Título: Pizza divide a Mesa
Autor: Maria Lima/Evandro Éboli/Isabel Braga
Fonte: O Globo, 11/10/2005, O País, p. 3

Decisão de Aldo abre brecha para arquivamento de representação antes de envio ao Conselho

A Mesa da Câmara se reúne hoje para decidir o rumo dos processos por quebra de decoro parlamentar contra 13 deputados acusados de participar do esquema do mensalão. A decisão do presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), de individualizar as representações, anunciada ontem, abre brecha para algumas serem arquivadas ainda hoje pela Mesa, evitando o encaminhamento ao Conselho de Ética. Embora a maioria dos sete integrantes da Mesa, inclusive Aldo, defenda o envio dos 13 processos, João Caldas (PL-AL), quarto secretário, deverá insistir que pelo menos contra três acusados não há provas suficientes e que estes casos deveriam ser arquivados.

Aldo deixou claro que sua posição é pelo envio das 13 representações ao Conselho de Ética, mas ressaltou que a Mesa é soberana. A tendência da maioria dos integrantes da Mesa é seguir a orientação do presidente.

- A minha posição é esta: enviar todos os processos ao Conselho, com representações separadas. Mas se a Mesa decidir mandar só 12, 13, decidir segurar três ou não, aí é outra coisa. Não tem nada a ver com a tese em si. A Mesa é autônoma - disse Aldo.

Apesar de abrir brecha para o arquivamento de processos pela Mesa Diretora, Aldo defendeu as representações individuais:

- Quando o tribunal de Nuremberg julgou os acusados de genocídio, todos os nazistas tiveram direito a um processo individual. Julgamento coletivo, étnico, racial, religioso, quando feito é realizado sem o estado de direito, sem o amparo de prerrogativas, e geralmente é feito em regime de exceção. Não haverá processo coletivo. E ninguém me convenceu. Essa é uma convicção pessoal.

Caldas insistirá que a Mesa, antes de encaminhar os processos, faça a análise individual do mérito de cada um. E ameaça pedir vista, o que pode adiar a decisão para a próxima semana.

- Vou exigir que a Mesa se pronuncie sobre um a um. Se não for assim, continua o rito sumário, a operação Pôncio Pilatos.

O presidente do Conselho de Ética, Ricardo Izar (PTB-SP), não acredita que a Mesa envie ainda hoje o parecer para abertura dos processos. Ontem, o Conselho aprovou para a próxima terça-feira a assinatura dos termos de instauração - o que significa mais tempo para quem optar pela renúncia. Izar reuniu-se com Aldo e disse que o resultado do encontro não agradou.

- Aldo me disse que enviarão apenas um pequeno resumo de cada caso e sem as provas. Vamos começar do zero - disse Izar.

Segundo Caldas, contra três deputados - Wanderval Santos (PL-SP), Vadão Gomes (PP-SP) e Pedro Henry (PP-MS) - as provas são inconsistentes e baseadas na palavra do cassado Roberto Jefferson. Essa posição também defendida por três integrantes da Mesa Diretora.

O terceiro secretário da Mesa, Eduardo Gomes (PSDB-TO), disse que por orientação partidária defenderá o envio dos 13 deputados ao Conselho. Mas transfere para Aldo a responsabilidade da reunião da Mesa.

- Ele que dará o tom e as conseqüências. - disse Gomes, admitindo que poderá votar pelo arquivamento de alguns processos se o mérito for analisado caso a caso.

Conselho sofre pressões de todos os lados

Pressões de todos os lados levaram o presidente do Conselho de Ética a optar pelo sorteio para escolher os relatores dos processos. Izar tem sido abordado tanto pelos acusados como por integrantes do Conselho.

- Não posso atender a qualquer dos dois lados. Há também os interlocutores dos deputados ameaçados. Eles querem que eu indique alguém mais brando para relatar o processo. Por isso, optei pelo sorteio - disse Izar.

Os dois deputados do PSOL que integram o Conselho - Orlando Fantazzini (SP) e Chico Alencar (RJ), que saíram recentemente do PT - pediram a Ricardo Izar para não relatar processos contra os petistas envolvidos. Eles se declararam suspeitos para essa tarefa. As razões seriam éticas pelo fato de os dois terem deixado o PT há pouco tempo e de maneira ruidosa, discordando da legenda.

- Eu me sentiria bastante desconfortável julgando, neste momento, alguém do PT. Poderia parecer retaliação, o que não cabe no Conselho de Ética - justificou Fantazzini.

Se confirmado o envio dos 13 processos que estão na Mesa, o Conselho terá que requisitar os trabalhos de, pelo menos, três suplentes para completar a lista de relatores. Izar quer um relator para cada caso, para agilizar os trabalhos. Haverá um sorteio também para a escolha dos três suplentes. Primeiro, ocorrerá a escolha dos titulares. O sorteio está marcado para a próxima terça-feira, quando serão abertos os processos.

Cassados podem ficar sem benefício

Jefferson ganhará R$8,8 mil

BRASÍLIA. O Ministério Público no Tribunal de Contas da União tenta impedir que parlamentares que tentarem escapar do processo de cassação com a renúncia ou sejam cassados possam se aposentar como deputados. O procurador-geral no TCU, Lucas Furtado, já entrou com representação para suspender a aposentadoria do ex-deputado Roberto Jefferson. Ele também quer que a Câmara não conceda o benefício aos deputados que renunciarem.

Ontem, o Diário Oficial da União publicou o ato assinado pelo presidente da Câmara, Aldo Rebelo, homologando a aposentadoria de Jefferson. O ex-deputado receberá R$8.898 mensais.

- Se ele é cassado por fraudes ou envolvimento em ilícitos, isso deve representar um rompimento de qualquer vínculo dele com o poder público - argumenta Furtado.

Segundo ele, a Lei 8112, que trata do regime dos servidores públicos, prevê que, mesmo tendo contribuído, o servidor demitido por estar envolvido em irregularidades perde o benefício da aposentadoria. Ele citou ainda decisão do Supremo Tribunal Federal que considera correta essa tese. Por analogia, para Furtado, ela deve valer também para os deputados cassados ou que renunciaram .

Nos últimos quatro meses, três deputados, Valdemar Costa Neto (PL-SP), Carlos Rodrigues (PL-RJ) e Severino Cavalcanti (PP-PE), renunciaram aos mandatos.

Legenda da foto: ALDO REBELO: "Se a Mesa decidir mandar só 12, 13, decidir segurar três ou não, aí é outra coisa"