Título: Lula lava as mãos
Autor: Gerson Camarotti
Fonte: O Globo, 13/10/2005, O País, p. 3

Presidente avisa a Aldo que governo não vai interferir em processos de cassação

Antes de viajar para a Europa, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva mandou um recado ao presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP): o governo não tem interesse em interferir no processo para ajudar aliados a escapar da cassação. O recado foi repassado pelo ministro das Relações Institucionais, Jaques Wagner, logo depois que a Mesa da Câmara decidiu enviar ao Conselho de Ética o pedido de abertura de processo contra 13 deputados ¿ seis deles do PT ¿ suspeitos de envolvimento no escândalo do mensalão.

Na conversa com Aldo, o ministro teria sido enfático ao afirmar que a Câmara precisa fazer o que tem de ser feito, sem qualquer margem de interpretação de que esteja colaborando com um arranjo para evitar a punição. A avaliação feita por Lula no Palácio do Planalto é que o desgaste com a crise política já está consolidado. Na visão do presidente, uma tentativa de interferir no processo, neste momento, só criaria um novo desgaste ao governo.

¿Acordo seria jogar mais desgaste¿

A constatação no Planalto é que a crise política começa a arrefecer. Alguns assessores acreditam que por isso só interessaria à oposição ter um novo discurso de que o governo estaria operando para tentar evitar a cassação de aliados. A abertura de um processo por quebra de decoro, na próxima semana, pode levar à cassação vários deputados. Isso porque já existe um consenso político no Congresso do envolvimento da maior parte dos deputados citados nos relatórios das CPIs dos Correios e do Mensalão pelo envolvimento desses parlamentares com recursos recebidos do empresário mineiro Marcos Valério.

¿ Qualquer tentativa de fazer um acordo seria jogar mais desgaste no colo do governo. Isso daria apenas mais um discurso para a oposição ¿ teria desabafado Lula com assessores próximos.

Com a decisão de não interferir no processo da Câmara, o governo deixa a renúncia como a única saída para os deputados aliados que ainda não tiveram a abertura de seus respectivos processos de cassação. Desde a semana passada, o presidente deu sinal verde para que os petistas possam abdicar de seus mandatos. Internamente, Lula chegou a defender que o PT garanta legenda no próximo ano para quem optar pela renúncia para tentar reconquistar o mandato.

Vitória de Berzoini favorece renúncias

O presidente avalia que essa seria a única ajuda possível aos petistas. Mas o estímulo do Planalto para a renúncia dos petistas não é por acaso. A constatação é de que a desistência do mandato do maior número de aliados ajudaria ao governo a sair do noticiário negativo. O temor do governo é que as cassações atravessem o ano, prolongando-se até março. Dessa forma, observa um ministro petista, a crise política entraria no calendário eleitoral.

A vitória do deputado Ricardo Berzoini (PT-SP) para a presidência do PT deve ser um novo estímulo para a renúncia do maior número de petistas citados no esquema do mensalão. Ele defende o direito à legenda dos deputados que renunciarem ao mandato.

O presidente teria recebido recado dando conta que até mesmo os deputados que afirmam que não vão renunciar, como Professor Luizinho (PT-SP), João Paulo Cunha (PT-SP), José Mentor (PT-SP) e José Janene (PP-PR), intensificaram consultas pessoais nos últimos dois dias sobre a possibilidade de abdicar do mandato para não perder os direitos políticos.