Título: Combate real
Autor:
Fonte: O Globo, 08/10/2005, Opinião, p. 6

Há um tiroteio verbal entre quem rejeita a proibição do comércio de armas de fogo e quem acredita que viveremos num mar de rosas se todos os cidadãos forem desarmados - um sofisma oferecido pelo governo para se isentar de culpa na escalada da violência e da criminalidade.

Quem desconhece a realidade? Ora um soldado furta material bélico de um quartel, para vendê-lo a um traficante; ora um contrabandista fornece fuzis automáticos a uma organização criminosa; ora uma pistola aparece na mão de um menino assaltante. Há ainda o reverso da medalha, como o caso de quem nunca disparou um tiro, mas que se tivesse à mão uma arma não vacilaria em usá-la para escapar de um assalto.

Essas situações, somadas a assassinatos que poderiam ser evitados, imperícia no manejo de armas, facilidade de obter um revólver etc., justificam a proibição do comércio? Pode-se confiar em governos que até hoje fizeram pouquíssimo em matéria de segurança pública? A resposta negativa é óbvia: nenhum chefe de família que coloca grades nas janelas, fecha os vidros do carro nas esquinas, contrata seguranças para se proteger e ensina seus filhos a não saírem à noite aceita o sofisma do governo.

Como votar pela proibição se não somos nós, mas o Estado, os responsáveis pelo descalabro da segurança? Como proibir o comércio de armas se, com tráfico de influência ou corrupção, pode-se registrar um revólver, se traficantes estocam arsenais nas favelas, se unidades militares - que teoricamente têm hegemonia do uso de armas pesadas - são assaltadas com freqüência?

Precisamos tratar a segurança pública com seriedade. Não falamos de homicídios, brigas de trânsito, conflitos entre marido e mulher, mas de investir no combate real à miséria, resgatando os excluídos para a vida produtiva.

MIGUEL JORGE é jornalista e executivo do setor financeiro.

É preciso seriedade ao se tratar da segurança pública