Título: EM NY, O VOTO EMOCIONADO PARA KERRY
Autor: HElena Celestino
Fonte: O Globo, 03/11/2004, O mundo, p. 26
A cidade que se orgulha da longa tradição democrata comparece maciçamente às urnas
NOVA YORK. Foi com paixão que os nova-iorquinos foram votar ontem, escolhendo por larga margem o candidato democrata John Kerry e garantindo-lhe 13 pontos no Colégio Eleitoral. Desde cedo, as zonas eleitorais estavam lotadas, algumas com filas de até 45 minutos, deixando muitos surpresos com a quantidade de eleitores motivados para votar. Grupos faziam boca-de-urna para os democratas, mais do que nunca via-se eleitores usando broches com o nome dos candidatos ou malhas com palavras de ordem a favor do aborto ou do casamento gay, e bancas vendiam distintivos contra Bush. Tudo calmo e pacífico, com jeito de dia normal. Mas era com emoção que os eleitores defendiam o seu voto.
¿ Estou votando pela primeira vez, tenho o sentimento de que hoje estamos decidindo o destino da nação. Na eleição passada estava ocupada na universidade, não achei tão importante ¿ disse Anne Desbarres, 25 anos, contando que está torcendo para Kerry ganhar.
Eleitores de Bush são difíceis de achar
Não é muito fácil achar um eleitor de Bush na mais democrata das cidades americanas, que se orgulha de apenas quatro vezes em 50 anos ter optado por um candidato a presidente republicano e nos últimos cem anos ter votado só em nove eleições contra os democratas. No Upper East Side, famoso por ser o bairro mais democrata de Manhattan, das 30 pessoas que estavam na fila, 28 disseram que votariam em Kerry e duas não quiseram abrir o voto.
¿ O voto envergonhado em Nova York é Bush ¿ afirmou Ryan Schick, 24 anos, eleitor democrata fiel. ¿ Eu tenho muitos amigos que perderam emprego. Este é o primeiro presidente que dá incentivos às empresas para se mudarem dos Estados Unidos e criarem postos de trabalho no exterior.
O eleitor de Nova York reproduz o que as pesquisas indicaram. Vota contra Bush principalmente por questões econômicas, porque não concorda com a atuação dos EUA no Iraque e pelas chamadas questões sociais ¿ aborto, casamento gay e pesquisa de células-tronco.
¿ Estou preocupado principalmente por causa da guinada conservadora que este país está dando, estimulado por Bush ¿ disse o japonês Takashi Omira, 35 anos, estreando o direito a voto depois de recém-conquistar a nacionalidade americana.
Já para a aposentada Josephina Armstad, os quatro anos de administração Bush foram ¿um horror¿, com perdas econômicas para a classe média e uma política externa ¿absurda¿.
¿ Eu realmente acho que a política de Bush contra o terror errou o alvo. Fazer guerra no Iraque era secundário, o foco tinha de ser o terrorismo e não Saddam, um ditador de quem poderíamos cuidar mais tarde ¿ observou ela.
Nos últimos dias os nova-iorquinos andaram se dizendo incomodados com a pouca importância que os candidatos deram à cidade e ao estado. Kerry e seu vice, John Edwards, não apareceram em Nova York uma única vez. Bush e o vice Dick Cheney só estiveram na cidade durante a Convenção Republicana, em agosto.
Mas Nova York, aparentemente, não se incomodou com o relativo abandono: mais 400 mil eleitores foram adicionados à lista dos quatro milhões de votantes da cidade.
¿ Estou aqui há 21 anos e nunca vi tanta gente ¿ afirmou o mesário Michael Brown.