi Hanania, líder da OLP próximo a Arafat e vice-presidente do Conselho Legislativo Palestino, disse em entrevista ao GLOBO que os palestinos estão dispostos a dar continuidade à política de paz com Israel. Hanania afirmou que não há luta pelo poder, que, segundo um plano decidido semana passada numa reunião do Comitê Central da OLP, será compartilhado entre o secretário-geral da organização, o presidente do Conselho, e o premier. Ele disse esperar do presidente reeleito George W. Bush um engajamento mais forte na solução do conflito. Graça Magalhães-Ruether

Como a liderança da OLP reagiu à notícia da morte de Arafat?

GHAZI HANANIA: Neste momento (17h em Ramallah), Arafat está em um estado muito crítico, mas não morreu. É uma falta de piedade a TV israelense ficar noticiando a sua morte, como que para causar inquietação entre os palestinos. Nós estamos realizando constantemente reuniões para discutir os últimos acontecimentos, mas o plano para o caso de morte já está pronto desde a semana passada.

Como é esse plano?

HANANIA: O plano prevê uma divisão do poder. O presidente do Conselho, Rawhi Fattuh, assumirá o poder provisoriamente, com dois meses para preparar eleições. O secretário-geral do Comitê Executivo da OLP, Mahmoud Abbas, será encarregado das decisões diárias, e o primeiro-ministro Ahmed Qorei continua no cargo.

É possível uma mudança radical da política palestina em relação a Israel?

HANANIA: Não, nós queremos continuidade na nossa política de paz. Se o governo de Israel estiver disposto mesmo à paz, claro que vamos fazer o possível para um fim definitivo do conflito. O nosso objetivo, o motivo de luta de Arafat durante toda a sua vida, é a paz e a autonomia dos palestinos com um direito a um país à vida em liberdade, sem controle constante por militares israelenses.

O senhor vê o perigo de luta pelo poder? O Hamas é uma ameaça?

HANANIA: No momento, a liderança da OLP está bastante unida. Eu não vejo perigo de briga interna, mas isso vai depender das concessões de Israel, do sucesso que tivermos. Quanto ao Hamas, também está disposto a acatar as nossas decisões.

O que sabe a cúpula da OLP sobre a doença de Arafat?

HANANIA: É inacreditável, mas aqui não sabemos o que ele teve. Milhares de exames foram feitos, primeiro aqui, depois em Paris, e ninguém conseguiu descobrir o que foi. Nós supomos que foi um envenenamento, não por causa de um atentado, mas um envenenamento do sangue.

Como o senhor viu a reeleição de George W. Bush?

HANANIA: Antes de entrar em coma, Arafat chegou a parabenizar o presidente americano pela vitória. Eu queria dizer que espero que Bush utilize o seu segundo mandato para um engajamento mais forte na causa palestina. Ele precisa pressionar mais Israel para que a paz seja possível.

Quem tem o respaldo para unir os palestinos como Arafat?

HANANIA: Esse é o problema. Para ser sincero, não há ninguém que tenha o mesmo carisma, o mesmo peso moral e seja admirado pela população de forma igual a Arafat. Talvez Abbas seja no momento o que chega mais próximo de Arafat.

Arafat queria ser sepultado em Jerusalém, mas o governo de Israel já adiantou que não vai permitir isso. Os palestinos já escolheram um outro lugar para o enterro?

HANANIA: Não decidimos ainda. Arafat queria mesmo ser sepultado em Jerusalém, a sua cidade natal, da qual viveu distante quase toda a vida. É incompreensível a recusa de Israel. Eu acho que o motivo é simbólico, punir Arafat uma última vez. Mas se houver mesmo a proibição, vamos escolher um outro lugar, Ramallah ou Gaza.