Título: Lula dá sinal verde para renúncia de petistas
Autor: Ilimar Franco/Gerson Camarotti
Fonte: O Globo, 08/10/2005, O País, p. 5

Deputados planejam renunciar para escapar da cassação e, com a manobra, poderem disputar a eleição em 2006

BRASÍLIA. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu sinal verde para que deputados petistas ameaçados de cassação renunciem aos mandatos. Em conversas informais com ministros, Lula defendeu que o PT assegure a legenda no próximo ano para quem optar pela renúncia. O presidente condenou Tarso Genro, que no comando do PT se manifestou contrário à candidatura de quem renunciasse. A defesa de Lula já foi repassada pelos ministros aos seis deputados petistas que podem desistir do mandato.

O prazo para a renúncia, para evitar a perda dos direitos políticos por oito anos, é até a abertura dos processos de cassação no Conselho de Ética. Os processos deverão ser enviados pela Mesa ao Conselho em reunião marcada para terça-feira, mas o deputado João Caldas (PL) deve pedir vista e adiar a decisão para a semana seguinte.

Planalto incentiva renúncia nos bastidores

Nos bastidores, o Planalto incentiva a renúncia de petistas e aliados ameaçados de cassação, com o argumento de que o julgamento será político, e os processos, longos, prolongando a crise. A solidariedade manifestada por Lula na reunião de ontem com a bancada do PT foi o incentivo mais claro emitido publicamente pelo presidente.

Após o encontro, deputados petistas discutiram o tema num restaurante de Brasília. O líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), disse que estava sendo procurado por colegas de partido e admitiu que a renúncia ajudaria o governo.

- Quanto mais rápido terminar a crise, melhor para o governo, melhor para a Câmara, para todos. Mas a crise não é só isso (renúncia). Vários deputados confiam em mim e abrem os corações, me pedem sugestão. Ajudo a analisar a situação.

Fernando Ferro (PT-PE) defendeu abertamente a possibilidade de renúncia dos colegas.

- Nas circunstâncias atuais, não vejo problema na renúncia. Se existe decisão política, por que alguém vai se submeter a um julgamento desse tipo?

O governo tem dados de um levantamento informal feito na Câmara, segundo o qual todos os 16 deputados da lista estão ameaçados: ninguém tem voto suficiente para evitar a cassação.

O deputado Professor Luizinho (PT-SP) não escondeu o abatimento. Contou aos amigos que sua mulher chegou a perguntar se iria renunciar. Luizinho não descartou a hipótese :

- Hoje não tem renúncia. Amanhã é amanhã.

José Mentor (PT-SP), também na lista de cassáveis, disse:

- Ninguém do PT me propôs acordo. Se for feita alguma proposta, vou pensar - disse Mentor.

O ex-líder da bancada Paulo Rocha (PT-PA) era o mais desanimado. Disse que estava sendo submetido a um julgamento político e que não há provas contra ele. Reconheceu a possibilidade de renunciar, mas negou que haja decisão coletiva:

- Não tem posição em conjunto. Depois que a Mesa decidir, este ou aquele deputado pode tomar uma decisão individual pela renúncia.

João Paulo Cunha (PT-SP), que já consultou vários caciques sobre sua disposição de renunciar, não foi ao almoço. Outra ausência foi a de José Dirceu (PT-SP). Dos petistas ameaçados de cassação, ele é o único que não pode renunciar porque já foi aberto processo contra ele no Conselho de Ética.

Chinaglia reconheceu que pode ter errado ao incentivar Dirceu a não renunciar. Ele esteve na residência do ex-ministro na véspera de seu depoimento no Conselho de Ética, em agosto, e diferentemente do Planalto, defendeu que Dirceu deveria levar o processo até o fim.

- Em tese, posso ter errado. Achava que, naquela situação, ele tinha de ter ido ao enfrentamento político - revelou.

Alguns parlamentares de outras legendas que correm o risco de ser cassados passaram a fazer campanha abertamente para tentar provar que são inocentes. Ontem, Vadão Gomes (PP-SP) disse que tinha esperança de evitar a cassação e avisou que não vai renunciar.

- Vou enfrentar o processo até o fim. Não vou renunciar. Sou inocente. Se for cassado pela Câmara é porque este é um ambiente em que não devo estar - disse Vadão.

Caldas deve pedir vista do relatório

O quarto-secretário da Mesa, João Caldas (PL-AL), confirmou que deverá pedir vista do relatório da Corregedoria sobre os 16 deputados por envolvimento em denúncias com o mensalão, 13 ainda sem processo no Conselho de Ética. Se Caldas realmente pedir vista, a análise do relatório será suspensa e só deverá acontecer na semana seguinte à do feriado do dia 12, dando mais prazo para que os deputados possam renunciar.

- Devo pedir vista porque não conheço bem os processo. Nem as denúncias, nem as defesas - justificou Caldas, um dos integrantes da Mesa que defende a análise caso a caso dos processos.

- A disposição da maioria dos membros da Mesa é mandar todos ao conselho, fugindo da responsabilidade. A tese da Mesa é a do Poncio Pilatos - criticou o deputado.

Legenda da foto: O LÍDER ARLINDO Chinaglia (à esquerda) no almoço com deputados petistas: renúncia foi prato saboreado com gosto pelos ameaçados