Título: Sobre renúncias
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 09/10/2005, O Globo, p. 2

Alguns dos deputados cassáveis devem renunciar antes de terça-feira, quando seus processos serão abertos no Conselho de Ética. O grito de pizza, vindo de fora, vai reverberar alto e forte no Congresso, mas ali nem todos acham que esta é a pior das soluções. Se a cassação é o castigo que sacia a indignação, a renúncia é a autopunição que abrevia o rito e reduz a incerteza.

Um desfecho em pizza pode ter variadas coberturas, mas é quase consenso que a massa básica teria como ingredientes a impunidade dos que conspurcaram seus mandatos recebendo indevidamente (seja para campanhas, troca de partido ou garantia de voto) e a não descoberta da origem dos recursos do valerioduto, que deixaria tudo no campo nebuloso das versões. Muita gente verá pizza nas renúncias em série, mas há quem pense que esta saída também tem suas vantagens. Por exemplo, o líder do PSDB, Alberto Goldman, que há dias vem dizendo: "quanto mais cedo nos livrarmos destes caras, mais cedo voltaremos a cuidar das coisas que interessam ao país".

Os que não renunciarem com certeza irão ao julgamento do plenário, diz o deputado Chico Alencar, que é integrante do Conselho de Ética. No plenário, com o voto secreto, tudo pode acontecer. Mas ali, onde o voto é aberto, até por instinto de sobrevivência, a sensibilidade é maior aos humores da população. O que se ouve em geral é um "respeito muito a biografia de Sua Excelência, mas..."

E tendo o plenário que votar cada proposta de cassação, este processo todo não termina antes de março de 2006, isso se houver uma convocação em janeiro. Esta perspectiva de longos meses consumidos pela agenda do castigo é que leva Goldman a ter posição diferente, por exemplo, da de seus parceiros do PFL. É claro que o PT e o governo serão os mais beneficiados na medida em que a remoção dos cassáveis pode apressar o fim da crise.

A renúncia, tendo implícito um reconhecimento de culpa, não é uma saída tão confortável para quem a pratica. É verdade que os sujeitos preservam seus direitos políticos, podendo se candidatar na eleição seguinte. E, no caso dos petistas, até se discute a garantia de legenda para que tentem reconquistar o mandato. Mas a história recente tem mostrado que raramente os que escapam pela porta da renúncia se reelegem. É o caso de alguns dos que renunciaram no escândalo dos anões do Orçamento: o ex-líder do PMDB Genebaldo Corrêa e seus colegas João Alves, Manoel Moreira e Cid Carvalho nunca mais voltaram. Foram repudiados pelo eleitorado. Outros até conseguiram se reeleger, mas nunca mais foram o que eram antes. Casos recentes, os de Jader Barbalho, Antonio Carlos Magalhães e José Roberto Arruda.

Com as renúncias, o ambiente político certamente vai melhorar, pode favorecer até mesmo o curso das investigações. Mas o custo, em matéria de desgaste para o Congresso, certamente será alto, altíssimo.