Título: DISPUTA ACIRRADA NA RETA FINAL
Autor: Cláudia Lamego e Luiza Damé
Fonte: O Globo, 17/10/2005, O País, p. 3

Campanhas do `Sim¿ e do `Não¿ traçam estratégias para os últimos dias antes do referendo

Na reta final da campanha do referendo, manifestações a favor e contra a proibição do comércio de armas e munição realizadas no Rio de Janeiro reuniram praticamente o mesmo número de participantes, cerca de 300 cada um, mostrando na prática o empate técnico que a pesquisa do Ibope divulgada na semana passada havia apontado.

Os dois grupos já decidiram suas estratégias de campanha até domingo, quando acontece a votação. Enquanto a Frente pelo Direito da Legítima Defesa continuará insistindo nos argumentos objetivos contra a proibição da venda de armas, a Frente Brasil sem Armas, que defende o voto ¿Sim¿, vai buscar a mobilização da sociedade para tirar a vantagem do voto ¿Não¿. O secretário da frente, deputado Raul Jungmann (PPS-PE), vai pedir licença do mandato, a partir de hoje, para se dedicar exclusivamente à campanha, que sofrerá alterações, entre as quais mostrar o crescimento do número de armas apreendidas de bandidos nos últimos dois anos.

O coordenador da Frente pelo Direito da Legítima Defesa, deputado Alberto Fraga (PFL-DF), afirmou que a campanha do ¿Não¿ vai manter o mesmo estilo, passando informações objetivas sobre as consequências da proibição da venda de armas. Ele desdenhou dos atos comandados pela frente do ¿Sim¿.

¿ Quantos atos pela paz já foram feitos e a bandidagem está por aí deitando e rolando. Se ato público desse certo, o Brasil era um país sem violência. Pombinha branca, florzinha e camiseta não convencem ninguém.

Raul Jungmann disse que está trabalhando para que os militantes do voto ¿Sim¿ se empenhem em conquistar mais apoios:

¿ É fundamental que cada militante da paz se dedique 24 horas à luta pelo ¿Sim¿. A mobilização vai fazer a diferença para desempatar essa disputa em favor do ¿Sim¿.

¿Sim¿ terá dois novos slogans

Ontem, as frentes do ¿Sim¿ e do ¿Não¿ ocuparam a orla do Rio para o último domingo da campanha. Enquanto representantes da Frente pela Legítima Defesa comemoravam a vantagem apontada pelo Ibope, de 49% para o ¿Não¿ contra 45% do ¿Sim¿, integrantes da Frente Brasil sem Armas afirmavam que vão mudar o discurso para reconquistar os eleitores.

O deputado estadual Carlos Minc (PT) disse que serão duas as novas linhas de ação: dizer ao eleitor que o voto ¿Não¿ significa a continuidade do estado de insegurança e mostrar que a polícia também está desarmando os bandidos. Segundo ele, em dois anos dobrou o número de armas apreendidas pelas polícias federal e estadual.

¿ Vamos usar dois novos slogans: ¿Votar não significa não mudar nada¿ e ¿Desarmar geral¿. Ficamos muito no apelo emocional e perdemos a linha da racionalidade. Levamos uma bala no peito no primeiro round, mas até domingo vamos ressuscitar ¿ disse Minc.

Para a deputada federal Jandira Feghali (PBdoB-RJ), já era esperado o crescimento do ¿Não¿, mas não que ultrapassasse o ¿Sim¿. Ela responsabiliza a falta de gravidade no tom dos discursos dos artistas e a ausência de políticos na campanha:

¿ O publicitário conduziu de forma errada. Era preciso convidar os políticos para participar. Tem gente do PSDB, do PFL, do PT, do meu partido. O Serra, prefeito de São Paulo, declarou o voto. Tínhamos que dar esse caráter suprapartidário à campanha.

A governadora Rosinha Garotinho disse, durante evento do voto ¿Sim¿ na Lagoa Rodrigo de Freitas, que a campanha do ¿Não¿ está bem feita, mas não é verdadeira.

¿ Não é marketing que pode salvar a vida de ninguém. E não é com uma medida apenas que tudo será resolvido, mas precisamos começar e o desarmamento é o primeiro passo. Estou falando como cidadã, como mãe e como alguém que perdeu o irmão assassinado ¿ disse Rosinha, cujo irmão morreu há 21 anos, em Campos.

Em caminhada na orla de Ipanema e do Leblon que reuniu cerca de 300 pessoas, o deputado federal Jair Bolsonaro (PP), da Frente pela Legítima Defesa, admitiu que o crescimento do voto ¿Não¿ foi uma surpresa:

¿ Não acreditávamos que o voto ¿Não¿ fosse crescer tanto. Nossa campanha é racional. Ninguém está pregando que as pessoas andem armadas nas ruas. Queremos, entre outras coisas, evitar o aumento do comércio paralelo de armas. E que o cidadão de bem tenha direito à legítima defesa.

Cerca de 25 integrantes da bateria da escola de samba Grande Rio animaram a caminhada. O diretor de bateria, Zé Carlos, no entanto, disse que estava lá a pedido do presidente da escola, mas que seu voto no referendo é ¿Sim¿.

Em Copacabana, cerca de 300 pessoas participaram da caminhada ¿Juventude pelo Sim¿. A advogada Rita Maria Magnavita diz que ficou impressionada com o resultado da pesquisa:

¿ É difícil de acreditar que justo os brasileiros com maior nível de instrução votarão contra o desarmamento. O cidadão deve ter direito à educação e à saúde e não a portar uma arma.

Para a pesquisadora Mariana Olinger, o direito à vida se sobrepõe ao direito de ter uma arma:

¿ Essa população instruída e rica vive num círculo do medo, teoricamente protegida por muros e seguranças. Já a população carente sente a violência na pele, convive com tragédias causadas por armas de fogo.

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