Título: Alencar assume hoje Defesa para tentar contornar crise com militares
Autor: Gerson Camarotti e Rodrigo Rangel
Fonte: O Globo, 08/11/2004, O país, p. 4

O vice-presidente da República, José Alencar, assume hoje o Ministério da Defesa, em solenidade no Palácio do Planalto, com um discurso conciliador. Com a missão dada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva de instituir o clima de normalidade na área militar, Alencar não deverá fazer menção à crise desencadeada pela divulgação das fotos erroneamente identificadas como sendo do jornalista Vladimir Herzog.

Nos próximos dias, Lula vai analisar com Alencar a situação do general Francisco Albuquerque, comandante do Exército. Ele deve deixar o cargo, mas o presidente quer que seja uma saída negociada para evitar nova crise. Lula, que não deseja tomar nenhuma medida precipitada, aposta no estilo ¿mineiro¿ de Alencar para acalmar a crise e promover a provável transição no comando do Exército.

Segundo um ministro palaciano, a situação do general Francisco Albuquerque se complicou ainda mais neste fim de semana, quando O GLOBO publicou as duas versões da nota de retratação do Exército em relação ao caso Herzog. As versões iniciais mostraram que houve resistência de Albuquerque a fazer a retratação nos termos em que desejava o presidente Lula. Os dois primeiros textos que propôs como retratação não mencionavam os excessos da ditadura e nem lamentavam a morte de Herzog.

A ordem repassada pelo presidente Lula ao novo ministro é de baixar a poeira na crise aberta nas Forças Armadas. Segundo assessores palacianos, Lula deseja fazer uma transição sem traumas no Exército. Dois nomes já cotados para substituir Albuquerque são os dos generais Rômulo Bini, chefe do Estado Maior da Defesa, e Manoel Luis Valdevez Costa, atual comandante militar do Leste, com sede no Rio de Janeiro.

Discurso ressaltará função história de militares

O discurso de posse de Alencar, segundo seus assessores, deve apenas ressaltar a função histórica das Forças Armadas. Outro ponto de sua fala será o compromisso institucional com a democracia e o papel republicano e moderno que hoje desempenham as três Forças. Essa teria sido a forma encontrada por Alencar para tocar na crise de forma indireta.

A divulgação das notas originais de retratação pegou o Palácio do Planalto de surpresa. Para uma fonte do Planalto, teria sido mais um gesto nada diplomático do ex-ministro José Viegas, que acabou ampliando a crise. Viegas, que pediu demissão na última quinta-feira, confirmou sua presença hoje pela manhã na solenidade de posse de seu sucessor. Ele passou o fim de semana com a mulher Erika nas cidades históricas de Minas Gerais. O Planalto já deu sinal verde ao Itamaraty para nomeá-lo novo embaixador do Brasil em Madri.