Título: JUDICIÁRIO TERÁ 90 DIAS PARA PÔR FIM AO NEPOTISMO DEMITINDO PARENTES
Autor: Carolina Brigido
Fonte: O Globo, 19/10/2005, O País, p. 10

Terão de ser exonerados funcionários de tribunais que ocupam cargos de confiança e são cônjuges, companheiros ou parentes de até terceiro grau de juízes ou servidores

BRASÍLIA. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), órgão responsável pela fiscalização da a atividade dos tribunais, aprovou ontem o texto final da resolução que proíbe o nepotismo no Judiciário. Com isso, em 90 dias terão de ser exonerados todos os funcionários de tribunais que ocupam cargos de confiança e são cônjuges, companheiros ou parentes de até terceiro grau de juízes ou de servidores que exercem cargos de confiança.

Pelo texto, as demissões terão de ser feitas até 90 dias após a publicação da decisão no Diário de Justiça, que ocorrerá nos próximos dias. Não foi estabelecida, entretanto, punição para o descumprimento da nova norma.

Também está vedado o nepotismo cruzado, que ocorre quando um juiz nomeia um parente de outro juiz para ocupar cargo de confiança em seu gabinete em troca do mesmo favor. A proibição vale para todas as instâncias do Judiciário. Assim, um juiz de tribunal estadual não poderá estabelecer essa troca de favores em nomeações nem mesmo com um ministro de tribunal superior, por exemplo.

Além disso, o CNJ proibiu que empresas contratadas para prestar serviços aos tribunais empreguem parentes e cônjuges de juízes e servidores. Essas empresas também não poderão ter familiares de juízes e de servidores como sócios.

Irregularidades serão examinadas caso a caso

O texto da resolução não prevê se as empresas que estejam nessas situações perderão seus contratos ou serão obrigadas a demitir os funcionários que tenham o parentesco incompatível com o trabalho. As irregularidades deverão ser examinadas caso a caso pelo CNJ.

A partir da publicação da decisão, quem tomar posse em cargos de confiança no Judiciário deverá redigir uma declaração negando ter parentesco ou ser casado com magistrado ou ocupantes de funções de direção e assessoramento.

¿ A decisão do CNJ acaba com um problema que há muito tempo prejudicava o Poder Judiciário ¿ afirmou o presidente do conselho e do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim.

O presidente da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra), José Nilton Pandelot, concordou:

¿ Foi uma decisão corajosa e mostrou que o CNJ foi criado para moralizar e colocar o Poder Judiciário nos eixos. Vamos fazer dele uma vitrine para os outros poderes da República. A eficiência dos tribunais passa necessariamente pela exoneração desses cargos, que devem ser ocupados por quem passou em concurso público ou tem mérito. O parentesco não pode ser critério para a nomeação. O Judiciário não pode ser um cabide de empregos, nem representar auxílio para as finanças dos magistrados.

Decisão foi acertada em sessão tensa

Durante a discussão de ontem, os integrantes do CNJ concordaram que não será viável verificar se todos os ocupantes de cargos de confiança estão em situação regular. Diante disso, os tribunais estariam obrigados a acreditar na veracidade dessa declaração, a não ser que sejam feitas denúncias específicas ao conselho.

A decisão de proibir o nepotismo no Judiciário havia sido acertada em uma sessão tensa no CNJ, há três semanas. Depois de cinco horas e meia de debates intensos, os conselheiros não conseguiram chegar a um consenso sobre o texto final da resolução, que ficou para ser aprovado apenas ontem.

A proposta de banir o nepotismo foi feita pela Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra) e pelo representante da Ordem dos Advogados no Brasil (OAB) no CNJ, Paulo Lobo. Na primeira sessão dedicada ao tema, foi discutido o artigo 37 da Constituição Federal, que institui o preceito da moralidade e da impessoalidade no funcionalismo público.

Em 1996, já havia sido editada a Lei 9.421, que proibiu a nomeação de cônjuges e parentes até o terceiro grau de autoridades do Judiciário federal para cargos de confiança, mas não havia sido exigida a exoneração dos trabalhadores que foram contratados pelo critério pessoal. Mesmo com a norma estando em vigor, as entidades de classe do Judiciário contabilizam inúmeros casos de contratação de familiares na última década nos tribunais.

Normas diferentes país afora

Como a lei não menciona regra referente à Justiça estadual, várias unidades da federação editaram normas locais diferentes sobre nepotismo. Durante o julgamento ocorrido no mês passado, a diferença de regras entre estados pesou na hora de unificar a mesma proibição em todo o país.