Título: Fator de coesão
Autor: Ilimar Franco
Fonte: O Globo, 10/10/2005, O Globo, p. 2

O PT concluiu ontem, com a realização do segundo turno para escolher seu futuro presidente, o processo de eleições internas. A votação direta dos filiados, implantada em 2001, como forma de assegurar a hegemonia dos moderados, cumpriu seu papel e impediu uma reviravolta no partido num momento delicado, no qual sua antiga direção ruiu num escândalo financeiro e ético.

Os petistas de vários matizes concordam que o partido não será o mesmo, independentemente de quem for o vitorioso: Ricardo Berzoini ou Raul Pont. O primeiro turno das eleições já produziu as mudanças consideradas essenciais. A hegemonia da Articulação foi interrompida. Sua cota no Diretório Nacional caiu de 42, dos 81 integrantes, para 34. As tendências de esquerda ampliaram sua presença de 27 para 30. O Movimento PT, um grupo de centro com idéias não muito definidas e que se coloca como mediador do embate entre os moderados e a esquerda, cresceu de 12 para 17.

A principal mudança é a que aponta a necessidade que a Articulação terá de negociar, pelo menos com o Movimento PT, para continuar mandando. A própria Articulação corre o risco da fragmentação com a perda de poder de seu líder político, o deputado José Dirceu (PT-SP), até que alguém se imponha como novo chefe da tendência.

A posição adotada pelo Movimento PT, de apoiar Raul Pont no segundo turno, indica que a nova maioria será mais crítica em relação a aspectos do governo Lula, como a política econômica, a política de alianças eleitorais e a participação dos aliados no governo Lula. Se o PT fizer a opção por Berzoini esta flexão será suave, mas se o escolhido for Pont se pode prever maior tensão.

A disputa interna no PT, que já levou à criação do PSTU, no passado, e do PSOL, recentemente, não se resolverá com o atual processo eleitoral. A crise petista é grave e está longe de acabar. Mas poderá ficar represado por causa das eleições de 2006, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tentará reeleger-se. O presidente, com seu carisma, a popularidade que lhe resta e sua discrição na disputa petista, acreditam seus assessores, vai garantir um mínimo de unidade interna. O próprio Lula já mostrou disposição de juntar os cacos na sexta-feira, quando prometeu à bancada petista na Câmara que passará a informar e discutir com os líderes as principais decisões e medidas que o governo vier a adotar.